por Luciana Ruffo – psicóloga componente do NPPI
Um dos temas que sempre surge quando alguém nos procura para conversar sobre as relações entre a psicologia e a informática é a polêmica questão da relação entre os jogos e a violência.
A cada dia são lançados novos jogos que, no entender dos adultos, incitam a violência podendo eventualmente influenciar as crianças e adolescentes de hoje a se tornarem mais agressivos. Será mesmo verdadeira essa impressão?
Se fizermos uma análise mais profunda do nosso dia-a-dia, será inevitável perguntar quem surge primeiro: a violência urbana ou a violência nos jogos. Sem dúvida, uma é reflexo da outra.
No nosso entender, a criança busca jogos com conteúdos violentos como uma forma de elaborar a realidade com a qual ela tem de conviver em seu dia a dia.
Quando ela joga um game e "mata" o inimigo, ou "mata" as "forças do mal", está explorando em si mesma o potencial para lidar com as adversidades, para se sentir forte e poderosa visando encarar o dia-a-dia real, permeado de situações que ela sente serem maiores do que ela. Essa é versão atual das tradicionais formas lúdicas de se elaborar dificuldades.
Em nossa infância, brincávamos de mocinho e bandido. Usávamos armas de plástico e nos "matávamos", com direito a grandes performances, se jogando no chão e fazendo sons que simulavam a dor da morte. Nem por isso a maioria de nós se tornou bandido ou têm uma moral questionável.
O adulto que se vê diante desses jogos, tende a achá-los mais violentos do que as brincadeiras da sua infância, pois imagina como reais as cenas que ali vê. Ele não "pensa" as cenas do jogo como expressões da fantasia. Quando vê um personagem atirando em outro, associa essa cena à dor da perda, da agressão além de outros fatores, que no geral não permeiam a mente de uma criança diante do mesmo jogo. Vale observar que os jogos têm faixas etárias sugeridas, e isso pode ser uma dica sobre o que é saudável ou não em determinada idade.
Que fique claro: não pretendemos fazer aqui uma apologia dos jogos violentos, nem defender sua liberação total e irrestrita. É importante ter em mente que para tudo na vida a moderação é fundamental. Se além do jogo a criança ou adolescentes tem uma vida presencial saudável, vai para a escola, conversa com amigos, mantém outras atividades lúdicas dentro de casa (não relacionadas ao jogo) além de um convívio satisfatório com os pais, então tudo bem.
Não será plausível esperar que crianças e adolescentes fiquem longe dos games se não tiverem outras ofertas de atividades. Entre ver televisão e jogar, estaremos no mesmo patamar, tanto no âmbito de exibir violência como no de entreter. O mais relevante não é o veículo em si, mas a forma como os pais lidam com essas ferramentas, ao oferecerem alternativas de lazer aos filhos. É importante propiciar a eles a chance de outras atividades construtivas, com interação humana presencial, facilitadoras de aprendizados.
Games: risco do vício
Muitos pais optam por deixar seus filhos diante do videogame por medo da violência urbana. É mais fácil agir assim, pois "sabem onde eles estão" e o que estão fazendo, ou seja, desse modo, evitam os "riscos da rua". Mas essa opção tem um preço. Se eu fizer de meu filho um prisioneiro dentro de casa e só lhe oferecer o videogame como opção de lazer, é quase inevitável que ele se "vicie" nessa atividade. Alguns pais esquecem que sua função inclui a tarefa de colocar limites e propiciar variadas atividades saudáveis aos seus filhos.
Quando o "vício" em games se instala, vale observar e avaliar a vida global da criança ou do adolescente. Geralmente esse vício reflete que algo não está bem na sua vida presencial, e que alguma questão psicológica está se apresentando e precisa ser olhada com atenção. É comum, por exemplo, na base do vício localizar-se alguma forma de depressão.
E quais são os sinais? Como reconhecer que o vício se faz presente?
Seguem algumas "dicas": O assunto predominante das conversas do jovem passa a ser sobre os jogos; os amigos passam a ser só aqueles que se interessam pelo mesmo game; a linguagem muda e começam a ser incorporados termos típicos usados no jogo em questão. O cansaço começa a tomar conta da vida desse jovem, e com isso o rendimento escolar cai. Se, por alguma razão, a pessoa não tem acesso ao videogame fica irritada ou ansiosa.
Para os pais, que se defrontam com uma situação desse tipo, um bom caminho a seguir é tentar entender o significado que seu filho está atribuindo àquele jogo. Olhar para a situação (ao menos em um primeiro momento) sem julgamento, tentar se aproximar, visando entender a função que essa atividade está assumindo na vida de seu filho. De preferência, tentar até mesmo aprender como jogar. Por vezes, os pais poderão ficar surpresos com os efeitos obtidos com essa maior proximidade: poderão começar a "conhecer", não apenas o game em questão, mas, seu próprio filho (a), a partir de um contato mais próximo com as coisas ou atividades que lhes são tão atraentes.
Mas, se essa aproximação não for suficiente, a busca de uma ajuda profissional poderá ser a alternativa para se obter uma solução satisfatória.