por Guilherme Teixeira Ohl de Souza – psicólogo componente do NPPI
Em que passo está a psicologia brasileira em relação à sua inclusão na internet?
Vamos começar nossa reflexão expondo um rápido panorama da evolução desse processo. A internet comercial chegou ao Brasil em 1995 em escala inicial muito restrita. Além da maior parte das pessoas não ter acesso (por não possuír o equipamento necessário ou em razão do alto custo da assinatura na época), a velocidade de conexão (discada) era muito baixa, o que desestimulava mesmo quem conseguia ter acesso. Além disso, o próprio uso da WEB e seus potenciais eram desconhecidos para a quase totalidade dos brasileiros. Mas, aos poucos, as pessoas começaram a se apropriar da internet e suas possíveis aplicações, na medida em que novas vias de acesso foram surgindo.
Com essa popularização, a internet passou a fazer parte do cotidiano de grande parte da população e, consequentemente, passou a integrar o imaginário das pessoas. Assim, ideias, fantasias e desejos foram criados sobre a sua utilização, tanto em formas mais realista, quanto em formas de uso fantasiosas.
A interação humana na internet tem sido muitas vezes vista como acontecendo em um plano paralelo à vida real, como se a vida virtual fosse “falsa” ou contraditória à vida real. A vida virtual é um complemento à “vida real”, e não um mundo em contradição àquele. Muito dessa visão vem da crença de que as pessoas mentem nesse universo, de que relações virtuais ali estabelecidas são dissimuladas e inevitavelmente superficiais e “descartáveis”. Claro que isso ocorre frequentemente, mas também existe na WEB muito trabalho sério e criativo.
Aparentemente, a questão principal envolvida nesse “pré-conceito” é a falta de vivência efetiva sobre o que é a internet e sobre as inúmeras possibilidades que ela pode oferecer à criatividade humana. Muitos psicólogos e estudantes de psicologia, inseridos nessa mesma sociedade, também partilham dessa imagem social negativa a respeito da internet. Assim, se o atendimento psicológico tem como propósito a busca pela verdade da pessoa, como seria possível acontecer esse atendimento em um meio “falso”?
Em primeiro lugar, é necessário saber que se pode ser sério e verdadeiro online, tanto por parte de quem pede atendimento como por quem atende. No NPPI, oferecemos orientação psicológica via e-mail há cerca de treze anos e nesse serviço temos acolhido pessoas com questões sérias, às quais respondemos com a mesma seriedade. Constatamos também o compromisso e o alto grau de investimento emocional realizado por quem nos escreve. Não descartamos a possibilidade de alguém ter “testado” nosso serviço, inventando alguma história apenas para verificar que resposta receberia em retorno. Mas, se esse tipo de atitude eventualmente ocorreu, por parte de algum internauta, foi certamente um fato irrelevante em meio ao significativo número de pessoas que, por exemplo, muitas vezes nos retorna com uma mensagem de agradecimento pela ajuda prestada, o que nos demonstra a pertinência e efetividade do atendimento realizado.
Em segundo lugar, é preciso diferenciar “psicoterapia via WEB” de outras formas de atendimento psicológico medidos por computadores. A simples transposição das formas já reconhecidas de psicoterapia para o meio virtual é uma possibilidade geralmente temida pelos psicólogos, com certa razão. Tal transposição seria, na nossa visão, uma aplicação simplista e temerária do conhecimento psicológico já desenvolvido e validado para o meio “presencial”; uma vez que o universo virtual tem suas próprias regras de contato e formas de interação.
No entanto, no momento seria precoce afirmar que é impossível a realização de psicoterapia via WEB, pois são necessárias mais pesquisas para se conhecer melhor a dinâmica que ocorre entre terapeuta e cliente nesse meio, bem como suas implicações. Mas, hoje já visualizamos (e experimentamos) outros tipos de intervenções psicológicas viáveis e efetivas como, por exemplo, orientações focadas (na área clínica), as assessorias (na área organizacional), além daquelas pertinentes à educação à distância.
Há ainda o problema da falta até do conhecimento sobre os serviços psicológicos hoje já existentes. Percebemos a surpresa dos nossos alunos quando tomam conhecimento dessas modalidades. Esse desconhecimento indica que os cursos de graduação em Psicologia de modo geral ainda desconhecem essas possibilidades.
Os atendimentos realizados nos moldes clássicos têm seus próprios limites, limites esses que restringem o acesso da população ao atendimento psicológico de modo geral: seja por razões financeiras (tratamento custoso) ou geográficas (existem muitas cidades sem profissionais de psicologia). A internet pode ser aproveitada para a criação de novos métodos de atendimento que acolham essas demandas até aqui não atendidas, além de permitir a criação de novos recursos não disponíveis nos atendimentos presenciais. Há ainda por fim a possibilidade de se integrar a tecnologia para atendimentos presenciais, como o uso de softwares com fins terapêuticos, testes informatizados, além da criação de formulários eletrônicos que facilitem a organização de dados e a pesquisa epidemiológica.
Em suma, todo um novo campo se abre para a Psicologia na WEB, campo esse que pode e deve ser ocupado pelas novas gerações de psicólogos em beneficio da população atendida.