Pesquisa indica que se preparar para a morte é viver uma vida mais digna.
O estudo foi feito por Gabriela Machado Gilberti, do Instituto de Psicologia (IP) da USP, com idosos com mais de 80 anos e mostrou que ignorar a morte ou tratá-la como tabu traz sofrimento durante o processo de envelhecimento.
Gabriela abordou questões intrínsecas à morte e ao envelhecimento de idosos que se consideravam preparados para a morte. A intenção era ampliar a visão dominante sobre o assunto e compreender de fato o que seria esta preparação.
Segundo a pesquisadora, os entrevistados discorreram sobre a morte com naturalidade, e entre as questões levantadas, duas se destacaram, que foi a noção de corporeidade e de temporalidade. Ou seja, “a relação que o idoso mantinha com seu corpo devido às perdas ocasionadas pelas condições de saúde (corporeidade) e reflexões acerca do passado, do presente e do possível futuro encurtado (temporalidade). Tais pensamentos faziam parte do entendimento sobre a velhice, o significado da morte e o sentido da vida”, afirma.
Nos diálogos também se fez presente a dificuldade que os idosos possuíam de encontrar pessoas (familiares e profissionais da saúde) com quem pudessem discorrer sobre a questão da finitude da vida. Gabriela observou que “tal afastamento ocorre devido à cultura contemporânea que faz com que falar sobre a morte faz com que o interlocutor também reflita sobre a sua própria existência, que é finita, o que causa medo e desconforto”, explica.
Nas entrevistas, foi possível identificar muitas possibilidades do que significa a preparação para a morte: reserva de dinheiro para pagamento de rituais fúnebres; a compra do próprio túmulo; divulgação do desejo de encaminhamento do corpo; testamentos; doações; despedidas; destinação de enxovais para um ente querido (bisnetos, por exemplo); quitação de dívidas; o cuidado de deixar exames e documentos em lugares de fácil acesso; dentre outros. Segundo Gabriela, “essas preparações foram feitas pelos idosos no sentido de cuidar da vida – tanto da própria quanto de familiares e amigos que permanecerão vivos após a morte do idoso”, afirma.
Baseando-se no entendimento de que a sociedade moderna evita a reflexão sobre a morte e o envelhecimento, a pesquisadora explica que a medicina surge como tentativa de controlar e dominar o fim da vida. “De fato, os avanços tecnológicos melhoram o bem-estar, porém, o problema surge quando tais instrumentos são utilizados para prolongar a vida sem refletir sobre a qualidade da existência de quem mantém a vida ou o sentido desse prolongamento”, explica Gabriela. Dessa forma, a pesquisadora propõe aumento dos debates de como propiciar aos pacientes uma “morte digna” de forma a assegurar-lhes também uma existência honrada.
Gabriela acrescenta que o diálogo é necessário para que se possa respeitar a singularidade de cada indivíduo, porque a visão de “dignidade sobre a morte e a vida é completamente individual”. Em sua opinião, é importante que se naturalize a ideia do preparo para a morte, o que faz com que as pessoas vivam sua existência da melhor forma possível. “A morte convoca para o tempo do viver”, conclui.
A pesquisa
A única certeza da morte é a vida: investigação fenomenológica sobre idosos que se preparam para a morte foi o resultado de mestrado de Gabriela Machado Gilberti, com orientação da professora Helena Rinaldi Rosa, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano do IP.
Fonte: Mariana Navarro/Comunicação do Instituto de Psicologia
Mais informações: gabrielagilberti@gmail.com, com Gabriela Gilberti ou ipcomunica@usp.br, com Islaine Maciel