por Luiz Alberto Py
Existe uma expectativa disseminada em nossa cultura de que a psicanálise seria um método de entender porque um indivíduo apresenta problemas emocionais e quais os fatos de seu passado que contribuíram para isto. E que esta compreensão geraria uma cura dos problemas emocionais chamados de neuroses. Penso que esta era a crença inicial dos psicanalistas e que ela se instaurou porque havia um grande desejo por parte deles de investigar a origem dos distúrbios emocionais. Tal desejo os levou a acreditar que esta averiguação seria terapêutica. Daí se seguiu o entendimento de que existe a necessidade de pesquisar o que se passou na vida emocional de uma pessoa para poder curá-la de seus problemas.
Por vezes, um novo cliente chega ao meu consultório falando de seu interesse em aprender de onde, em sua vida, se originaram seus problemas, querendo saber o quando o como e o porquê de suas dificuldades. Costumo responder que ele precisa escolher se quer saber sobre a origem dessas dificuldades ou se prefere resolvê-las. É claro que todos optam pela solução e não pela investigação.
Então proponho que focalizemos nossa atenção e nossos esforços nesta segunda proposta, deixando a compreensão em segundo plano.
A tendência moderna da psicanálise é praticar uma forma de terapia que privilegia o analisando e não os interesses subconscientes do analista. O foco está em melhorar, da forma mais imediata possível, a situação do cliente. Usam-se, para tanto, os conhecimentos dos processos humanos de funcionamento mental a partir das observações de Freud e de todos os analistas que se seguiram e fizeram contribuições à sua obra.
Origem médica
Freud, o criador da psicanálise era médico, da mesma forma que a maioria de seus primeiros discípulos. E eram médicos do fim do século 19 e do princípio do século 20, o que particulariza a forma como eles viam a presença da medicina na vida das pessoas. Esta origem médica da psicanálise fez com que a terminologia inicialmente utilizada para falar do assunto estivesse carregada de expressões e conceitos médicos. Esta é a razão pela qual os psicanalistas costumavam – e alguns ainda costumam – usar palavras e principalmente conceitos tais como cura, tratamento, doença, alta quando se referem ao processo psicanalítico, ainda por cima chamando seus clientes de “pacientes” como costumam fazer os médicos. Isto mostra que a ideologia em ação para lidar com a investigação dos processos de funcionamento da vida emocional humana era a mesma maneira como os médicos encaravam o procedimento frente a seus pacientes.
Uma abordagem mais moderna do processo psicanalítico o vê como um aprimoramento em vez de tratamento, entende que as pessoas têm dificuldades e não doenças, aceita que o processo tem um momento de interrupção decidido pela conveniência do cliente em vez de pensar em uma alta resolvida autoritária e unilateralmente pelo analista. E acredita que o cliente sempre pode continuar a melhorar como pessoa e que, portanto, neste sentido não se pode falar em cura, já que não há doença nem tratamento.
Esta maneira de ver o processo psicanalítico o afasta da conceituação médica em voga há cem anos, na época de Freud, e o aproxima da visão atual da medicina. Isto porque hoje em dia a medicina já vê de outra forma o processo de intervenção na saúde de seus pacientes. Enquanto antigamente, na medicina ocidental, o foco era quase que exclusivamente o tratamento das doenças, hoje em dia existe um grande investimento na tendência a aprimorar a saúde das pessoas para evitar que elas adoeçam ou para fazer com que estejam em melhores condições para enfrentar as doenças e suportar, com o máximo de vigor, o peso da idade.
Esta ênfase na medicina preventiva, tradicional na medicina oriental, vem se desenvolvendo ao longo das últimas décadas. Testemunhos disto são as recomendações médicas acerca da importância de se evitar o excesso de peso e de se praticar regularmente exercícios físicos juntamente com a preocupação com o vício de fumar e o abuso das drogas, principalmente o álcool que embora entre nós seja uma droga lícita – ou talvez por isso mesmo – é a droga que causa mais problemas à saúde pública.
A meu ver, é desejável que a psicanálise, nos dias de hoje, se oriente pela ênfase nas características emocionais e mentais positivas dos clientes. Para assim se propor a reforçá-las e, com o auxílio delas, neutralizar os elementos negativos que geram sofrimentos e dificuldades existenciais. Uma pessoa que desenvolve auto-estima e autoconfiança constrói uma personalidade mais robusta e por isto mais capaz de enfrentar e dissolver suas hesitações, ansiedades, depressões e demais dificuldades emocionais.