Por Danilo Baltieri
Depoimento de uma leitora:
“Fui usuária de crack durante longos sete anos, fui presa por três e hoje me encontro bem, sem nenhum tipo de vício. Mas tenho um problema muito grande com irritabilidade, transtorno bipolar, esquecimento, ansiedade e inquietação. O que devo fazer? Lembrando estou limpa há quase cinco anos.”
Resposta: Em primeiro lugar, receba meus cumprimentos por esse tempo de abstinência dessa substância com efeitos tão reconhecidamente devastadores.
Por se tratar de quadro clínico altamente desafiador durante o manejo médico e psicossocial, a Síndrome de Dependência de Cocaína/Crack demanda continuidade no acompanhamento por profissionais habilitados, mesmo anos após o último consumo da droga.
Isso é recomendado devido às altas taxas de problemas médicos e psicossociais associadas com o consumo prévio e prolongado da droga, bem como devido aos próprios aspectos inerentes ao uso problemático das substâncias, como é o caso das recaídas e lapsos, doenças clínicas e psiquiátricas associadas.
Alguns estudos têm verificado que os melhores resultados ? em termos de abstinência completa das substâncias ? estão positivamente associados com uma boa inserção social e no mercado de trabalho do dependente, um satisfatório suporte familiar/marital, e com condições psiquiátricas prévias não severas.
No entanto, é bastante comum a coexistência entre dependência de cocaína/crack e certos Transtornos Mentais, como depressão, ansiedade, transtornos de personalidade. Caso tais Transtornos Mentais sejam já pretéritos ao uso das substâncias, esse consumo só agravará os seus parâmetros clínicos. Mais do que 20% dos portadores de problemas com o uso de substâncias (desconsiderando aqui o uso na vida de álcool) portam algum Transtorno Mental. Outrossim, é possível que o consumo das substâncias possa induzir quadros mentais similares àqueles não propriamente induzidos.
Em um caso e/ou no outro, a parada do consumo significará melhora nos sintomas dos demais Transtornos Mentais, pelo menos em algum grau. No entanto, a parada do consumo e o tratamento específico para o problema com o consumo de substâncias não significa que todas as condições clínicas e psiquiátricas estejam sendo concomitantemente tratadas. Se estas condições psiquiátricas coexistentes não forem adequadamente manejadas clinicamente, as chances de recaídas e/ou mesmo o sofrimento clínico do portador da condição dual (problemas com o consumo de substâncias e outros Transtornos Mentais) serão preocupantes e desgastantes.
Muitas vezes, e infelizmente, o tratamento dos portadores de problemas com o uso de substâncias é compartimentalizado, ou seja, os serviços existentes para o manejo de tais problemas são carentes em profissionais com habilidade e expertise para diagnosticar e propor terapêuticas para os outros problemas psiquiátricos coexistentes.
Durante o tratamento clínico dos problemas relacionados com o consumo de cocaína/crack, não é tarefa das mais simples determinar se o coexistente Transtorno Psiquiátrico (por exemplo, um quadro depressivo) é um mediador, moderador ou mesmo indutor do uso problemático. Clinicamente, o profissional deve envidar esforços para realizar o diagnóstico ou os diagnósticos corretamente e com sobriedade.
Por outro lado, o portador deve envidar esforços para assumir todos os passos recomendados e manter seu tratamento. Muitas vezes, este tratamento não deve terminar no momento em que o usuário deixa de usar a droga. O tratamento pode ser muito mais longo do que esta data.
Procure seus médicos e profissionais da saúde que lhe prestaram tão valiosa ajuda. Se isso não for possível, procure novo serviço de atendimento aos portadores de Transtornos Mentais.
Boa sorte!
Atenção!
Este texto não substitui uma consulta ou acompanhamento de um médico psiquiatra e não se caracteriza como sendo um atendimento.