por – Marcio Berber Diz Amadeu – Psicólogo componente do NPPI
No serviço de atendimento do NPPI temos percebido um aumento na demanda por orientações relativas ao uso de aparelhos móveis como tablets e celulares. É um assunto um tanto quanto incomum ainda, mas parece que a cada dia o interesse e as preocupações relativas ao uso desses equipamentos vêm aumentando.
De maneira geral, a preocupação das pessoas quanto ao uso desses aparelhos se resume a estas duas questões: “Estou viciado em meu smartphone/tablet?” ou “Com que idade meu filho pode ter um iPad (ou tablet)?”.
Na primeira, percebemos as preocupações com o uso excessivo, as impressões de desligamento das pessoas que ficam o dia inteiro no smartphone e as pessoas que desejam saber o quanto pode ser patológico se relacionar mais pelo celular do que por fora dele.
Bom, de certa forma todo mundo conhece alguém que não larga seu smartphone ou tablet por nada, certo? Pode ser num evento social como uma festa, um jantar com amigos ou um bar, esse (a) sujeito (a) fica o tempo todo com o aparelho nas mãos dividindo a sua atenção entre o que acontece presencialmente e na internet. Essa cena pode inclusive ocorrer em qualquer ambiente, como a escola, casa ou trabalho. Será que alguém que age assim pode ser considerado “viciado em smartphones, iphones ou tablets”?
Como já dissemos outras vezes, o vício em tecnologia nunca surge a partir da tecnologia em si. Não podemos dizer que a internet ou aparelho celular viciam, pois essas são apenas ferramentas. Seu uso exagerado é sempre desencadeado por outros fatores, muitas vezes ligados à dinâmica da família, dos relacionamentos, etc. Sendo assim, o mesmo pode ser estendido sobre o uso excessivo de smartphones ou tablets. O aparelho dificilmente seria o causador do vício, mas, ao contrário, apenas acaba se tornando o foco das atividades quando algo na nossa vida não vai bem.
Mas no caso da tecnologia móvel as coisas ficam um pouco mais complicadas. Diferente dos computadores ou videogames, esses aparelhos não têm um objetivo claro como servir de ferramenta de trabalho ou entretenimento num dado ambiente. Ninguém utiliza o seu tablet apenas na sala, pois eles foram criados para serem usados quando estamos de “passagem”, quando não há uma atividade clara sendo realizada, quando estamos com pressa (e precisamos de alguma informação rápida) ou quando estamos simplesmente ociosos. Suas interfaces em geral são ágeis, simples e tornam o seu uso fácil em qualquer lugar. Ou seja, de certa maneira, esses aparelhos acabam se tornando uma extensão do nosso corpo, uma vez que estão sempre a postos para serem usados.
Por isso tão é difícil dizer o quão patológico pode ser esse uso. É complicado diferenciar até onde estamos usando o aparelho por que somos capazes de usar (e nossa vida não é prejudicada por isso) ou por que necessitamos dele para nos relacionar.
Há outro medo muito comum ligado a esses aparelhos: o do isolamento social proveniente do uso de celulares e smartphones. É fácil ter a impressão de que aquela pessoa que fica o tempo todo com seu iphone na mão está isolada do mundo, correto?
Mas será que isso acontece mesmo?
Ao utilizar o smartphone não estamos interagindo com alguém de alguma maneira?
Muito provavelmente estamos utilizando e-mail, Facebook, Twitter ou algum outro aplicativo social. Sabemos que a qualidade dessa troca é diferente do contato presencial, as conversas pela palavra escrita não são exatamente iguais às trocas feitas pela palavra falada (especialmente num cenário móvel). Não sentimos o cheiro, não vemos o olhar, não nos sentimos observados, mas podemos afirmar que em alguns casos essas interações podem ser tão profundas quanto estarmos diante da outra pessoa.
Se conversamos com alguém pelo smartphone/tablet, na presença de outras pessoas, isto significa apenas que preferimos interagir com alguém distante em lugar de presenciar o encontro que ocorre naquele momento. É simplesmente uma escolha. Muitas vezes o presencial é entediante se comparado à relação que eu estou estabelecendo via 3G neste momento. Por exemplo, seria difícil se concentrar numa reunião de trabalho quando a pessoa que estou “a fim” manda um SMS, certo?
Não queremos aqui julgar a qualidade dessas interações, mas é interessante notar como a internet na palma da mão pode não isolar, mas apenas reconfigurar as relações presenciais.
Voltando um pouco ao início, outra dúvida muito comum que recebemos, é em relação à idade ideal para se usar um tablet. A resposta curta é: “depende”.
Uma criança muito nova tem acesso muito restrito a um computador porque usá-lo depende da aquisição da linguagem. Não há como usar um teclado sem antes saber o alfabeto. E pode-se fazer muito pouco apenas com o mouse, já que compreendê-lo depende do aprendizado de que ao movimentar o aparelho, a seta se move na tela. Convenhamos que a compreensão dessa relação pode não ser muito fácil para uma criança de 2-3 anos, não é mesmo?
Já os tablets, possuem características muito mais similares às do mundo físico e por isso é tão fácil usá-los. Praticamente não há aprendizado envolvido. Mesmo as crianças pequenas obtém uma resposta imediata ao apertar um ícone da sua tela e por isso, mesmo tão novas, já entendem o seu funcionamento. É como se eliminassem o intermediário entre o mouse e a seta.
O maior cuidado que devemos ter é justamente com o próprio aparelho, afinal não espere que uma criança de 3 ou 4 anos tenha o cuidado necessário ao manusear o seu “brinquedo tecnológico”, ou que ela compreenda como funcionam os aplicativos e a internet. Apenas tenha em mente que crianças muito novas se interessarão apenas pela resposta visual ou sonora ao toque.
Provavelmente o conceito mais batido da nossa era é: “As mudanças causadas pela internet”. Engana-se quem pensa que as mudanças provocadas pela rede mundial de computadores em nossas vidas cessaram. A computação móvel está mudando (e ainda vai mudar muito) o nosso modo de nos relacionarmos e de enxergar o mundo.
Então, resumindo, a nossa principal dica para os leitores preocupados com uso excessivo de celulares/tablets é sugerir que reflitam sobre esta questão: por que o conteúdo daquela tela de 4 polegadas se mostra tão interessante e, ao mesmo tempo, por que o mundo fora dela parece tão pouco atraente?
Já para os que se perguntam se podem deixar o iPad nas mãos do filho pequeno, podemos dizer: não há contraindicação, a menos que vocês não se importem com a destruição ocasional do seu aparelho…