por Patricia Gebrim
Janeiro é um mês tranquilo para mim. Quase todo mundo está viajando, o que não me dá outra opção a não ser diminuir o ritmo também. Fico com cheiro de praia e olhos de estrelas e nesses momentos, que delícia, me lembro de mim.
Que doença horrivel é o esquecimento, esse esquecimento da alma que anda endurecendo as pessoas por aí. Não que não aconteça comigo, porque até eu endureço (que pena!). Começa devagarzinho, uma rigidez aqui, uma cobrança ali… e quando vejo… já estou agindo como uma máquina fazedora de coisas.
Cheia de dor nas costas e apertos no peito, fico assim quando endureço. E você?
O pior de tudo é esquecer das estrelas. Quando esquecemos das estrelas perdemos o brilho no olhar.
A cidade é um desafio, são tantas as luzes artificiais que não se pode ver as luzes da natureza. É quase impossível se ver até mesmo um vagalume na cidade e quando aparece um, mal sabe ele que corre o risco de ser alfinetado e guardado para a eternidade. Gente dura acaba fazendo coisas assim, gente que esqueceu das estrelas… você entende porque me incomoda tanto o esquecimento?
Quando esquecemos quem de verdade somos, damos de cara com um vazio que angustia, e o vazio fala assim dentro de nós:
– O que estou fazendo aqui mesmo?
Na ausência da resposta, para fugir da dor do não saber, nos lançamos a atividades frenéticas e fazemos, fazemos, fazemos… tanto “fazer” faz com que, por alguns instantes, nos sintamos com algum sentido. Passa rápido, eu sei, o sentido que vem das coisas mundanas. Como fogos de artifício, brilham por alguns segundos, deixando no ar um cheiro de queimado, cheiro de coisa-bela- artificial- que-não-preenche-coração.
Aproveito para escrever tudo isso hoje porque acabei de voltar de férias e estou com a alma lavada de água do mar. Minha cor hoje é azul e não faço tanta questão de fazer sentido, hoje gosto mais de brincar com as palavras, que vão brotando deste teclado antes mesmo que eu saiba o que planejam escrever. Minha mente ainda está lenta de tanta areia de praia e aproveito a brecha para correr à sua frente antes que ela acorde, lógica e racional, com sua caneta vermelha que acha saber mais do que os meus dedos rebeldes. Hoje confio mais nos meus dedos. Amo vocês, dedos!
Eu queria que você se “lembrasse”, queria que confiasse mais naquilo que antecede as palavras. Todos sabemos muito das coisas, antes de pensar, antes de saber. Quando pensamos, emburrecemos a alma. Eu queria você de alma sábia e viva, queria que você sentisse o que estou dizendo sem dizer, queria que você não se incomodasse se não conseguisse compreender, pois as mais belas e verdadeiras coisas da vida não são aquelas que compreendemos e sim as que tocam nossas profundezas.
Eu queria conseguir continuar assim molinha, sem tanto querer. Queria continuar assim, sem tanto esforço em fazer sentido, mas sei que esse delicado estado de ser escorre por entre meus dedos e se vai aos poucos. Queria que eu e você conseguíssemos “nos lembrar”, todos os dias, e que ao nos lembrarmos fossemos capaz de sonhar com um mundo mais belo. E quem sabe sonhando pudéssemos juntos pintá-lo em uma tela bem grande e colorida, para que todas as outras pessoas se lembrem também.
Somos mais do que pensamos ser, lembra?
Não deixe que a velocidade de tudo atropele seu caminhar. Respire fundo quando se perceber perdendo o ritmo, quando se perceber sentindo medo, quando se perceber desconfiando de tudo e de todos. Todos precisamos reaprender a relaxar.
O ano está começando, seus sonhos estão despertando nesse novo dia e se é que existe um sentido neste texto, eu o traduziria em um pedido, que sopro em sua direção:
– Neste dia, neste ano … não deixe sua alma morrer!
E que sejamos capazes de nos “lembrarmos”, neste e em todos os dias de nossas vidas.