Da Redação
Crianças e adolescentes brasileiros veem a violência como um aspecto mais concreto e, com o passar do tempo, conseguem tornar o conceito mais abstrato, percebendo aspectos mais sutis. Porém, tal transição não ocorre de forma satisfatória.
Em muitos aspectos, a violência permanece sendo percebida de maneira concreta até entrar na fase adulta. A esse fato, a pesquisadora Tamires Alves Monteiro, do Instituto de Psicologia da USP, atribui o papel das instâncias de formação do sujeito, sendo a escola a principal delas.
Tamires formulou a dissertação A construção da noção de violência em crianças e adolescentes inseridos em diferentes contextos movida por perguntas como: O que as crianças e os adolescentes brasileiros entendem por “violência”? É algo muito diferente da visão dos adultos? Qual é a influência do meio social nas diferentes percepções? Tal noção se torna mais complexa conforme avançam os estágios da inteligência?
Graduada em pedagogia pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Marília, Tamires partiu da pesquisa desenvolvida durante a iniciação científica para sanar questões que ficaram em aberto, como a relação do conceito simplista de violência na mente das crianças e adolescentes com as estruturas da inteligência e a influência do meio social nesse fenômeno.
Exploração do trabalho infantil: violência mais sutil
A pesquisadora se baseou nas teorias de pensadores como Jean Piaget e Juan Delval para analisar a construção do conhecimento social com abordagem do tema da violência e contou com a orientação da professora doutora Maria Thereza Costa Coelho de Souza. Por se tratar de um tema polissêmico (com mais de um significado), a violência teve três abordagens estudadas por Tamires em seu mestrado: psicanálise, psicologia social e psicologia da aprendizagem.
Para realizar a pesquisa, Tamires aplicou as provas operatórias de Piaget durante entrevistas individuais de uma hora de duração com os entrevistados com idades de 6 a 18 anos. Em seguida, fez oito perguntas do tipo “O que é a violência para você?”, “Você já viu alguma violência?”, “Quem faz a violência?” para avaliar a complexidade dos conceitos apresentados. Exibiu, ainda, o filme Jonas e Lisa (1994), de uma série do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) chamada “Direitos do Coração”.
Percepção da violência concreta na agressão ao cachorro
Violência mais sutil
Tamires quis saber se as crianças e os adolescentes percebiam as violências mais sutis, como a presença de moradores de rua e a exploração do trabalho infantil. Porém, como foi constatado com as provas operatórias, a maioria dos entrevistados ficou presa à ideia de violência concreta (como em uma cena de Jonas e Lisa em que o homem chuta o cachorro, por exemplo).
Em geral, as respostas variavam, mas levavam à mesma constatação. Alguns adolescentes diziam que o homem nasce violento, demonstrando uma concepção consoante com a psicanálise. Outros diziam que quem nasce em um ambiente violento reproduz a violência, indicando que o fenômeno é um produto do meio social em que a pessoa está inserida – ideia que converge com a modelagem trabalhada pela psicologia da aprendizagem.
Reflexões sobre o tema na escola
“A violência é um tema pouco explorado na escola”, afirma Tamires. Apesar de a instituição muitas vezes estar imersa em um universo violento, não há a proposta de reflexões contestadoras que vá além de simples pesquisas e levantamento de dados. Isso contribui para enraizar o fenômeno na sociedade brasileira, aponta.
A pesquisadora destaca que as instituições que são responsáveis pela formação do sujeito não contribuem para tornar a compreensão mais complexa que o estágio elementar. Se o conhecimento é passado só na transmissão, não há elaboração ou tomada de consciência sobre o assunto. Ela critica a falta de abordagem da violência como fenômeno além do ambiente acadêmico. A discussão é ampla entre os sociólogos e antropólogos, mas não permeia outros campos do conhecimento.
Como propostas de solução, Tamires propõe pesquisas de intervenção para que a violência seja pensada sob a perspectiva da ética e da moral. Ela pretende elaborar essas pesquisas junto a jovens infratores em sua tese de doutorado, planejada para os próximos anos.
Foto: Reprodução /Unicef
Mais informações: (11) 3091-4178 ou e-mail: ipcomunica@usp.br, no IP Comunica – Serviço de Apoio Institucional
Fonte: Agência USP de Notícias