por Roberto Goldkorn
Muito antes da humanidade ter uma linguagem oral e escrita, já havia o desenho. As inscrições rupestres em cavernas ou rochas expostas mostram a antiguidade dessas manifestações precoces do espírito humano.
Os desenhos pré-históricos ainda geram divergências entre os estudiosos quanto à sua motivação e função, mas ninguém duvida que entre essas motivações e funções estava a de reproduzir e sacralizar algum aspecto da realidade observável. Portanto um objetivo mágico.
Aos poucos, os desenhos rupestres ganhavam traços distintos, denotando um estilo, e passaram a ser representantes daquela família ou tribo, sinalizando aquele território, aquela caverna como sendo o seu espaço, um aviso do tipo "isso aqui tem dono".
Os totens, as marcações de território com caveiras espetadas em postes, sinais em árvores, marcos de pedra com inscrições, todos passaram a ser uma linguagem pré-verbal de sinalização, de identificação de espaços, fossem eles sagrados ou territórios pertencentes a esse ou aquele povo.
Os primeiros modelos para os nossos ancestrais, foram naturalmente aqueles encontrados à sua volta na natureza: animais, árvores, montanhas, sol, lua e partes do corpo humano: oolho, a mão, o pé etc.
Mais tarde, os brasões das famílias e clãs, passaram a desempenhar esse papel de identificar territórios, delimitar fronteiras. Nada era escrito, apenas um desenho, símbolo e sinal de seus donos tinha de carregar todas as mensagens necessárias para explicar quem eram aqueles donos, o que faziam, de quem descendiam, se eram amistosos aos estrangeiros ou não, sua origem etc.
Esse foi o longo processo, através do qual o desenho, anterior à linguagem, se tornou o poderoso mensageiro daqueles que precisavam dizer sem palavras, o máximo possível num mínimo de traços e espaço.
Esse processo criou o que na linguagem Junguiana chamou-se de arquétipos. Os arquétipos são modelos ou moldes psíquicos, que representam comportamentos ou ideias mais ou menos universais, em geral compartilhados por grandes grupos sociais culturais.
Assim, por exemplo, o Sol, acaba sendo um arquétipo complexo que denota entre outras coisas: Luz, dia (em contraste com a lua da noite), clareza, lucidez, verdade, Vida, e por "contaminação" vem, alegria, crescimento, inocência, atividade, riqueza (lembra o amarelo do ouro), incorruptibilidade etc.
Dessa mesma forma, por proximidade e analogia, o Galo, simbolizada o sol, a Luz, portanto era um arauto bem-aventurado, que dizia com seu canto: "Que as trevas sejam banidas e que a Luz se faça!" Por isso, durante a alta Idade Média, Jesus Cristo foi associado ao Galo, pois era aquele que trazia a Luz.
Os modernos logotipos (e a ideia de usá-los como símbolos da empresa) comerciais, portanto, são muito mais antigos que seu uso atual. Eles estiveram ao longo da história reforçando posicionamentos de marcas e instituições que mudaram a vida da humanidade, para o bem e para o mal.
Como esquecer a suástica nazista? E o "logo" do comunismo soviético, que opunha a foice dos camponeses ao martelo dos operários, que embora pertencente a uma experiência desastrada, permanece até hoje inspirando os nostálgicos da utopia comunista.
O "logo" do taoísmo, de tão perfeito, tão poderosamente significativo, extrapolou a obscura religião chinesa, para estar em todos os cantos da sociedade moderna ocidental.
Cruz: logo poderoso
Mas de todos esses logos involuntários, o mais poderoso, mais "moderno" em termos conceituais, o que foi capaz de exprimir muito mais com muito menos é a cruz cristã.
Esse é um exemplo único de ressignificação. Os primeiros cristãos conseguiram numa jogada brilhante de marketing ao transformar o símbolo da morte do Messias, que aparentemente deveria ter posto fim ao seu projeto, num símbolo de ressurreição, de vitória e de hegemonia. A cruz cristã, símbolo inicial de martírio e dos derrotados, deu volta por cima e depois de dois mil anos continua atual, amada, odiada, venerada, mas presente em praticamente todo o mundo conhecido.
A cruz é feita de dois traços apenas mas pode projetar milhares de linhas escritas de interpretação, narrativas, imaginação, conteúdos, conectividades, identificações e reforço da "marca". É "moderna" porque responde ao anseio minimalista do nosso tempo – imagens enxutas, simples de reconhecimento imediato.
Por essas razões, por ser antes de mais nada um arquétipo gráfico, o desenho do logo tem a responsabilidade de representar a empresa, como o faziam os totens, e os brasões, pode ser fundamental para contar uma história de fracasso ou de sucesso.
Na composição desse "arquétipo gráfico" entram muitos sinais arquetípicos e cada um tem sua função e importância. As relações de alto (vencedor) X baixo (perdedor), esquerda (passado) X direita (futuro), pequeno X grande, introvertido X extrovertido, simples X complexo ou complicado, claro X escuro, e muitas outras correlações que estão na memória da humanidade carregados de significados bons ou maus.
