por Roberto A. Santos
Neste sexto artigo da série sobre os riscos para o desempenho provocados por descarriladores de carreira, vamos conhecer o Cético: aquela pessoa que desconfia até da sombra e que costuma ser vista circulando pela empresa com uma nuvenzinha negra acima da cabeça.
Como todas as características de personalidade que temos tratado, esta também tem um lado positivo. A pessoa que tem esse traço, num nível ótimo, é criteriosa em seus julgamentos, não compra o peixe do jeito que estão querendo lhe vender, ela analisa, pondera, mas depois de seus questionamentos, toma a decisão mais adequada.
Especialmente para algumas profissões, como policial, advogado, auditor, se o indivíduo for ingênuo, ele não vai chegar muito longe em sua carreira. Entrevistei recentemente um agente de segurança de uma grande companhia aérea multinacional, que tinha respondido ao Inventário de Desafios de Liderança© (que mensura os descarriladores). Felizmente para os passageiros dos vôos daquela empresa, seu resultado na dimensão do ceticismo era bastante elevado. Ele me expôs os vários sinais que analisa no comportamento dos passageiros e como testa um a um para saber se está lidando com um potencial terrorista ou com um turista inofensivo. Porém, chega um ponto em que ele tem que decidir sobre autorização do embarque. Com esse traço descontrolado, provavelmente, todos os vôos iriam vazios, o quê não era o caso de nosso personagem. Ele usa essa característica a seu favor em sua profissão e o faz muito bem.
O tipo cético desconfia até prova em contrário, e sob estresse, essa sua tendência pode impedi-lo inclusive de reconhecer aquelas provas factuais. Sua tendência é ler nas entrelinhas, interpretar um tom de voz, um olhar, à busca do motivo obscuro que seu interlocutor pode estar tentando esconder.
Geralmente, a pessoa que tem essa característica acentuada tem dificuldades de desenvolver relacionamentos com outros, está sempre com todos os pés quilômetros atrás. O pior é que, muitas vezes, esse ceticismo se faz acompanhar de um espírito de vingança, no mínimo, do alto de seu pessimismo crônico ele vai poder falar:"Não falei que ia dar caca?".
Para se defender de monstros imaginários, nosso cético afasta as pessoas e acaba realizando sua profecia: "Eu tinha razão, estão todos contra mim mesmo…"
Outra característica do tipo desconfiado é usar as famosas Leis de Murphy como sua Bíblia — "Se algo pode sair errado, sairá pior ainda…" Nosso "anti-Polliana" é ótimo para pensar no pior cenário, nos riscos de um negócio, ou problemas associados a um idéia. Certamente, esta habilidade é útil numa equipe, para que a empresa não embarque em canoas furadas. Desde que nosso colega também consiga reconhecer quando todos os fatos foram considerados e o plano pode seguir em frente. Como pregava Buda, o segredo é seguir o caminho do meio – sobre os trilhos do meio.
Conforme se sabe, nossas tendências de personalidade são formadas em nossa infância e na vida adulta já estão bastante cristalizadas. Pelo processo psicoterapêutico pode-se ir atrás das causas desses traços que afetam o presente, mas pode ser um caminho longo e demorado. A alternativa é aceitar os feedbacks que nos apontam esses comportamentos, reconhecer que são nocivos ao relacionamento com as pessoas e se esforçar para agir diferentemente.
Pense nas causas de sua desconfiança
Tente usar seu apurado senso de julgamento para avaliar as causas objetivas de sua desconfiança. Procure fatos. Cheque consistência entre palavras e ações das pessoas. Se ainda resta alguém em quem você confie, fale com essa pessoa e peça para ajudá-lo a analisar os fatos.
Dê o benefício da dúvida
Reveja o relacionamento com alguém que você preza mas que tenha sido abalado por alguma desconfiança. Se o problema que o atormenta ainda for recente, considere procurar a pessoa e expor suas dúvidas e suas hipóteses. Considere a possibilidade de dar-lhe um voto de confiança, o benefício à dúvida, antes de declarar guerra por uma ofensa que pode ser imaginária.
Esforce-se para ver o lado positivo… e fale sobre ele
Reverta os polos de sua nuvenzinha e provoque alguns raios de otimismo. Se possível, esforce-se para fazer comentários positivos e dar elogios aos envolvidos mesmo em situações simples. Prepare-se para a cara de surpresa de algumas pessoas, mas note que a reação também será positiva. Ser crítico é seu ponto forte, mas mesmo quando algo está saindo de errado, as pessoas precisam de estímulo e energia para corrigir as falhas.
Os trilhos que levam ao sucesso em qualquer carreira têm que passar por várias estações antes do destino final. São pontos de parada para reflexão, reabastecimento, para checar os painéis de controle, e corrigir o curso para seguir em frente. Para estes quatro processos, dependemos das pessoas – próximas e estranhas, parecidas ou diferentes de nós. Desconfiança contínua e generalizada pode ser fatal para seu descarrilamento, pois aqueles quatro processos podem ser insuficientes ou inadequados.