por Lilian Graziano
Em se tratando de felicidade, os extremos são perigosos! Não faço essa afirmação para evitar que você, leitor, morra de alegria, ou de qualquer tipo de “moléstia” ou acidente que possa ocorrer, caso suas emoções positivas sejam elevadas à enésima potência, por meios lícitos e saudáveis. É que, em se tratando deste assunto, existe um dualismo conceitual que leva a uma noção completamente equivocada de felicidade que, a saber, é muito mais do que a intensificação de emoções positivas em nossa vida.
Embora as emoções positivas contribuam enormemente para uma vida mais feliz, as emoções ditas “negativas” não podem ser simplesmente eliminadas e também contribuem para um score consistente de bem-estar. E para a Psicologia Positiva, felicidade não diz respeito somente a emoções – é preciso uma orientação para algo maior que nós mesmos, um propósito, como preconizava Aristóteles em sua perspectiva *eudaimônica de vida, acreditando residir aí a chave para uma existência plena e que valesse a pena ser vivida.
O que ocorre é que, de um lado, indivíduos acabam se baseando em uma perspectiva estritamente hedonista de vida, pautada na busca pelo prazer, na dependência de fatores externos a si e materiais para aumentar o seu bem-estar.
De outro, há quem adote uma postura radicalmente introspectiva e aristotélica de vida, resignada aos seus propósitos, perdendo de vista aquilo de que também precisamos: a flexibilidade e a perspectiva para mudar o curso de nossa jornada, enxergando as oportunidades que o destino nos coloca à frente, além do savoring (o saborear da vida em toda a sua experiência). Os riscos possíveis, respectivamente às condutas apresentadas, são o de uma vida de insatisfação, buscando cada vez mais prazer a cada nova experiência, ou uma vida em que se instalam as frustrações por esta não ter sido “experimentada” ou “saboreada” em sua plenitude.
A perspectiva hedonista de vida é, muitas vezes, demonizada pela sociedade, ao passo que, na verdade, um equilíbrio entre esta e a perspectiva eudaimônica ao longo da vida aparece como proposta consistente de felicidade. Não é necessário cortar prazeres mundanos, portanto (ao menos aqueles que não constituem vícios, compensações emocionais ou danos a terceiros e ao meio ambiente). O que se recomenda, no entanto, é evitar o que Martin Seligman, pai da Psicologia Positiva, cunhou como “esteira hedonista”, referindo-se à busca mecânica por prazer e bens materiais. Precisamos de experiências prazerosas em nosso cotidiano, porém, ao nos levantarmos pela manhã, devemos estar certos de que buscamos algo maior e prioritário, que, por sua vez, demanda muito autoconhecimento para encontrar.
Caso acredite, leitor, lendo este artigo, que suas escolhas tenham sido equivocadas até aqui, não se acanhe. No curso de nossa felicidade, sempre é tempo para descobertas, adaptações e aprendizados. Aliás, permitir-se descobrir, adaptar, aprender é outro comportamento altamente recomendado na busca por uma vida mais feliz.
*O eudaimonismo aristotélico distingue-se do hedonismo, segundo o qual o fim da ação humana é a obtenção do prazer ou a ausência de dor. Aristóteles associa felicidade à virtude ética do indivíduo, portanto valoriza suas ações sob um propósito maior do que sua própria existência ou prazer.