por Patricia Gebrim
Noites de insônia, no meu caso, acabam, se transformando em artigos como este, que surge neste exato momento em que o sono decidiu me abandonar. Parte de mim quer que eu durma, afinal preciso acordar muito cedo amanhã. Mas outra parte, rebelde, se recusa a deixar esse fio brilhante de vida escapar e, na ânsia de sorver cada momento, quer escrever, sentir a passagem do tempo, viver!
Assim somos nós, eu e você. Todos os dias acontece assim: parte de você quer isso… outra parte aquilo. Precisamos aprender sobre isso se quisermos encontrar alguma paz em nossos dias. Talvez as guerras às quais costumamos acompanhar nos noticiários sejam meros reflexos dessa guerra que acontece, quieta e sem alarde, nos subterrâneos de nosso próprio ser. Dessa luta na qual cada parte de nós agarra a ponta de uma corda, que se estica e acaba se transformando em ansiedade, dor, irritação … Muitas vezes esse embate interno se transforma na tensão que sentimos em nosso corpo a cada dia.
Quantas vezes, se prestarmos atenção, essa corda se estica em nosso íntimo? O tempo todo precisamos escolher e cada escolha é, inevitavelmente, o campo fértil para um possível conflito. Um dia você acorda com dor de cabeça e mal humorado, e lá que a corda se estica toda enquanto você reluta entre ficar em casa embaixo das cobertas ou ir trabalhar assim mesmo. Outro dia você conhece uma pessoa que parece interessante e bacana, e novamente vê a corda se esticar. Devo acreditar, confiar, relaxar? Ou é melhor me proteger, me defender, desconfiar?
A verdade é que não é fácil viver sendo esticado para cá e para lá o tempo todo. Então sugiro que você preste atenção ao que vou lhe dizer. Para sair desse lugar tão desconfortável existe uma única pergunta que você precisará responder. Não é uma pergunta fácil, eu admito. Pode ser que você não saiba a resposta neste momento, mas se esse for o caso, de certa forma, você terá encontrado um objetivo, algo que irá conduzi-lo na direção certa, até que um dia, lá na frente talvez, você finalmente se liberte desse cabo de força infernal. Assim, se você não souber responder esta pergunta, dedique-se em tentar descobrir a resposta e eu garanto que isso, por si só, já irá aliviar a tensão.
Mas, voltando à pergunta … aí vai:
– Quem é você? Quem é esse ser a que você se refere quando fala "Eu"?
Ou, em outras palavras… quando você vê aquelas duas partes suas brigando, cada uma agarrada a uma ponta da corda … quem é você? E para ampliar sua percepção eu lhe perguntaria:
– Você é uma daquelas partes lá embaixo? Ou é quem observa a briga lá de cima e vê as duas partes briguentas segurando as pontas tensas da corda?
Razão de um lado, emoção de outro. Ou … ética de um lado, desejo do outro. Podemos pensar em muitos níveis de separatividade.
Porque se você acreditar que é uma daquelas partezinhas briguentas, não terá muito a fazer a respeito do cabo de guerra lá embaixo. E irá sentir todas as emoções da luta, e o esforço, o cansaço, os ferimentos da batalha arderão como brasas em seu corpo … E você estará tão empenhado em ganhar o embate que não poderá avaliar a situação com mais clareza. Nem se dará conta do absurdo que é uma luta entre você e… você!
Mas se você conseguir olhar para aquilo de fora, se conseguir observar o conflito acontecendo lá embaixo , com certo distanciamento, sem se tornar prisioneiro de nenhuma daquelas polaridades … aí sim, terá uma visão mais abrangente, terá clareza e força para transformar a tensão em entendimento, em consciência. E de posse dessa consciência, saberá fazer a melhor escolha, a mais saudável, a mais sábia, a mais pacífica, a escolha que mais esteja em sintonia com a sua essência. Seu corpo se tornará mais relaxado e sua vida fluirá com muito mais leveza.
Quem sabe, ao soltar a corda, consiga finalmente transformar a tensão de seu dia a dia na leveza suave com que as crianças se lançam às suas brincadeiras diárias?
Pois a vida não é para ser vivida com o peso e a seriedade que acabamos lhe conferindo. A vida pode ser leve, sem deixar de ser profunda… mas isso só os seres alados podem saber!
Em tempo … todos nós somos seres alados, apenas precisamos nos lembrar disso.