por Roberto Goldkorn

Um dos grandes antropólogos do séc. XX, defensor ferrenho da teoria da agressividade não inata do homem, Ashley Montagu, escreveu o seguinte: 'Tudo o que o homem aprendeu o fez com o próprio homem'.

Apesar de nem de longe poder me comparar aos conhecimentos dele, posso de forma abusada discordar dessa afirmação, e perguntar: "E o homem que ensinou ao homem, aprendeu com quem? Podemos ir assim por diante, até chegarmos a um beco sem saída, do tipo: quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?

Os nossos primeiros ancestrais apesar de intelectualmente inferiores aos seus descendentes, tinham duas características muito humanas e atuais, que podem responder a esse desafio. Eram imitadores natos e bons observadores. Assim, ao se descobrir 'humanos', ou talvez até bem antes disso, eles se viram numa espécie de jardim de infância cheio de 'tios' e 'tias' prontos para imitá-los e aprender lições de sobrevivência. E quem era esses 'tios' e 'tias'? Os animais é claro.

Assim, foi observando e imitando o comportamento dos animais que os nossos 'pitecos' aprenderam a caçar, a combater, a defender seu território, a conquistar as fêmeas, a cuidar dos filhotes de forma adequada, a curar-se com a ajuda das ervas, a evitar os venenos, construir habitações e muito mais.

Assim os animais foram as primeiras criaturas a incorporarem o panteão de imagens míticas, a compor as lendas e, por conseguinte, a fazer parte do inconsciente coletivo na qualidade de arquétipos. Assim ao longo do tempo esses modelos de quatro patas foram evoluindo dentro da psique coletiva assim como nós evoluímos.

Os arquétipos, ao contrário dos animais de verdade, evoluem também de acordo com as nuances culturais, mas estão sempre grudados na mente coletiva, se manifestando na arte, nos nossos sonhos, nas nossas fantasias e lendas, tudo isso naturalmente sendo a manifestação exterior da uma relação bem interior. Quando a milenar cultura chinesa constrói um ama astrologia baseada nos animais, está fazendo exatamente isto. Por mais modernos que sejamos, ainda somos fortes como um Urso, agressivos como um tigre, covardes como uma hiena, negativos como um urubu, veloz como um cavalo, lerdos como uma tartaruga, divertidos como um macaco (de imitação) e por aí vai.

Mas não são apenas nos adjetivos que nos identificamos com os arquétipos animais, também no comportamento, e até nas feições podemos incorporar um ou mais animais. Ao identificarmos o animal arquetípico 'que existe em nós' podemos melhorar o nosso autoconhecimento e ao mesmo tempo ter alguma idéia do que a vida nos reserva. Antes temos de entender o viés cultural do arquétipo.

Na China por exemplo, o veado é muito positivo, e está relacionado com a jovialidade, a alegria de viver. O sapo também é positivo para os chineses, enquanto para nós tipifica a feiúra (engolir sapo, sapo que virou príncipe, etc). O dragão animal mítico que para nós ocidentais, depois do advento do cristianismo, virou símbolo do mal, do grotesco, enquanto que na China é o maior símbolo do céu. Por isso para muitos essas correlações podem parecer arbitrárias e preconceituosas, e não deixam de ser como todos os aspectos da psique moldadas por uma determinada cultura.

Também é importante ressaltar que as características arquetípicas dos animais nada ou quase nada tem a ver com a sua constituição biológica, mas guarda sim relações mais ou menos próximas com seu comportamento percebido, o que constitui um estudo chamado etologia.

Para facilitar abaixo segue uma lista apenas ilustrativa para você encontrar o seu 'animal interior'.

