por Edson Toledo
Denis, um gato de dois anos, na Grã-Bretanha, deu inicio ao seu momento de astro, com direito à página no Facebook, perfil no Twitter e milhares de acesso de vídeos que exibem seus furtos em seu canal do Youtube; tudo gerado após ser flagrado por câmeras de segurança furtando sapatos, cuecas, camisetas, uma boneca e até uma bola de futebol na pacata vizinhança da cidade de Luton onde ele reside.
Curiosamente assim que o gatuno se apropria dos itens alheios ele os traz para sua dona que diz se sentir constrangida, mas nada pode fazer para conter o ímpeto do felino, porem a proprietária do animal guarda todos os objetos, na eventualidade de algum vizinho querer reclamar por algum dos objetos surrupiados.
Utilizei esta quase-fábula para introduzir um assunto que toda vez que vem à tona ou se tenta falar nele, vem contaminado pelo triplo preconceito: por ser uma doença mental, ser confundido como um crime e ser impregnado pela moral.
Estou me referindo à cleptomania cujas causas são desconhecidas. No entanto, acredita-se que certos fatores podem servir de motivação para o ato, tais como: uma forma de substituir um comportamento agressivo, uma reação ao estresse, uma resposta a perdas pessoais significativas do passado ou atuais ou ainda a busca de uma gratificação não consciente ao sentimento de tristeza, angústia ou de ansiedade.
Para os desavisados a cleptomania é um transtorno psiquiátrico e está classificado na "bíblia da psiquiatria", o DSM-V da Associação Psiquiátrica Americana como um transtorno do controle do impulso, onde o indivíduo não consegue resistir ao impulso de furtar objetos desnecessários para uso pessoal ou de baixo valor monetário. E que fique bem claro que roubo de dinheiro não é sintoma de cleptomania, assim como objetos de valor cujo roubo tenha uma intensão financeira, tema esse tão comum na mídia, no nosso cotidiano recente.
Semelhante ao nosso astro gatuno Denis, os objetos tendem a ser guardados, jogados fora ou dados para alguém. Entretanto, algumas pessoas podem desejar os itens furtados, passando a utilizá-los ou mesmo colecioná-los e, ainda, às vezes, podem tentar devolvê-los de maneira discreta. Apesar de possuírem o temor de serem presos, não planejam o ato e não consideram as chances de prisão.
Os objetos mais furtados são: roupas, alimentos, cosméticos, dinheiro e utensílios de uso pessoal. Os locais mais comuns de manifestação desses atos são lojas, supermercados, farmácias, na casa de familiares ou mesmo de amigos.
Embora as estatísticas sejam elásticas, acredita-se que os indivíduos com cleptomania que furtam em lojas representam de 4 a 24%, embora sua prevalência estimada gire entorno de 0,8%. Dados publicados no Journal of Socio-Economics de 2009 calculou que os prejuízos do comércio varejista nos EUA causados por ladrões de loja (que englobam os furtos comuns e os cleptomaníacos) chegam a mais de U$10 bilhões por ano. Até o momento não temos dados brasileiros.
Outro dado relevante é o de que dois terços das mulheres que furtam são encaminhadas ao médico e os homens à prisão. Em um estudo com 101 cleptomaníacos, 63,3% foram presos pelo menos uma vez devido aos furtos, sendo que desses 46,8% foram condenados, resultando na prisão de 65%. Acho que cabe aqui um esclarecimento de que o furto comum é deliberado, planejado e é motivado pela utilidade do objeto ou por seu valor monetário e quase sempre o ato visa o lucro, não tendo nada a ver com cleptomania.
Mas para o nosso alívio, segundo a psicóloga Aparecida Rangon Christianini, Coordenadora do Atendimento a Pacientes com Cleptomania do Programa Ambulatorial Integrado dos Transtornos do Impulso do IPQ/HC/FMUSP (proamiti.secretaria@gmail.com), a cleptomania tem tratamento, desde que os portadores desse transtorno rompam as barreiras do medo, vergonha e culpa e motivem-se a procurar tratamento, já que aceitar ajuda é o primeiro passo em direção ao tratamento.
Os profissionais que poderão auxiliar no tratamento são psiquiatras e psicólogos.Cabe ao médico psiquiatra avaliar se existem outros sintomas além da cleptomania e se é necessário ou não o uso de medicação devido principalmente ao fato do cleptomaníaco não conseguir controlar seu comportamento e os mecanismos que envolvem o ato de furtar (antes, durante e depois) gerarem sentimentos de ansiedade ou deixarem a pessoa deprimida. Já o psicólogo fará a psicoterapia com o objetivo de que o paciente possa aprender a identificar as causas que o levam a furtar e aprender a controlar seus impulsos. Atualmente, a abordagem que tem obtido melhores resultados é a terapia cognitivo-comportamental.
Para finalizar, vão dois recados para à família do cleptomaníaco: não o flagre, já que ao ser pego no ato do furto ele irá reagir de forma defensiva (o ideal e oferecer ajuda) e a outra é que a família não deve acobertar a pessoa, *deve-se pagar pelo furto, do contrário, o paciente não se sentirá motivado a procurar ajuda.
* No caso o familiar paga, mas com a participação do cleptomaníaco, o ato tem que ser educacinal e não punitivo e nem é para constranger