por Raphael Concli
É comum que se associe o consumo de alimentos como frutas e vegetais à manutenção de uma vida saudável. De fato, pesquisas diversas apontam como este hábito associa-se à redução do risco de diversas doenças, como câncer, diabete e doenças cardiovasculares. Entretanto, se estas constatações podem ser ditas com segurança em relação à população adulta, o mesmo vale para adolescentes?
Esta é a questão geral que guiou os autores do artigo “O papel das frutas e vegetais na saúde cardiovascular de adolescentes: uma revisão sistemática”, que ganhou destaque na edição de maio deste ano da Nutrition Reviews, uma das publicações mais importantes do mundo no campo da nutrição.
Embora o estudo tenha notado que o consumo de frutas, legumes e verduras por adolescentes está muito abaixo da recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) de cinco porções ao dia, não é possível afirmar que este baixo consumo esteja relacionado a riscos cardiovasculares em pessoas nesta faixa etária. E a própria medição deste consumo é também um problema.
“Os adolescentes são um grupo etário pouco estudado, por conta da sua alta complexidade e constantes alterações biológicas, psíquicas e sociais.”
De modo geral, pesquisas na área “costumam associar a ingestão de alimentos ricos em gorduras saturadas, sódio e açúcar com o desenvolvimento de indicadores de risco cardiovascular em adolescentes”, afirma Tatiana Collese, primeira autora do artigo e doutoranda em medicina preventiva pela Faculdade de Medicina (FM) da USP. Entretanto, “os adolescentes são um grupo etário pouco estudado, por conta da sua alta complexidade e constantes alterações biológicas, psíquicas e sociais”, adiciona a pesquisadora, o que leva a uma falta de definição clara sobre o que de fato seja risco cardiovascular nestas pessoas. Além disso, como o consumo de frutas e vegetais neste grupo é muito baixo, não é possível afirmar quais efeitos este hábito pode ter em sua saúde.
Ausência de critérios
O resultado inconclusivo deriva da falta de critérios comuns dentre a própria comunidade científica neste tipo de pesquisa.
Mais de 5.600 artigos a respeito da relação de riscos de doenças cardiovasculares em adolescentes e consumo de frutas e vegetais foram considerados no estudo. Como conta Tatiana, em muitos destes a classificação do que é ser adolescente diferia daquela adotada pela OMS: pessoas maiores de 10 e menores de 19 anos.
Notou-se também uma grande variedade de métodos para classificar o consumo de frutas e vegetais neste grupo. “Não há consenso quanto ao melhor método para se avaliar o consumo alimentar em adolescentes”, diz Tatiana. Além disso, constatou-se inclusive a falta de padronização nos critérios sobre o que é risco cardiovascular em adolescentes.
“Antigamente, as doenças cardiovasculares surgiam apenas nos nossos avós. Não se cogitava medir indicadores, como a glicemia ou a pressão arterial, nos adolescentes, já que era muito improvável desenvolver tais riscos em idades precoces sem ser congênito. Portanto, estudar risco cardiovascular em adolescentes é assunto inconclusivo”, destaca a pesquisadora.
De todo modo, revisões como esta permitem justamente identificar caminhos que futuras pesquisas podem percorrer, a fim de mostrar se aquilo que se observa em adultos pode ser dito de adolescentes. Como diz Tatiana, o trabalho do grupo ressalta “a necessidade de padronização destes critérios, a fim de se obter uma classificação unificada, capaz de estimar a prevalência global de risco cardiovascular em adolescentes e possibilitar comparações válidas entre as nações”.
Fonte: Agência USP