por Jocelem Salgado
Há uma estreita relação entre o alimento que nós comemos e a nossa saúde. Além de fornecer uma fonte de calorias e nutrientes para prevenir doenças nutricionais, tais como a desnutrição, escorbuto (deficiência de vitamina C), anemia (deficiência de ferro) e raquitismo (deficiência de vitamina D), os alimentos contribuem para a manutenção da saúde e prevenção de diversas doenças. Estes efeitos, exibidos por alimentos funcionais, que contém componentes ativos, ocorrem através da regulação de nossa fisiologia básica, incluindo sistemas imunológico, endócrino, nervoso, circulatório e digestivo.
Tem sido estimado que um terço dos casos de câncer são relacionados à dieta, e há uma forte evidência para o papel da dieta no risco de doenças cardiovasculares, hipertensão e obesidade. Em adição à prevenção de doenças, o papel dos alimentos em melhorar a performance (exatidão mental, vigor físico), retardar o processo de envelhecimento, perda de peso e recuperação de doenças tem sido também proposto.
O nosso artigo de hoje, irá explorar em especial um ingrediente funcional, as bactérias probióticas, que são utilizadas em alguns alimentos muito conhecidos de todos nós. Essas bactérias tem sido intensamente estudadas atualmente e várias propriedades e efeitos clínicos delas têm sido implicadas na saúde do homem.
Os micro-organismos do nosso intestino
O trato gastrointestinal humano e a microflora intestinal estão envolvidos em uma série de doenças. Especialmente o intestino grosso, é o principal local de multiplicação de bactérias, vírus e parasitas nocivos, os quais podem trazer doenças para o nosso organismo. Os principais microorganismos nocivos do alimento incluem campylobacters, salmonellae, listeriae e certas linhagens de Escherichia coli.
O resultado de um super crescimento destas bactérias pode ser uma diarréia aguda. Há, contudo, outras formas mais crônicas de doenças intestinais e muito mais graves, tais como a doença inflamatória do intestino (exemplo, colite ulcerativa e doença de Crohn), câncer de cólon e colite pseudomembranosa. Cada uma destas desordens pode ter origem num determinado tipo de bactéria.
Estima-se que cerca de 400 espécies de bactérias, separadas em duas categorias, habitem o trato gastrointestinal humano. As categorias são:
a) Aquelas consideradas benéficas, probióticas portanto, como por exemplo as Bifidobactérias e Lactobacillus
b) Aquelas consideradas prejudiciais, nocivas, como por exemplo as Enterobacteriaceae e Clostridium spp
O epitélio intestinal intacto com sua microflora intestinal normal funciona como uma barreira ao movimento de bactérias patogênicas, antígenos e outras substâncias nocivas ao intestino. Em pessoas saudáveis esta barreira é estável, protegendo e facilitando as funções intestinais normais. Entretanto, quando a microflora normal ou as células epiteliais são perturbadas por antígenos alimentares, patógenos, substâncias químicas ou radiação, defeitos nos mecanismos de proteção da barreira podem ocorrer. A microflora intestinal alterada pode levar a diarréia, inflamação da mucosa, uma desordem de permeabilidade ou ativação de carcinógenos (substâncias que provocam o câncer) no conteúdo intestinal. É aí que entram os alimentos probióticos, com a função de equilibrar a flora bacteriana do intestino, promovendo saúde para as pessoas ao diminuir os riscos de doenças intestinais.
O que são os probióticos?
A definição clássica, empregada até hoje, é de que os probióticos são alimentos contendo microorganismos vivos que beneficiam o organismo, melhorando seu balanço microbiano intestinal. Os probióticos têm sido usados por algum tempo e estão disponíveis em alguns produtos alimentares, como leites fermentados e alguns tipos de iogurtes.
Os cientistas têm investigado os efeitos de probióticos desde a virada do século, antes ainda do termo probiótico ter sido empregado. Metchnikoff foi um dos primeiros a defender que leite coalhado contendo bactérias poderia ter efeitos positivos sobre a saúde intestinal das pessoas. A maioria das pesquisas iniciais foi em organismos que eram usados para produzir produtos de leite fermentados, tal como o iogurte, mas nada até então tinha sido comprovado pela ciência.
Somente agora, é que estudos científicos sérios estão mostrando que os probióticos podem melhorar a saúde e prevenir distúrbios intestinais no homem.
Dentre os microorganismos benéficos tradicionalmente usados na fermentação de alimentos, as bactérias produtoras de ácido láctico são as que tem atraído maior atenção (lactobacilos e bifidobactérias). Os mecanismos pelos quais essas bactérias probióticas agem, incluem alteração das populações ou atividade da microflora contaminante; liberação de enzimas (ex: lactase); interferência com patógenos ou patógenos oportunistas; influência sobre diferentes componentes do sistema imune.
Benefícios
As bactérias probióticas empregadas hoje, principalmente em leites fermentados e em alguns iogurtes, atuam no balanço da microflora intestinal perturbada e nas disfunções do trato intestinal. Inúmeros benefícios têm sido relatados e incluem:
– Prevenção e melhora de diarréia
– Restabelecimento da integridade da mucosa intestinal
– Prevenção e controle de câncer de cólon (intestino grosso)
– Melhora no sistema imunológico (maior resistência às infecções)
– Controle da hipertensão (pressão alta)
– Melhora de constipação (intestino preso)
– Melhora da alergia a certos alimentos, incluindo intolerância à lactose do leite (alergia ao leite de vaca)
– Redução do colesterol
– Melhor absorção de cálcio
– Auxílio contra infecções no trato urinário em mulheres
– Reparo do DNA em pele danificada por raios ultra violeta
Gostaria de fazer uma última observação de forma a alertar as pessoas para um problema que pode ocorrer após certa idade. Estudos mostram que acima dos 55 anos de idade, a contagem de bifidobactérias fecais (microorganismos benéficos para nosso intestino) diminui de forma marcante em comparação aos níveis em pessoas mais jovens.
Na Inglaterra já houve uma “explosão” de Escherichia coli, uma bactéria maléfica para nosso organismo. As pessoas mais velhas foram envolvidas primeiramente que os mais novos. Potencialmente, os números menores de bifidobactérias nos idosos podem ter contribuído para aumentar a suscetibilidade aos efeitos da infecção. Pesquisas mostram que o uso de probióticos é uma possibilidade de se reverter o número de bifidobactérias muitas vezes reduzido em populações envelhecidas.
Nós temos que aprender a reconhecer a importância da alimentação na nossa vida e saúde e exigirmos estudos científicos cuidadosos e exames minuciosos de todos os alimentos que se dizem funcionais. Para mim, em nutrição e medicina, a informação tem que estar ligada à ciência. E é por isso que acredito que a indústria de alimentos bem como todos os profissionais envolvidos nessa área devam ter a responsabilidade de desenvolver e promover produtos com base em ciência e não na fé. Acredito ainda, que a missão de cada um de nós, profissionais da saúde, é divulgar esses conhecimentos científicos, para que os consumidores possam transformá-los em benefícios para si próprios.
Mais informações: www.jocelemsalgado.com.br