por Jocelem Salgado
É comum os moradores da zona rural ou as pessoas que curtem um fim de semana em hotéis-fazenda consumirem leite cru, aquele extraído das vacas e que não passa por processo industrial. Muitos acreditam que, além do sabor diferenciado, o leite cru ainda possui uma série de benefícios à saúde. O que será que a ciência diz sobre isso?
O leite, definido como o líquido expelido pelo úbere da vaca, possui todos os nutrientes necessários, além de vitaminas e pH próximo do neutro, o que favorece o desenvolvimento de uma série de bactérias nocivas à saúde humana que são comumente associadas ao leite cru, como Listeria monocytogenes, Salmonella, Escherichia coli e Campylobacter.
De acordo com a Instrução Normativa Nº 51, de 18 de setembro de 2002, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), ele pode ser dividido em três tipos, os quais classificam os produtores de leite, considerando as instalações e higiene da ordenha, e armazenamento do leite cru, visando à qualidade do mesmo.
São eles:
– Tipo A: possuem sala de ordenha própria, de alvenaria e revestida com azulejos. A ordenha é mecânica e o leite é resfriado imediatamente após a sua obtenção. O produtor pasteuriza e envasa o leite na própria granja, e o leite tem que estar no comércio 12 horas após a ordenha. Cada marca de leite é de uma única granja.
– Tipo B: possuem sala de ordenha própria e revestida com azulejos. A ordenha é mecânica e o leite é resfriado imediatamente após a sua obtenção. O leite é recolhido por caminhão-tanque refrigerado e é levado até uma usina, onde é reunido com leites (B, também) de outros produtores, pasteurizado e envasado. O leite tem que estar no comércio 24 horas após a ordenha.
– Tipo C: não há necessidade de instalações especiais para a ordenha, que pode ser manual. A refrigeração imediatamente após a ordenha não é obrigatória. O leite pode ser armazenado em latões e é levado à usina e pasteurizado.
Mas, afinal, qual a diferença entre eles?
A diferença está na qualidade microbiológica, ou seja, na higiene do leite. Além disso, a legislação, atualmente, permite que todos os leites sejam comercializados nas versões: integral (gordura animal), padronizado (3% de gordura), semidesnatado (1,5% de gordura) e desnatado (no máximo, 0,5% de gordura).
Vale ressaltar que os tipos A e B são pasteurizados e comercializados, enquanto que o tipo C é industrializado, ou seja, todos os derivados do leite são obtidos a partir dele. No entanto, isto não significa que esse leite é ruim, pois da mesma forma que há produtores que usam ordenham manual e não refrigeram o leite, há produtores que usam ordenha mecânica, refrigeram o leite e produzem um produto de qualidade. O problema é que os consumidores não conseguem diferenciar isso visualmente, visto que, diferentemente dos tipos A e B, não há padronização da qualidade.
Diante do exposto, vamos entender o que é a técnica de pasteurização e qual a sua importância, visto que a legislação brasileira não permite o consumo de leite cru. A técnica de pasteurização recebeu esse nome em homenagem a Louis Pasteur que, em 1863, descobriu que o aquecimento de certos alimentos e bebidas acima de 60º evitava a sua deterioração, reduzindo o número de micro-organismos presentes. Ela pode ser realizada de forma lenta e então recebe o nome Low Temperature Longe Time (LTLT) ou de maneira rápida, High Temperature Short Time (HTST).
A técnica de pasteurização LTLT consiste em aquecer o leite a 62 a 63°C e mantê-lo nesta temperatura por 30 a 35 min, seguido por resfriamento brusco a 5°C ou menos. Como a lentidão nessa fase pode favorecer um aumento considerável de bactérias, é importante a rapidez no resfriamento. Essa técnica é utilizada por indústrias de pequeno porte e apresenta a desvantagem de ser um processo demorado, descontínuo e com operação manual.
Já a pasteurização do tipo HTST consiste em aquecer o leite a 72°C e mantê-lo por 15 segundos, seguido de choque térmico semelhante ao usado na pasteurização lenta. A pasteurização HTST é o processo mais usado em indústrias de médio e grande porte. Apresenta como desvantagens o alto custo de aquisição e manutenção do equipamento, mas tem as vantagens de ser um processo contínuo, de controle mais eficaz, de maior rapidez, menor área para instalação, menos perdas por evaporação e economia de mão-de-obra.
Algumas pessoas afirmam que o leite não pasteurizado melhora a digestão e não causa intolerância à lactose, no entanto, o leite não possui quantidades de probióticos suficientes para melhorar o funcionamento do estômago e do intestino; e tanto o leite cru quanto o pasteurizado não possuem lactase, a enzima necessária para digerir a lactose, que é ausente em pessoas que possuem intolerância à lactose.
Estudos mostram ainda que a pasteurização pouco influencia na estrutura das proteínas presentes no leite, ou seja, as pessoas alérgicas ao leite, infelizmente, vão sofrer consumindo o leite cru ou o industrializado. Da mesma forma, a pasteurização pouco afeta a quantidade de vitaminas no leite. Sabe-se que ela diminui a quantidade de vitaminas B12 e C, porém, vale ressaltar que, um copo de leite cheio, pasteurizado ou não, contempla mais da metade da recomendação diária de vitamina B12, e o leite não costuma ser nossa fonte primária de vitamina C.
Apesar dos benefícios à saúde parecerem tentadores, há poucas evidências científicas que suportam tais teorias. Em contrapartida, já se sabe que a pasteurização tem por objetivo apenas evitar potenciais micro-organismos que são prejudiciais à nossa saúde.
Atenção!
Este texto e esta coluna não substituem uma consulta ou acompanhamento de um médico e não se caracterizam como sendo um atendimento.