por Regina Wielenska
Imagine um homem ranzinza, chato, metódico, obsessivo pela ordem e seguimento de regras, que fala na lata o que estiver pensando, pouco interessado em agradar e manter contato social com as pessoas. Funcionário responsável, viúvo, sem filhos, praticamente só possuía colegas de trabalho, um homem de 57 anos e sem amigos.
Dele você gostaria de manter distância, certo? Pois é. Esse é Ove, o protagonista do filme "Um Homem Chamado Ove", Direção: Hannes Holm (http://www.imdb.com/title/tt4080728/ ).
Se você odeia spoilers, melhor não ler minha singela coluna de hoje, porque, para abordar o que desejo enfatizar, farei menção a alguns aspectos do filme. Pois é, a existência de Ove é tão amarga que o suicídio lhe parece a melhor alternativa, ele queria muito reencontrar no além sua amada esposa, falecida de câncer seis meses antes.
O filme sueco é estupendo, mescla doçura e amargor, humor e drama com notável precisão. Pude rir enquanto chorava, e várias vezes. Eu o recomendo fortemente, como um exercício para favorecer o desenvolvimento da empatia. Ao longo da trama nos apaixonamos por Ove, torcemos por ele, sofremos com ele. O interessante é ter acesso aos importantes aspectos da história de vida: sua orfandade, aos quatro e dezoito anos, as limitadas habilidades sociais do pai (não tenho certeza, mas talvez Ove fosse filho de um indivíduo portador de um quadro leve do espectro autista). Some a tudo isso as admiráveis características emocionais e intelectuais da belíssima esposa. Muitos outros fatores nos levarão a entender esse homem, e logo estamos apaixonados por ele, lhe desejando um destino de doçura e amor.
Ao longo do filme vamos descobrindo as formas de fragmentar a rigidez amarga de Ove. Perseverança, fé na vida, pragmatismo, cordialidade obstinada, necessidades básicas não preenchidas, esses são alguns dos fatores que levaram o protagonista a um outro patamar de vida, e nele sentimos amor, solidariedade, objetivos partilhados, Ove e tudo ao seu redor floresceu. Não quero desvendar na minha pequena coluna como o milagre se processou, mas tudo começa com a energia de uma mulher brutalmente resiliente, tal como a esposa de Ove.
Eu aposto nos poderes da arte, torço para que Ove e sua história comovente ajudem cada um de nós a desenvolver tolerância para com os que pareçam amargos, rígidos, difíceis no trato diário.
Na verdade, algumas dessas pessoas só precisam de boas doses de amor, valorização e escuta atenta. Conhecer a história de vida de alguém nos auxilia a construir um melhor entendimento, passamos a aceitar o outro, um milagre que surge pelas vias da bondade e da justiça.