Da Redação
De alguns anos para cá, nota-se o crescente número de pessoas que se referem às festas de fim de ano como uma causa de estorvo, tristeza e frustração.
Parte da causa disto é a mídia, que transmite uma imagem forçada desta época do ano: ‘repleta de alegria, harmonia e realizações’. A perplexidade das pessoas aumenta à medida que a mídia torna-se mais agressiva, ano após ano, com o intuito de aumentar o desempenho das vendas nesta época, e as pessoas se deparam com dificuldades cada vez maiores em função de crises econômicas, desemprego, arrocho salarial, violência e incerteza em relação ao futuro.
As pessoas veem-se enredadas em um paradoxo: ligam a TV, leem o jornal e as mensagens que lhes são enviadas insistentemente diferem na maioria das vezes da realidade do que elas vivem e sentem. Muitas pessoas, carentes de uma estrutura interna, passam a acreditar que aquela imagem vendida é o real e que elas vivem uma vida errada e fora dos padrões. Em função disso, elas gastam grande parte de suas energias físicas e mentais tentando aparentar uma alegria que não sentem, comprar o que não podem (e nem precisam), distribuir presentes por obrigação (pois há uma associação forçada entre dar presentes e demonstrar amor), distribuir sorrisos que facilmente se desfariam em um ricto (contração labial), não fosse o esforço do riso forçado.
Outro fator causal pode ser creditado à ansiedade e ao perfeccionismo. Pessoas ansiosas podem chegar ao final do ano frustradas e sentindo-se fracassadas porque chegaram até lá sem conseguir cumprir todas as metas que traçaram, embora raramente levem em consideração a possibilidade de terem sido irrealistas ou exigentes demais consigo mesmas, definindo metas difíceis de serem alcançadas. Além disso, tanto perfeccionismo também se reflete nos preparativos para as festas e nas imagens que querem passar para a família e amigos. O desgaste mental provocado por um esforço em agradar a todos e contemplar tudo, organizar, preparar e servir já é tão inevitável para uma pessoa perfeccionista, que seu nível de ansiedade começa uma escalada ascendente assim que surgem as primeiras propagandas de Natal e Ano Novo.
Um terceiro fator está relacionado à necessidade que muitas pessoas têm de enquadrar-se em um modelo ideal: esta é a época do ano para estar em paz e transbordar alegria, amor e compreensão para com os outros, principalmente com a família. Ora, se uma família vive em conflitos durante todo o ano, não será em uma determinada noite que tudo se resolverá como num passe de mágica.
No entanto, a imagem idealizada de Natal é justamente a de estar em perfeita harmonia com a família, o que nem sempre é possível em virtude do estresse crescente estar afetando diretamente as relações familiares e as exigências cada vez maiores no mundo do trabalho estão tirando a maior parte do tempo e do ânimo para se estar em família. Isto é especialmente doloroso para as pessoas que se encontram sozinhas, longe da família ou que não tenham família. Para estas pessoas é literalmente impossível estar na companhia de familiares e enquadrar-se na imagem ideal de passar esta época do ano em harmonia com a família. Esta idealização faz com que elas desejem algo que não têm e que, muitas vezes, nem sentem falta ou que pelo menos estejam adaptadas. Esta “falta” fabricada surge com força no fim de ano, e as pessoas precisam refletir se é isto o que elas realmente desejam ou se elas estão tentando somente se enquadrar em um modelo e assim sentirem-se bem perante a sociedade.
Dicas para não se deprimir no final do ano
– Evite fazer autoavaliação e projetos futuros. Autoavaliações devem ser feitas semanalmente, com planos divididos em pequenas etapas, para não atrapalhar-se com a complexidade ou grandiosidade dos planos. Assim, pode-se adaptar seus planos ao contexto de cada momento. O Natal deve ser visto como época para relaxar e não para provar competência.
– Não deixe tudo para a última hora. Faça as compras com antecedência para não se deixar levar pelo entusiasmo desta época e gastar sem pensar.
– A compulsão por compras pode agravar-se nesta época. Para quem é compulsivo, deve-se evitar sair com cartão de crédito e cheque. Ande com a quantidade de dinheiro necessária para os gastos previstos ou só com uma folha de cheque, se for o caso.
– Para quem está solitário e se sente deslocado da família, o ideal é parar para refletir sobre o tipo de comemoração que a pessoa realmente sente desejo em fazer. Por exemplo, viajar ao invés de pensar em festas de família; compartilhar com os amigos sentimentos sobre as festas de fim de ano; dar a si mesmo aquele presente que sempre quis, mas se negava por achar caro, etc.
Fonte: Ana Beatriz Silva é psiquiatra