Escolha seu 'animal interior'

Águia
Negativo: Vaidoso, implacável, cruel, arrogante, talento usado para oprimir e se distanciar das pessoas comuns
Neutro: Inteligência e rapidez de raciocínio. Individualismo e elitismo
Positivo: Arrojado, criativo, audacioso, protetor, sagaz, e futurista

Leão
Negativo: Invejoso, misógino, acomodado, violento, explorador
Neutro: Agressivo, egoísta, libidinoso, territorialista
Positivo: Nobre, heróico, líder, protetor, entusiasmado, corajoso

Elefante
Negativo: Displicente, distraído, acomodado, cabeça dura, aproveitador
Neutro: Corporativista, dependente, moroso, agressivo, submisso
Positivo: Familiar, protetor, comprometido, responsável, sério e bem humorado na hora certa, confiável

Macaco
Negativo: Irresponsável, infantil, imaturo, egocêntrico, pernóstico
Neutro: Inteligente (esperteza), vivacidade, rapidez de raciocínio, agilidade na tomada de decisões, intuitivo
Positivo: Alegre, otimista, criativo, voltado para o grupo, grande mobilidade social

Baleia
Negativo: Anacrônica, ultra-conservadora, reacionária, agressiva, possessiva
Neutra: Indiferente ao que não lhe diz respeito, visão estreita do mundo (doméstica), dependente, hesitante, vaga
Positiva: Compenetrada, responsável, criteriosa, zelosa, sagaz

Serpente
Negativa: Dissimulada, falsa, agressividade disfarçada, covarde, prepotente, incapaz de criar e manter vínculos afetivos
Neutra: Indiferente, incapaz de demonstrar sentimentos, individualista, inteligente, competente, carreirista
Positiva: Sábia, madura, "gurua", discreta, ponderada, boa ouvinte

Lobo
Negativo: Irascível, impiedoso, psicótico, solitário, assediador, frio, incapaz de ter sentimentos por alguém
Neutro: Corporativista, industrioso, alerta, rápido nas decisões, agressivo, familiar
Positivo: Versatilidade social, comunicativo, sentimental, solidário, caloroso, combativo, perseverante

Vaca
Negativo: Permissiva, lasciva, indolente, caprichosa, volúvel, leviana
Neutro: Influenciável, indiferente, passiva, ansiosa, obstinada
Positivo: Dadivosa, carinhosa, zelosa, interessada, boa ouvinte, madura e sensata

Formiga
Negativa: Agressiva, impulsiva, xenofóbica (territorialista) possessiva, cruel, obcecada
Neutro: "Normótica", inflexível, reativa, corporativista, temerosa, coletivista, sociável, seguidora das leis, mantenedora do status quo
Positivo: Industriosa, habilidosa, sacrificial, organizada, sistemática, prevenida, perseverante

Raposa
Negativo: Ladina, esperteza antiética, inteligência posta a serviço dos poderosos, mercenária, egocêntrica, agressiva e maldosa.
Neutra: Esperteza, criatividade, habilidade em sobreviver em ambientes hostis, vivacidade, alegria.
Positivo: Maternal, inteligência, comprometimento, agilidade, carinhosa, sedutora, sofisticada, elegante

Bem esses são apenas alguns dos animais que habitam em nós. Escolha o seu. Veja com qual você se identifica, com qual os seus amigos lhe identificam. Depois pense: qual o destino que o seu animal normalmente tem na selva? E projete isso para a selva social em que vivemos.

Destino animal

O destino do animal é uma mistura do seu destino biológico e mitológico – a maneira como ele existe na selva da mente humana.. Assim dependendo de como se manifesta o seu animal – na verdade, temos vários animais agindo em nós, talvez uma mais atuante – vamos ter certos enredos e certos finais. Por exemplo, a serpente deveria ser sábia, e o que significa isso? Ficar na moita, não chamar atenção sobre si. Se ela for arrogante e quiser aparecer, ou morder, vai atrair o medo humano e conseqüentemente a perseguição e a destruição. O leão, se perder a sua altivez e a coragem, será destronado rapidinho por outro leão que de verdade faz o seu papel. Bom safári!