Da Redação
“Os maiores riscos de afastamento de trabalho por doenças mentais foram verificados entre mulheres” No Brasil, os transtornos mentais são a terceira causa de longos afastamentos do trabalho.
Na Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, pesquisa do médico do trabalho João Silvestre da Silva-Júnior mostra que um ambiente de trabalho com pouco apoio social, excessivas demandas, baixo controle sobre as tarefas, recompensas inadequadas ao nível de esforço do trabalhador e comprometimento individual excessivo são fatores que aumentam a chance de ocorrência de afastamento. O estudo recomenda uma melhor investigação sobre as condições psicossociais no ambiente de trabalho para implantação de ações de prevenção, além de maior fiscalização das empresas por parte de orgãos públicos.
A pesquisa procurou discutir os fatores associados ao afastamento do trabalho por transtornos mentais. “No Brasil, esses afastamentos estão atrás apenas dos traumas e doenças osteomusculares”, afirma Silva-Júnior, lembrando que, “de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), em alguns anos se tornarão o principal motivo para os trabalhadores se afastarem do trabalho em todo o mundo”.
Em 2011, segundo o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), mais de 211 mil pessoas foram afastadas devido ao adoecimento mental por prazo superior a 15 dias e passaram a receber benefício auxílio-doença. “O valor total gasto com pagamento de novos benefícios supera os R$ 200 milhões, o que reforça a necessidade econômica de medidas de prevenção para evitar o adoecimento”.
Silva-Junior entrevistou 385 pessoas que foram solicitar benefícios na unidade de perícia do INSS no Glicério (Centro de São Paulo), entre as quais 160 apresentaram transtornos mentais. “Os questionários incluíram perguntas sobre dados sociodemográficos, hábitos e estilos de vida, como fumar, beber e realizar atividades físicas”, conta. “Também foi perguntado o tipo de trabalho desempenhado e há quanto tempo; além da percepção da presença de fatores psicossociais que indicassem a existência de um ambiente de trabalho estressor que pudesse levar ao problema mental. Por fim, os trabalhadores foram questionados sobre sua condição de saúde atual, como excesso de peso ou outros adoecimentos associados”.
De acordo com o médico, os maiores riscos de afastamento de trabalho por doenças mentais foram verificados entre mulheres, pessoas que se referiram como de cor branca, com alta escolaridade (mais de 11 anos de estudo), que fumavam muito e apresentavam consumo elevado de bebidas alcóolicas. “Com relação ao ambiente, as pessoas que vivenciavam situações de violência no trabalho tinham mais chances de vir a se afastarem devido a distúrbios mentais”, afirma. “Também houve influência de fatores psicossociais negativos, como a realização de trabalho de alta exigência, no qual estavam envolvidas muitas tarefas, sem controle da parte do trabalhador. A presença de dois ou mais problemas de saúde também aumentava a chance”.
Apoio social
Silva-Junior ressalta que as chances dos trabalhadores pedirem afastamento são maiores em ambientes onde não há apoio social dos colegas de trabalho. “Além das relações interpessoais serem muito ruins, essas pessoas vivenciam situações onde se esforçam muito e não têm uma recompensa adequada”, observa. “Além disso, um comprometimento excessivo com o trabalho aumenta as chances de acontecerem transtornos mentais incapacitantes”.
A pesquisa sugere aos profissionais de saúde e segurança do trabalho um olhar mais atento sobre fatores psicossociais presentes nos locais de trabalho, de modo que possam realizar ações de prevenção das faltas ao trabalho por doença. “O Brasil não possui uma legislação trabalhista específica sobre o tema, considerado um risco ocupacional invisível”, alerta o médico. “A área médica das empresas precisa trabalhar em conjunto com os setores produtivos e de recursos humanos para identificar situações de risco, a fim de propocionar uma condição de trabalho adequada à apacidade do trabalhador”.
O médico afirma que os resultados do estudo podem auxiliar na elaboração de políticas públicas da relação entre saúde mental e trabalho. “A pesquisa também recomenda que os dados do Ministério da Previdência Social auxiliem os Ministérios da Saúde e do Trabalho na intensificação da fiscalização para combater situações agressivas aos trabalhadores”, conclui. O estudo de Silva-Junior é descrito em dissertação de mestrado apresentada na FSP em agosto de 2012, com orientação da professora Frida Marina Fischer.
O trabalho foi aceito para apresentação no formato tema livre no 15º Congresso Nacional da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (http://www.anamt.org.br/15congresso/), que acontece no mês de maio, em São Paulo. Também deverá participar, no formato pôster, da 23rd Conference on Epidemiology in Occupational Health (EPICOH) (http://www.epicoh2013.org/), que ocorrerá no mês de junho na Holanda.
Mais informações: e-mails jsilvestre@usp.br e joaossj@gmail.com, com João Silvestre da Silva-Júnior
Fonte: Agência USP de Notícias