por Lilian Graziano
“Mais tarde, à tentativa de se educar o homem para que ele se desenvolvesse em sua plenitude, tornando-se um cidadão exemplar, deu-se o nome de paideia”
Volto sempre à Grécia Antiga em meus estudos e pensamentos para tentar explicar a alunos de meus cursos o que houve com nossa sociedade, o porquê de atravessarmos uma crise de valores, identidade e significados em nossas vidas – a razão de nosso esgotamento psíquico, emocional e da não realização de todas as nossas potencialidades vem de instituições que se tornaram cada vez mais desfavoráveis ao florescimento humano.
Tento dizer a eles que o tempo dedicado à educação e à formação dos indivíduos era aproveitado de maneira muito diferente. E que era enorme a importância dada às instituições e às contribuições humanas no sentido de fortalecê-las pelo bem-estar geral. Dois conceitos muito interessantes da Antiguidade grega ilustram muito bem essa relação.
O primeiro, um ideal pioneiro de educação, vem de aretê (em grego, quer dizer virtude, excelência): o homem era estimulado a alcançar plenitude moral, física, glória e superação; ser “bom e belo” era o objetivo máximo da formação proporcionada nesse momento, com vistas à interação mais que positiva dos indivíduos com seu meio – as assembleias, a pólis entre outras máximas da organização da vida grega.
Mais tarde, à tentativa de se educar o homem para que ele se desenvolvesse em sua plenitude, tornando-se um cidadão exemplar, deu-se o nome de paideia (paidos = criança/ paideia = criação de meninos), cujo objetivo era ensinar aos indivíduos a nobreza, baseada em tradições e também em valores como liberdade e justiça.
Sobre o tempo para tais práticas, durante anos, por exemplo, crianças e jovens aprendiam como se converter em seres humanos melhores, por meio dos jogos desportivos, dos exercícios físicos e da música e da Ciência, em um convívio propício à disciplina (no sentido de reforçar e manter hábitos saudáveis), ao pensamento crítico, criativo e à valorização da cultura ancestral, das gerações anteriores. Muito tempo depois eram, de fato, alfabetizados e adquiriam outros conteúdos até mesmo para que desempenhassem ofícios.
Hoje, embora a paideia ainda seja um modelo almejado, os anos dedicados à formação do homem são escassos para aquilo que enobrece o caráter, enriquece a convivência e venha a suprir nossas necessidades de interação em um meio político e social. Conteúdos diversos preenchem, nesse tempo, o espaço que é o da reflexão, do exercício de uma vida virtuosa, do olhar para si e para a comunidade. O ofício é escolhido antes mesmo de sabermos o que de melhor temos para oferecer ao mundo. Nem a família nem a escola conseguem promover uma formação integral comprometida com esse conhecimento.
Não formamos mais homens para a vida: preparamos seres autômatos, individualistas e solitários para exercerem suas profissões, para um mínimo de “sustentabilidade” e consciência coletiva. E sem tempo para refletir sobre isso.
Não por acaso, a Psicologia Positiva resgata, então, a ideia aristotélica de felicidade, que a coloca como fruto, também, de uma vida virtuosa. Ser feliz, na lógica aristotélica, é a finalidade máxima da vida, assim como o é para a Psicologia Positiva. E é preciso descobrir e exercitar nossas virtudes para chegar lá.
Então é questão de tempo, de olhar para si e para o outro, de entender sua posição “como governado ou governante”, tal como entendiam os preceptores e pupilos na paideia. E, na ausência disso tudo, é possível enxergar, então, por que a sociedade adoece e a Psicologia Positiva surge como a disciplina mais procurada de Harvard, capaz de promover instituições positivas pelo simples fato de considerar que as virtudes humanas precisam ser exercitadas para o desenvolvimento pleno individual, até que esse alcance a coletividade e que a felicidade seja um bem e uma preocupação pública, mais do que uma conquista pessoal!