Da Redação
A depressão é uma doença com prevalência maior entre as mulheres do que entre os homens, e o grande número de queixas por parte delas levou a psicóloga Mirna Yamazato Koda a investigar a produção dos sintomas depressivos nas mulheres atendidas em serviços de Saúde Pública.
A pesquisa Depressão em mulheres: um estudo a partir dos vínculos familiares e sociais foi apresentada no Instituto de Psicologia (IP) da USP e observou um grande contexto de sofrimento comum a todas as mulheres estudadas, mostrando a depressão como um problema de ordem social, e não apenas biológico.
A pesquisadora percebeu o alto índice de mulheres que procurava o serviço público de saúde com queixas de ansiedade e depressão. Todas elas apontavam fatores como o isolamento social, a não inserção no mercado de trabalho, problemas familiares e algum tipo de violência sofrida.
Partindo disso, a psicóloga iniciou um estudo qualitativo sobre essas mulheres, suas histórias de vida, os fatores que as influenciam e o desenvolvimento da doença em cada uma. Mirna utilizou a psicanálise de grupo como suporte teórico, que considera os seres humanos sempre inseridos em um contexto familiar e social, não sendo possível desvinculá-los disso, o que deixa de considerar aspectos puramente físicos e biológicos para o desenvolvimento da depressão. “A depressão normalmente é tratada sob o ponto de vista biológico, com o estudo do cérebro, mas ela também reflete um contexto social. O número de casos dessa doença, por exemplo, vem aumentando muito nos últimos tempos, o que reflete todo o estilo de uma sociedade”, completa.
Para o estudo, orientado por Maria Inês Assumpção Fernandes, foram entrevistadas seis mulheres com sintomas de depressão ou já em tratamento contra a doença. Elas responderam a um questionário semiestruturado sobre suas relações interpessoais, sua trajetória de vida e contexto social. A pesquisadora observou que na história de vida delas há uma série de sofrimentos e marcas traumáticas. Elas vêm de uma família pobre, sofreram com violência em algum estágio da vida (e essa violência muitas vezes se repete), tiveram que começar a trabalhar muito cedo para ajudar nas despesas, têm uma situação financeira precária e problemas famíliares sérios (como a dependência química). Segundo Mirna, elas têm marcas traumáticas durante toda sua vida. “Os sintomas surgiram a partir de um momento de ruptura no suporte familiar ou social que elas tinham. É como se elas já se encontrassem em uma certa vulnerabilidade e então se instaurou um processo depressivo”, diz.
No estudo, a psicóloga fez um levantamento socioeconômico das mulheres entrevistadas, que eram todas entre os 30 e 55 anos de idade, casadas ou separadas e com filhos. Só uma delas tinha emprego fixo, as outras ou faziam bicos ou já haviam parado de trabalhar. Elas também não tinham muito tempo de estudo. Embora algumas até quisessem estudar, fazer uma faculdade, as condições financeiras não permitiam isso.
Gênero
“A questão de gênero também está posta no sofrimento, ela atravessa também o modo de adoecer e o sofrimento. As mulheres conquistaram muitas coisas nos últimos anos, mas também houve uma sobrecarga e acúmulo de tarefas. Além disso, o tipo de dificuldades enfrentadas difere em cada classe social, e as mulheres do estudo, que são pobres, são as mais atingidas pelas adversidades”.
Para Mirna, sua pesquisa vai ao encontro de outros estudos atuais, que tratam da depressão como um problema de ordem social, além da biológica. Assim associa-se o adoecimento a um contexto, o tipo de atenção que vai ser dada ao paciente sofre mudanças: passa a ser levado em conta não só o aspecto da saúde, mas também sua história, sua condição de vida e rede social.
“Foi uma pesquisa qualitativa, compreensiva, numa tentativa de compreender esse fenômeno a partir do que ele podia revelar de uma conjuntura”, acrescenta.
Ela acredita que o conhecimento dessa questão pode mudar a prática dos psicólogos, que podem repensar o cuidado que dão para essa parcela da população (mulheres pobres) atendida nos serviços públicos de saúde.
Mais informações: e-mail: mkoda@usp.br
Fonte: Agência USP de Notícias