por Paulo Annunziata Lopes – psicólogo componente do NPPI
Há décadas cientistas de todo o mundo fazem previsões sobre quando e como o homem será capaz de construir máquinas capazes de executar operações análogas às do cérebro humano.
Com o progresso tecnológico essa possibilidade há tempos já passou de mera teoria para a realidade.
Câmeras inteligentes que "leem" placas de automóveis, outras capazes de reconhecer traços faciais, robôs de precisão em linhas de montagem, outros capazes não só de compreender a escrita humana como também assimilar seus conteúdos numa velocidade maior que qualquer homem poderia, estes são só alguns exemplos.
Os cientistas, como por exemplo os do MIRI (Machine Intelligence Research Institute – www.intelligence.org), já discutem como conduzir os avanços da inteligência artificial (robôs dotados de inteligência e autonomia para aprenderem sozinhos e tomar decisões, já são uma realidade), ou seja, questionam como nós, humanos, poderemos guiar e controlar esse processo. Exemplo: há estudos que discutem como garantir que as máquinas não aprendam, desenvolvam ou utilizem qualquer conhecimento que possa ser prejudicial aos interesses humanos ou mesmo nocivo à nossa espécie. Parece tratar-se de uma cena da série "O Exterminador do Futuro". Trata-se, de fato, de uma preocupação com valores, preocupação essa que culmina, entre outras coisas, na busca de uma espécie de garantia de moral e de ética naquilo que as máquinas inteligentes já são capazes de aprender. Os cientistas querem e precisam educá-las.
Enquanto isso, no cotidiano, onde tais questões parecem distantes, nós continuamos batalhando para ensinar a moral e a ética às nossas crianças e adultos, inclusive no que tange ao uso da tecnologia. Nossos problemas não são poucos: o cyberbullying, as invasões de privacidade na internet, a superexposição nas redes sociais, entre outros. É claro que não devemos esquecer de tudo que há de positivo em nossa interação com as máquinas e com a rede mundial de computadores. Não sou "antitecnologia" e também aprecio as comodidades e as novidades que a tecnologia nos traz. Mais do que isso, sei que o progresso tecnológico possibilita também diversos novos recursos de ensino e educação. E, se certas formas de utilização da tecnologia têm lá as suas mazelas, cabe a nós fazer o máximo com as ferramentas construtivas provenientes dessa mesma tecnologia.
O que me preocupa (a mim e a muitos de nós) é a capacidade da nossa sociedade em educar. Como numa sala de aula, sempre haverá aqueles que seguem as recomendações do professor, aqueles que superam as expectativas e aqueles que surpreendem ao fugir das "regras". Sempre haverá homens e máquinas que vivem e funcionam dentro de moldes previstos e sempre haverá aqueles fogem à norma. Os que se colocam fora da norma são, por um lado, os que nos causam problemas ao ultrapassarem limites em detrimento ao próximo. Mas é fora da norma também que surgem as forças de transformação e os saltos de criatividade. Educar não é tolher nem prender.
Num momento em que a sociedade brasileira discute a redução da maioridade penal, que faz críticas ao ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) ao mesmo tempo em que retira o foco da incapacidade do sistema prisional em reabilitar e das nossas falhas em educar, temo por nossos jovens humanos e pelas nossas jovens máquinas. Se nós, supostos adultos mais ou menos esclarecidos, decidirmos que prender é educar, já não estamos mais educando e perderemos a chance preciosa de ensinar os jovens sobre qualquer princípio ético.
Os cientistas da inteligência artificial, por sua vez, têm de encontrar, para suas máquinas, esse caminho das pedras entre o controle e a liberdade. Eles enfrentam o desafio de criar máquinas construtivas e criativas, mas já sabem que não basta dotá-las de inteligência. Qualquer semelhança com a humanidade é mera coincidência? Que estranho (e por que não que bom) será se a inteligência artificial, já capaz de superar a mente humana em alguns aspectos, possa no futuro ultrapassá-la no aprendizado e no desenvolvimento da ética. Quem sabe assim encontremos caminhos, ao observar aquilo que criamos, de melhorar a nós mesmos.