por Renato Miranda
Algumas pessoas realizam certas atividades com máximo desempenho, com alto grau de motivação, em um estado mental em que as mesmas parecem fluir; mostram um esforço produtivo e o mesmo é associado a várias emoções relacionadas a comportamentos positivos e funcionais, como a eficácia, concentração absoluta e alegria espontânea. O pesquisador Mihaly Csikszentmihalyi deu o nome de Flow-feeling. Em uma tradução livre: sentimento de fluidez ou simplesmente fluxo.
Naturalmente esse tema se tornou importante nos esportes, pois projeta novas perspectivas na motivação para o desempenho e compreender o fenômeno do treinamento esportivo: da iniciação, ao treinamento de alto nível.
Já escrevi em livros e artigos anteriores (veja aqui) sobre o tema e percebo que a teoria do Flow-feeling, como uma teoria geral e não exclusiva do esporte, consegue explicar o comportamento humano motivado em várias circunstâncias e setores de atuação da vida humana: estudos, trabalho, artes, esportes, lazer e experiências diversas.
Provocado em resumir e explicar o flow (fluxo) de forma sucinta e prática para atletas, alunos, colegas e especialistas em esporte, parto do princípio de que ao compreender as dimensões especiais do Fluxo, a compreensão é decerto facilitada.
Pois então, vamos lá!
Fusão entre ação e atenção:
Quando um atleta de qualquer esporte ao executar movimentos sofisticados e complexos, preferencialmente sob pressão (por resultado, desempenho ou qualquer outra expectativa), com precisão e ao mesmo tempo demonstrando “certa facilidade” ou “naturalidade”, de fato estamos a presenciar um nível de concentração tão preciso e harmonioso que a ação do atleta é algo como se fosse um “prolongamento” ou “parte” de seu corpo.
Ação e atenção não são percebidas pelo atleta como algo diferente e então ele simplesmente faz o que tem de ser feito. Sem questionamentos, vacilo ou medo de errar. Há uma sintonia altamente precisa entre o atleta e a atividade, de modo que o atleta controla os focos principais da ação e ao mesmo tempo outros registros de informação disponíveis são também controlados.
Como exemplo, observe um atleta de alto nível de surfe executando manobras espetaculares em uma onda decisiva de um campeonato. Quando as pessoas imaginam que o mesmo está por finalizar suas manobras, ainda consegue realizar um “tubo” (surfar dentro da onda!) espetacular!
Um outro exemplo é assistir um piloto de motociclismo profissional, como Valentino Rossi e Marc Marques, ao fazerem uma curva em alta velocidade e ao mesmo tempo controlarem o adversário em uma defesa de posição.
A dimensão – fusão entre ação e atenção do fluxo – encontra uma ótima analogia na fotografia feita com uma lente grande angular. É a lente preferida dos fotógrafos profissionais para captarem uma linda cena de paisagem, como um campo rupestre, uma praia deserta ou a imensidão de um cânion.
Isto porque essa lente é capaz de manter o foco em um ponto específico da paisagem (no primeiro plano da imagem, por exemplo), mas manter todas as outras informações (detalhes) da cena também em foco. Como resultado a fotografia terá todos os detalhes da cena nítidos.
Talvez a fusão entre ação e atenção explique a habilidade que atletas de alto nível têm de controlar várias situações (previsíveis e imprevisíveis) e ao mesmo tempo realizar movimentos incríveis, com resultados que encantam as pessoas e faz desses movimentos aquilo que se convencionou chamar de beleza! No texto a seguir tratarei das outras dimensões especiais do Flow-feeling.