por Danilo Baltieri
"Meu filho está internado numa fazenda que não tem médicos e nem psicólogos. Lá ficam só os internos um cuidando do outro; não tem disciplina ou alguém com autoridade e preparo para orientá-los. Alguns internos têm conhecimento sobre o crime ou são fugitivos da policia. Fiquei com medo do que vi na visita. Mas esse foi o único lugar que meu filho aceitou ficar. Não entendo os motivos que o levaram a isso, pois já o internei em clinica que mais parecia um hotel e ele não ficou."
Resposta: A internação em comunidades terapêuticas (fazendas terapêuticas, chácaras terapêuticas, etc) é uma das formas preconizadas para o tratamento de dependentes químicos.
No entanto, como para qualquer outra recomendação para tratamento de uma doença, devem existir critérios bem definidos para a sua indicação, sempre baseados em evidência científica de efetividade.
A internação nas chamadas comunidades terapêuticas é comumente recomendada para aqueles indivíduos que demonstram:
a) história de múltiplas falhas no tratamento ambulatorial ou internações curtas;
b) grande prejuízo na capacidade de ressocialização e na habilidade para obter e manter atividade laboral;
c) necessidade de ambiente altamente estruturado para a modificação do estilo de vida.
As comunidades terapêuticas devem propor a reabilitação individual, social e vocacional através de programas altamente estruturados, contando com profissionais capacitados e treinados em intervenções comportamentais relacionadas às dependências químicas.
Alguns dos elementos teóricos centrais das comunidades terapêuticas são:
a) Revelar métodos adequados para proporcionar a modificação comportamental;
b) Desenvolver atividades que favoreçam o desenvolvimento da autoestima e confiança dos seus membros;
c) Proporcionar uma estrutura com membros com papéis adequadamente definidos;
d) Apresentar um sistema que proporcione limites e recompensas, sempre adequadas;
e) Utilizar a comunidade como um meio de aprendizagem social;
f) As comunidades devem ter regras, normas e um sistema de valores adequados para a modificação do estilo de vida;
g) Ter um processo de tratamento voltado para a reinserção social;
h) Apresentar um “curriculum” que ensine os membros da comunidade os elementos, processos e métodos para a manutenção da sobriedade, saúde e estilo de vida seguro.
O que são comunidades terapêuticas?
As comunidades terapêuticas são definidas como “Serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso ou abuso de substâncias psicoativas, em regime de residência ou outros vínculos de um ou dois turnos, segundo modelo psicossocial. São unidades que têm por função a oferta de um ambiente protegido, técnica e eticamente orientados, que forneça suporte e tratamento aos usuários abusivos e/ou dependentes de substâncias psicoativas, durante período estabelecido de acordo com programa terapêutico adaptado às necessidades de cada caso. É um lugar cujo principal instrumento terapêutico é a convivência entre os pares. Oferece uma rede de ajuda no processo de recuperação das pessoas, resgatando a cidadania, buscando novas possibilidades de reabilitação física e psicológica, e de reinserção social”.
É importante também verificar se a comunidade terapêutica (fazenda terapêutica, chácara terapêutica, etc) está adequadamente regulamentada pela ANVISA (Resolução – RDC nº 101 de 30/05/2001). Como qualquer estabelecimento de saúde, deve estar devidamente licenciado pela autoridade sanitária competente do Estado ou Município em que está instalado. Também, como estabelecimento de saúde, deveria ser registrado no Conselho Regional de Medicina do Estado.
Apesar disso, revendo a regulamentação da ANVISA acerca das comunidades terapêuticas, não há qualquer determinação de cadastro ou registro em Conselhos de Medicina para funcionar como estabelecimento de saúde. Existe a conceituação 2.2 que determina que a “responsabilidade técnica pelo serviço junto ao órgão da Vigilância Sanitária dos Estados, Municípios e do Distrito Federal deve ser de técnico com formação superior na área de saúde e serviço social”.
Como tenho repetidamente escrito aqui no Vya Estelar, o tratamento deve ser uma via de mão dupla. Isso significa que o portador da Síndrome de Dependência de Substâncias deve participar ativamente do seu tratamento. Logo, quanto mais o portador sentir a necessidade de cessar o consumo das substâncias e mais empenhado estiver na modificação do seu estilo de vida, melhores poderão ser os resultados terapêuticos. Desta forma, devemos somar o modelo terapêutico utilizado com a motivação e empenho do usuário e familiares.
Converse com o técnico responsável pela comunidade terapêutica onde seu filho se encontra. Procure conhecer o “curriculum” da mesma, o modelo de abordagem e as concepções teóricas que a norteiam. Seguramente, a sua conduta pró-ativa será bem recebida por uma instituição séria, adequadamente regulamentada pela ANVISA e contando com profissionais técnicos altamente engajados em promover a recuperação do seu filho e dos demais pacientes.