Por exemplo: quando no Facebook clicamos no sinal do dedo para cima para dizer que curtimos, nem imaginamos a antiguidade desse sinal de aprovação, absolvição e vitória. Alguns de vocês devem lembrar dos filmes sobre gladiadores onde depois de uma luta, o imperador fazia o gesto com o dedinho para cima, autorizando o derrotado a viver, ou para baixo autorizando o vencedor a matar o derrotado. É a reminiscência de um sinal antigo, mas ainda cheio de significados arquetípicos no mundo moderno.
Lembram da história bíblica de Jó avisado por um anjo para sair de Sodoma que seria destruída por suas iniquidades? Lembram da única recomendação do anjo? Não olhem para trás. Por que não olhar para trás? Porque atrás está a iniquidade, o que foi abandonado, o que foi renegado, e se eu olho para trás significa que eu ainda estou atrelado a esse passado insidioso. Esse tema não é novo, está na mitologia grega e em outras tradições. Portanto sinais gráficos que tenham vetores retrógrados, que encaminhem o olhar para trás (ou para baixo) são negativos.
Assim, mais um item deve ser observado em relação aos vetores (que são indicadores de direção, setas, dedos apontando, e traços direcionais) eles podem indicar as direções que a sua empresa vai seguir.
Polissemia do signo
Assim como as palavras e os conceitos, os signos gráficos também têm variados significados, alguns positivos e outros nem tanto. Por isso, ao adotar um signo gráfico temos de estar atentos a essas pluralidades de significados secundários ou terciários- todos são importantes. Assim, é muito comum as pessoas terem um olhar direcionado a um aspecto do signo e trazer junto outro, que não foi percebido. Esse é um valor absoluto, o signo deve necessariamente expressar arquétipos positivos, associados à vida, à prosperidade, a saúde etc, mas também deve ser visto de forma relativa ou seja em sua relação (positiva sempre) com as marcas que identificam.
Um exemplo disso são os logos de empresas aéreas que utilizam o V de Viação que é naturalmente um vetor negativo (aponta para baixo), justamente quando o arquétipo que precisamos aqui, são aqueles relacionados com os ares, com o decolar, subir, ganhar altura. Aí aproveitam esse V para fazer um logo ou uma tipologia que aumente a acentuação negativa do V, resultado… desastre. Um bom exemplo disso foi o novo logo da VASP uma antiga empresa aérea do governo de SP, que foi "revitalizado", enfatizando o V e além disso criando um outro vetor secundário retrógrado, ou seja, voltado para o passado.
Os arquétipos masculinos estão relacionados com o falo, portanto com a forma cilíndrica, e assim a flecha, a lança, a espada, o punhal, o poste, a rocha, tudo que tem dureza, fere, é ativo, marcial, agressivo, indeformável, está associado ao modelo masculino, solar, Yang, criador/fecundador etc. O triângulo ascendente é ao mesmo tempo símbolo do fogo (principalmente se for vermelho) e da virilidade, por isso o pessoal do viagra sabiamente usou a expansão do A ao invés de insistir no V inicial.
Um dos motivos importantes para um logo é o lúdico, aquele que desperta alegria, que tem uma pitada de humor. Claro que isso não serve para todo tipo de marca, até porque o lúdico acaba perdendo a ludicidade com a exposição repetida. Mas arrancar um sorriso do público é sempre o início de um relacionamento promissor, a não ser que você seja dono de uma funerária.
Outro motivo poderoso e sempre positivo, é o que chamo de "motivo ascensional". A PNL- Programação Neuro Linguística, nos informa que olhar para o alto, é um antídoto para qualquer tendência depressiva (situação onde o olhar naturalmente se dirige ao chão). Elevar o olhar para o alto gera impulsos eletroquímicos que melhoram a autoestima, libera serotonina e nos dá ânimo para seguir em frente. Assim, quando temos um motivo ascensional que obriga o vetor do olhar a subir, teremos uma agregação positiva da imagem com a sensação de bem-estar que o percurso do olhar que escala nos proporciona.
Imagine um castelo no alto de uma montanha, imagine a estátua da liberdade, uma catedral gótica, a Torre Eiffel. Um balão bem colorido subindo aos céus. Todos são monumentos ascensionais, que obrigam o olhar a escalar. Você também pode pensar o seu logo nessa proporção, ou no mínimo evitar que ele seja negativo no sentido de para baixo.
Certa vez tive de produzir um logo para uma empresa de engenharia que fabricava alicerces. O dono fazia questão que houvesse uma menção gráfica aos alicerces, ou seja, estacas de concreto que são enfiadas na terra para sustentar a fundação de prédios. Para "compensar " aquele vetor negativo, coloquei sobre ele um conjunto de prédios estilizados em forma de triângulo ascendente (como se fosse uma skyline de Nova York).
Assim, os logos das nossas empresas são sinais de sua antiguidade e poder. São arquétipos que carregam muito mais que significados ancestrais, carregam identificações com o Inconsciente de quem os criou e mais ainda de quem os aprovou, e isso pode nos dar pistas importantes, sobre a vocação original dessa empresa.
Ao analisar os logos sob o prisma dos arquétipos gráficos, vamos desvendar segredos das profundezas do inconsciente de seus dirigentes e poder ter pelo menos algumas pistas da missão e trajetória da marca.
Muito mais que um desenho modernoso e bonitinho, a importância do logo comercial pode alcançar o status de um agente primordial no jogo de vida ou morte da atividade empresarial.