por Ana Luiza Moreira Mano – psicóloga componente do NPPI
Os nascidos na década de 90 vivenciaram uma revolução: nossa inserção da Internet – antes restrita a universidades e governos – na vida da população comum. Aos poucos, o uso da rede foi evoluindo; no começo, limitado a conteúdos científicos, até se tornar o que vemos hoje: um grande hub de socialização, comércio, entretenimento e pesquisa.
Em meados dos anos 2000, a socialização na "grande rede" foi novamente, revolucionada pelo surgimento das redes sociais.
Em um curtíssimo espaço de tempo (de 2003 a 2006) surgiram redes como Orkut, Twitter, Facebook e MySpace. Cada uma focada em algum nicho social ou regional, impactaram principalmente os millenials, nome dado aos nascidos a partir de 1990, citados acima.
O fato de terem crescido em meio à evolução da Internet em muitos fez com que esses jovens se tornassem usuários mais intuitivos da mesma. Por outro lado, percebe-se que pela grande familiaridade com essa ferramenta, muitas pessoas começaram a se expor das mais diversas formas, sem nenhuma intimidação ou preocupação com o que poderia lhes acontecer como consequência da maneira como interagem com as novas tecnologias.
Celulares com câmeras viraram uma porta aberta para ilustrações (muitas vezes em tempo real) do cotidiano desses internautas. Postagens isentas de reflexão passaram a acontecer o tempo todo. Compartilhar tudo que acontece muitas vezes prevalece e supera a qualidade e o sentido da comunicação e partilha da experiência vivida.
Recorrentemente observamos a divulgação de imagens ou vídeos onde aparecem uma ou mais pessoas comuns, não famosas, em situação de nudez ou similar. Isso tem causado enorme repercussão na mídia, o que, por sua vez, traz consequências à vida particular desses indivíduos e afeta inclusive seus amigos, familiares ou as pessoas com quem convivem, de forma geral. Antigamente espalhavam-se fofocas pelo bairro, face a face; hoje, espalham-se boatos pelo mundo, anonimamente. Pela rápida difusão de informações que a internet propicia, uma pessoa "anônima" pode publicar um texto, uma foto, um vídeo, com apenas um clique – e pode comprometer toda a imagem pública de alguém construída durante anos.
Devido à ingenuidade e confiança, típicas – mas não exclusivas – da adolescência, muitas pessoas acreditam que aquele momento que estão vivendo é único, especial e que o outro não irá aprontar algo desagradável com elas. É como o uso do preservativo, onde sabe-se que previne doenças e gravidez, mas mesmo assim nem sempre se usa, quando acredita-se que o outro é confiável. Sem refletir quais serão as consequências do que está entregando ao mundo, uma pessoa pode correr alguns riscos de deparar-se com o resultado assustador de suas ações.
Ridicularizar o outro para sentir-se superior
Quem tira fotos ou faz vídeos em situação de intimidade, provavelmente não imagina que esses arquivos podem ir a público. A vingança, que geralmente motiva a divulgação online de imagens/gravações, vem da vontade de "ver o outro sofrer como eu sofri", ou ainda de ridicularizar o outro para sentir-se superior.
Há casos onde foi necessário uma mudança de cidade com a família para poder superar o ocorrido e continuar a vida. Não seria justo culpabilizar uma pessoa simplesmente por realizar uma gravação/fotografia privada, mas também é preciso levar em conta a responsabilidade implícita que se carrega ao permitir ou decidir criar esse material.
Afinal, ao se fazer algo assim, seja sozinho ou acompanhado de outras pessoas, está em jogo um acordo, uma conivência mútua. Então, por mais que uma pessoa seja prejudicada pela publicação de um vídeo ou foto, ainda assim ela mesma "fez" aquilo, ao deixar-se filmar/fotografar, sendo, portanto, em parte conivente – ainda que não tenha responsabilidade sobre a sua divulgação – e deverá assumir sua parcela de responsabilidade, tomando mais cuidado no futuro com o que permite ser gravado a seu respeito.