por Regina Wielenska
A Psicologia investiga há décadas as consequências de viver sob a influência de eventos aversivos incontroláveis. Martin Seligman foi um dos pioneiros nesta área. O seu livro "Desamparo" resume alguns dos aspectos cruciais da questão: muitos indivíduos, humanos e não humanos, quando submetidos a intensas ou prolongadas condições aversivas sob as quais não tenham controle podem apresentar alterações comportamentais.
Uma boa parte dessas alterações é análoga à depressão, o indivíduo pode se tornar apático, reduz suas atividades, entra num modo de funcionamento pouco motivado e bem menos competente. Há prejuízos maiores, em situações aversivas de real controlabilidade, a pessoa torna-se incapaz de reconhecer soluções, comporta-se como se estivesse frente a um problema sem solução. E também ocorre um aumento das reações de emotividade física, sugerindo um estado de estresse prolongado.
Isso pode ocorrer como decorrência de um sequestro, um casamento abusivo, testemunhar violência contra terceiros, bullying, viver sob condições climáticas extremas e sem recursos de proteção, há uma série enorme de eventos aversivos capazes de nos ameaçarem física ou psiquicamente.
Os efeitos da exposição à incontrolabilidade podem ser minimizados em muitos casos se houver uma história passada de enfrentamentos bem-sucedidos de situações difíceis, dolorosas e/ou aversivas. É como se o contato com pequenas adversidades fosse uma vacina frente ao que de pior pudesse nos acometer. Mas essas coisas não são uma perfeita equação algébrica, com resultados claros. Muitas variáveis podem mudar o que vai resultar da exposição à incontrolabilidade dos eventos aversivos e este pequeno artigo não abarcará tudo isso.
Eu me pergunto o que acontecerá as multidões atualmente forçadas a sofrer durante as prolongadas e duras jornadas da imigração (uma solução ilegal mas absolutamente necessária e justa). Enfrentaram miséria e antes disso testemunharam atrocidades em seus locais de origem. Vários de seus familiares e amigos não sobreviveram e eles se dispõem a tentara vida em outra cultura. Aí tem início a horrorosa busca por um território que os acolha, e isso tem sido tão difícil quanto terem sobrevivido no país devastado de onde fugiram. Os países em condição de receber imigrantes relutam usualmente em aceitar a entrada e permanência dos refugiados. Este é outro estressor importante.
Há alguns anos, principalmente desde o ataque às Torres Gêmeas em NY, muitas nações enfrentam ataques de grupos oponentes. Explosões, tiroteios, aviões derrubados, execuções em massa, isso tudo afeta pessoas inocentes. Escrevo sob o efeito dos ataques ocorridos dia 13 de novembro em Paris. Uma triste gota a mais no oceano da violência.
E aí me pergunto, quais serão os efeitos devastadores da brutalidade generalizada sobre o comportamento dessa gente inocente?
Temo uma atmosfera geral de depressão coletiva, mais perigosa se for disfarçada por um estado de alienação induzida por certos segmentos das redes sociais e pelas ofertas de consumo. Espero estar errada, mas uma pitada de lúcido pessimismo ameaça tomar conta de mim.
Pra ser franca, não me sinto capaz de ajudar o mundo em sua dimensão caótica generalizada, mas reconheço que psicólogos qualificados conseguem sucesso com vítimas de trauma. A ciência do comportamento, ao lutar pela recuperação de uma vida de qualidade e digna para cada vítima pode, de certo modo, estar fazendo sua parte no sentido de defender a justiça e a paz. Há muitos jeitos de fazer alguma coisa boa e humanitária pelas vitimas, são atos de amor ao próximo, mesmo que aparentemente pequenos. Saiba que assim podemos nos imunizar contra as consequências desse cenário de adversidade fora de nosso controle e, ao mesmo tempo, ajudar aqueles que sofreram o inimaginável.