Dores no corpo? Caminhos para o tratamento

por Elisa Kozasa

“Para o manejo da dor crônica, é necessário tratamento com equipe multidisciplinar formada por médicos, fisioterapeutas e psicólogos. Nos desconfortos e dores leves, mas constantes, o indicado é procurar um ortopedista ou reumatologista”

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Inverno, 10 graus, um movimento brusco e a coluna “travou”! E agora? Vamos para o pronto-socorro, após radiografias e ressonâncias magnéticas descobre-se que há um problema crônico na coluna. Na realidade a coluna já vinha dando sinais de que não estava muito bem, pois desconforto e dores não muito fortes, mas relativamente constantes já estavam presentes. Esse tipo de relato é mais comum do que imaginamos.

Quando falamos em dor, em especial aquela considerada crônica, estamos falando de um assunto de saúde pública, que resulta em abstenções no trabalho ou até mesmo incapacitação do indivíduo para exercer suas funções. Além disso a dor costuma ser acompanhada de insônia, depressão, problemas de relacionamento, dentre outros prejuízos emocionais.

Apesar de procurarmos fugir da dor e buscar o prazer automaticamente, é importante nos lembrarmos que a dor é um mecanismo de proteção do corpo e ocorre sempre que qualquer tecido esteja sendo lesado. Ela faz com que o indivíduo reaja, para remover o estímulo doloroso agudo. Por exemplo, ficando muito tempo em uma posição, podemos ter destruição tecidual, por falta de fluxo sangüíneo na pele, onde ela é comprimida pelo peso do corpo. Com a dor, deslocamos o peso inconscientemente, para permitir que a circulação se restabeleça, e o tecido volte a receber oxigênio e nutrientes. Uma pessoa que tenha perdido o sentido de dor, como aquela que passou por uma lesão da medula espinal, não se desloca, resultando em destruição total e descamação da pele, nas áreas sob pressão do corpo.

Dor crônica: possíveis causas

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Em muitos casos, porém, a dor é crônica e nem sempre o paciente consegue livrar-se dela. A dor crônica é uma causa importante de incapacitação. A dor crônica impõe estresses fisiológicos, psicológicos, familiares e econômicos, podendo exaurir a energia do indivíduo. As influências psicológicas e ambientais podem desempenhar um papel importante no desenvolvimento dos comportamentos associados à dor crônica, como perda de apetite, distúrbios de sono e depressão. A diminuição da tolerância à dor e depressão pode resultar da depleção (perda) de *serotonina e de endorfinas. Os antidepressivos tricíclicos mostram aliviar uma variedade de síndromes dolorosas crônicas, dando crédito à teoria de que a dor crônica e a depressão podem compartilhar uma via biológica comum.

Além dos tipos de dor, um fator que não pode ser esquecido quando se trata deste tema é que a capacidade dos indivíduos para suportar a dor é variável. As crenças formadas durante o período de socialização contribuem para nosso limiar de dor. Em outras palavras, dependendo de nossa herança cultural, podemos suportar mais ou menos a dor.

Estudo

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**Em um estudo de Bates de 1993, citado por Benson, concluiu-se que em dores crônicas ou prolongadas, como aquelas associadas à artrite ou torção das costas, pacientes hispânicos apresentavam as dores mais intensas, seguidas dos italianos. Ao contrário, os poloneses e franco-canadenses apresentavam índices mais baixos, juntamente com os “velhos americanos” e irlandeses. Asiáticos, africanos e americanos nativos não entraram na amostra.

O entendimento da fisiologia da dor crônica apresenta ainda várias lacunas. Por outro lado, sabe-se que o estudo da interação mente-corpo é fundamental na compreensão da dor em seus vários aspectos. Dessa maneira, para o manejo da dor crônica, é necessário tratamento com equipe multidisciplinar formada por médicos, fisioterapeutas, psicólogos e, em geral, o paciente deve estar disposto a se engajar nos tratamentos na busca de um alívio.

***Kaplan e colaboradores realizaram um estudo preliminar sobre fibromialgia e um programa de práticas mente-corpo que reúne yoga, relaxamento e meditação. A fibromialgia é uma doença crônica caracterizada por dores em várias partes do corpo, fadiga, distúrbios de sono e resistência aos tratamentos. Sua etiologia (origem/causa) específica é desconhecida. Sua prevalência oscila entre 0,5 a 5% da população, ocorrendo na sua maioria em mulheres. Dentre os resultados observados com o programa, os autores destacaram melhoras no bem-estar geral, dores, sono, fadiga, e sintomas médicos em geral.

A literatura científica necessita ainda de novos estudos bem controlados sobre os a relação de práticas mente-corpo sobre dores crônicas, porém o que se observa em boa parte dos estudos nesta temática é que tais práticas além de contribuir para a redução das dores crônicas, aliviam também as dores emocionais representadas pela depressão e ansiedade principalmente.

Sugestão

Que tal prestar atenção nos desconfortos e dores leves mas constantes que podemos apresentar e procurar um especialista (ortopedista ou reumatologista), antes que o problema se agrave? Muitas vezes a indicação de um tratamento que envolva uma correção postural já pode trazer grandes benefícios. Uma vez diagnosticados, os pacientes podem precisar do auxílio de outros profissionais inclusive da área complementar – clique aqui.

*Serotonina e noradrenalina são neurotransmissores (substâncias produzidas pelo cérebro, com funções distintas em diferentes áreas cerebrais). Genericamente, a serotonina, é um dos responsáveis pela sensação de prazer e a noradrenalina está envolvida na reação de luta ou fuga.

**Benson é um cardiologista de Harvard, conhecido por suas pesquisas sobre a relação mente-corpo. Ele cita o trabalho de Bates, mas não especifica a especialidade deste último.

***Kaplan é um dos autores de um trabalho clássico sobre MBSR para fibromialgia, citado em vários trabalhos na área da relação mente-corpo e dor.

Dicas de leitura

Angelotti, G. Terapia cognitivo-comportamental no tratamento da dor. Casa do Psicólogo, 2007.

Astin, J. A.; Berman, B. M.; Bausell, B.; Lee, W.; Hochberg, M. & Forys, K. (2003). The efficacy of mindfulness meditation plus qigong movement therapy in the treatment of fibromyalgia: a randomized controlled trial. The Journal of Rheumatology, 30(10): 2.257-2.262.

Benson, H. & Stark, M. (2001). Medicina espiritual: o poder essencial da cura. Rio de Janeiro, Campus.

Guyton, A. C. & Hall, J. E. (2002). Sensações somáticas: II. Dor, cefaléia e sensações térmicas. In: Tratado de Fisiologia Médica. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 10ª. ed., p. 516.

Kaplan, K. H.; Goldenberg, D. L. & Galvin-Nadeuau, M. (1993). The impact of a meditation-based stress reduction program on fibromyalgia. General Hosital. Psychiatry., 15(5): 284-289.

Porth, C. M. (2002). Função somatossensorial e dor. Fisiopatologia. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 6ª. ed., p. 1.075.