por Ricardo Arida
Como demonstrado em textos anteriores, a atividade física ou exercício físico regular em crianças promove muitos benefícios durante o desenvolvimento, assim como consequências positivas em fases mais tardias da vida.
Por exemplo, estudos mostram um melhor desempenho acadêmico em crianças que praticam atividade física. Ainda, outros trabalhos mostram uma correlação positiva entre condição física e melhora da cognição em adolescentes. Entretanto, muito do que sabemos sobre efeitos do exercício no sistema nervoso central durante o período da infância e adolescência deriva de estudos em animais e não em humanos.
Considerações éticas não permitem reproduzir os achados que são encontrados em experimentos com animais. Contudo, alguns estudos permitem direcionar ou medir esses benéficos em crianças. Dentre os vários trabalhos encontrados na literatura sobre esse tópico, vale a pena ressaltar um importante estudo realizado recentemente por um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo com animais em desenvolvimento, publicado numa revista de grande impacto na área científica: a Hippocampus.
Gomes da Silva e colaboradores (1) mostraram um aumento da plasticidade cerebral na fase adulta quando os animais eram treinados durante o período de adolescência. Para se ter uma ideia do ocorrido nesse trabalho, precisamos ter em mente algumas informações e conceitos importantes sobre essa plasticidade cerebral.
Mudanças estruturais e funcionais ocorrem no sistema nervoso durante toda a vida. Os mecanismos pelos quais essas modificações ocorrem constitui um processo conhecido como plasticidade (do grego plaistikos, que significa “formar”). A plasticidade permite que o sistema nervoso central adquira novas informações para aprender, reorganizar as redes neuronais, e se recuperar de lesões cerebrais.
Os mecanismos básicos que estão envolvidos na plasticidade incluem fatores anatômicos, neuroquímicos, metabólicos e eletrofisiológicos (alterações nas propriedades elétricas das células). Em geral, essas modificações são adaptativas e benéficas, mas também podem provocar alterações negativas para o cérebro em algumas situações (2).
Como mencionado anteriormente, existem evidências que o exercício físico durante a infância e adolescência pode ser favorável para o desenvolvimento cerebral
Veja textos anteriores:
1- Atividade física durante adolescência pode melhorar função cerebral?
2: Atividade física pode melhorar capacidade de atenção das crianças?
3: Melhora da função cardiovascular está associada ao aumento da cognição em jovens
Os autores brasileiros avaliaram a plasticidade cerebral de ratos submetidos a um programa de exercício físico durante o período adolescente. Os resultados demonstraram que o exercício físico aumentou a densidade de axônios (prolongamentos da célula nervosa) e a expressão de um fator neurotrófico chamado BDNF (fator neurotrófico derivado do encéfalo), proteína responsável por regular a sobrevivência neuronal, a plasticidade sináptica do sistema nervoso periférico e central, o processo da aprendizagem e memória e recuperação após lesão neuronal. Essas modificações foram detectadas no hipocampo, uma região do cérebro relacionada com processos emocionais e cognitivos.
Outro achado importante nesse estudo foi que exercício físico durante o desenvolvimento aprimorou a aprendizagem e a memória desses animais, e melhorou a capacidade de evocar as memórias em estágios posteriores, corroborando com estudos em humanos que mostram uma correlação entre a atividade física na infância e benefícios cognitivos ao longo da vida (3). Outros estudos precisam ser realizados para verificar os mecanismos e benefícios do exercício físico nesse período da vida.
Em conjunto, esses achados indicam que o exercício físico no início da vida pode modular a maturação funcional do cérebro. Os benefícios da atividade física durante esta fase da vida são de grande relevância para o desenvolvimento de políticas públicas destinadas a estimular programas de exercícios físicos para a população, especialmente para crianças e adolescentes.
(1) Gomes da Silva S, Unsain N, Mascó DH, Toscano-Silva M, Amorim HA, Araújo BHS, Naffah-Mazzacoratti MG, Mortara RA, Scorza FA, Cavalheiro EA, Arida RM. Early exercise promotes positive hippocampal plasticity and improves spatial memory in the adult life of rats. Hippocampus 2010.
(2) Johnston MV. Plasticity in the developing brain: implications for rehabilitation. Dev Disabil Res Rev 2009;15:94-101.
(3) Sibley BA, Etnier JL. The relationship between physical and cognition in children: a meta-analysis. Pediatr Exerc Sci 2003; 15:243-256.