por Edson Toledo
“Taijin kyofusho, fobia típica no Japão, é um exemplo de como valores culturais podem causar transtornos mentais”
A palavra cultura vem do latim colere e significa cultivar.
Genericamente a cultura inclui o conhecimento, a arte, as crenças, a lei, a moral, os costumes e todos os hábitos e aptidões adquiridos pelo homem não somente em família, mas também por toda a sociedade. Em termos gerais, podemos definir a cultura como um legado ou conjunto de visões, normas e valores comuns.
Diz respeito aos atributos compartilhados de um determinado grupo.
Os antropólogos muitas vezes descrevem a cultura como um sistema de significados comuns. E como há varias maneiras de definir um grupo cultural, por exemplo: por etnicidade (índios, latinos, asiáticos, africanos), religião (católica, evangélica, espirita, islâmica, budista), região geográfica (nordeste, sul, Oriente Médio, Países Baixos, Oceania), grupo etário (crianças, adolescentes, adultos, idosos), orientação sexual (homossexual, heterossexual) ou profissão (engenheiro, médico, professor, jornalista, advogado, escriturário, jardineiro), muitas pessoas se consideram tendo identidades culturais múltiplas (luso-brasileiro, nipo-brasileiro, anglo-brasileiro, afroamericanos).
A sociedade e a cultura cumprem um papel central nos transtornos mentais e consequentemente na saúde mental e de forma mais ampla nos serviços de saúde mental como um todo. Entender os papéis abrangentes da cultura e da sociedade possibilita que o campo da saúde mental elabore e preste serviços que melhor respondam às necessidades de todos que buscam por assistência.
Com uma gama aparentemente interminável de subgrupos culturais e variações individuais, a cultura é importante porque influencia aquilo que todas as pessoas trazem para o setting (consultório) clínico. Ela pode explicar variações sobre como os pacientes comunicam seus sintomas e quais desses eles informam. Alguns aspectos da cultura também podem estar por trás das síndromes condicionadas pela cultura, ou seja, conjuntos de sintomas muito mais comuns em algumas sociedades do que em outras.
Fobia japonesa
Um exemplo é a taijin kyofusho, uma fobia culturalmente singular do Japão, que se assemelha em alguns aspectos à fobia social. Essa síndrome refere-se ao intenso medo de um individuo de que seu corpo, parte ou funções dele, desagradem, embaracem ou ofendam outras pessoas, devido à sua aparência, odor, expressões faciais ou movimentos. Essa síndrome é tão relevante para a cultura japonesa que está incluída no sistema diagnóstico oficial do Japão para transtornos mentais.
Mais frequentemente a cultura influencia se as pessoas chegam a procurar ajuda (por exemplo: as mulheres vão mais ao médico que os homens, os homens geralmente evitam procurar ajuda do proctologista). Que tipo de ajuda procuram (por exemplo: não posso receber transfusão de sangue no caso dos praticantes da religião “Testemunha de Jeová”), de que estilos de enfrentamento e apoios sociais dispõem e quantos estigmas atribuem aos transtornos mentais. Quanto aos estigmas nem precisa de exemplo para ilustrar os preconceitos que os transtornos mentais trazem aos seus portadores e por vezes aos familiares.
A cultura é um conceito que não se limita a pacientes, já que também se aplica aos profissionais que os tratam. Cada grupo de profissionais corporifica uma “cultura”, no sentido de que eles também possuem um conjunto de visões, normas e valores compartilhados.
Dizer que os profissionais de saúde mental têm sua própria cultura não diminui o valor das verdades universais descobertas por seus campos. Em lugar disso, quer dizer que a maioria dos profissionais de saúde compartilha uma visão de mundo em termos da relação entre corpo, mente e ambiente, informada pelo conhecimento adquirido por meio de método científico. Significa também que os clínicos veem sintomas, diagnósticos e tratamentos de maneira que por vezes divergem das visões de seus clientes, principalmente quando as origens culturais de ambos são distintas. Tais divergências de ponto de vista podem criar barreiras para um cuidado eficaz.
Dito isso, a ideia aqui é a de que as culturas das quais os pacientes e profissionais de saúde vêm, moldam a saúde mental e afetam os tipos de serviços de saúde mental que eles usam. Assim as diferenças culturais devem ser levadas em conta para garantir que todos recebam atenção em saúde mental adequada às suas necessidades.