Por Dennis de Oliveira
Em 4 de abril de 1968, há 50 anos atrás, era assassinado o líder do movimento dos direitos civis Martin Luther King Jr.
Pastor da Igreja Batista, Luther King se notabilizou pela luta pelos direitos civis dos negros estadunidenses, que sofriam com as leis de segregação racial vigentes naquele país que sempre se orgulhou de ser “democrático”.
A lembrança da história deste importante líder afro-americano é fundamental em um momento em que se vê em todo o mundo o recrudescimento de discursos e práticas racistas. Em fevereiro passado, por exemplo, a vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco, mulher negra, foi brutalmente assassinada. E os dados mostram que a cada 23 minutos um jovem negro é assassinado no País. Já nos Estados Unidos, cresce assustadoramente o número de afro-americanos encarcerados. Segundo a jurista Michelle Alexander, ativista de organizações inspiradas em Martin Luther King, há mais negros encarcerados hoje nos EUA que escravizados durante o período da escravização no país.
Martin Luther King Jr. nasceu em Atlanta em 15 de janeiro de 1929, segundo dos três filhos do casal Martin Luther King, Sr. e de Alberta Williams King. Desde cedo frequentou a igreja Batista, onde se tornou pastor e um ativista contra a segregação racial nos EUA.
As leis de segregação racial existentes em vários estados dos EUA até os anos 1960 pregavam, por exemplo, a existência de lugares proibidos para negros – desde determinadas escolas até lugares no transporte público. Por isto, foi de grande importância simbólica a atitude de Rosa Parks, que, em 1º. de dezembro de 1955 recusou-se a ceder o lugar em que se sentava em um ônibus a um passageiro branco, em Montgomery, mesmo não estando em uma área definida como reservada aos brancos. Este ato deu início ao movimento de negras e negros contra esta segregação, que contou com a participação de Luther King e isto se espraiou para os EUA.
Martin Luther King, ao lado de Malcolm X, é considerado um dos principais líderes deste movimento antissegregacionista nos EUA nos anos 1960. Para King, um dos elementos-chave para a ocorrência desta situação era a exclusão da população negra dos seus direitos civis, em especial o direito ao voto.
“Não ficaremos satisfeitos enquanto um só negro do Mississipi não puder votar ou um negro de Nova York acreditar que não tem razão para votar.”
Acreditava ele que, à medida que negros não podiam votar, não eram cidadãos nem eleitores e, portanto, suas demandas nunca eram consideradas pelos poderes instituídos. A condição de não eleitor inclusive impedia que negras e negros pudessem participar de júris populares, fazendo com que brancos julgassem réus negros e rés negras.
A opção de luta feita pelas organizações dirigidas por Martin Luther King eram baseadas na tática da desobediência civil e a não violência. Para ele, as ações reativas não violentas às repressões violentas dos racistas gerariam uma opinião pública favorável às demandas dos direitos civis da população negra. As várias marchas lideradas por King pelo direito ao voto e contra as leis segregacionistas atraíram multidões, foram apoiadas por ativistas não negros simpáticos à causa e, de fato, ganharam apoio nacional.
Apesar dessa posição pacifista, Martin Luther King foi intensamente perseguido pelas forças de segurança dos EUA, chegando a ser considerado “comunista” pelo FBI e seu dirigente, J. Edgar Hoover. O programa idealizado por Hoover chamado COINTELPRO teve em Luther King um dos principais alvos. Por isto, as organizações das marchas pelos direitos civis eram vigiadas por espiões do FBI que, não raro, infiltrava agentes seus nas reuniões.
Uma das marchas mais famosas lideradas por Martin Luther King foi a ocorrida em 25 de março de 1965, no estado do Alabama, entre as cidades de Selma e Montgomery, capital do estado. A marcha ocorreu após duas tentativas, uma primeira em 7 de março, interrompida por uma intervenção violenta da polícia que não deixou os manifestantes atravessarem a ponte de Pettus, na entrada da cidade de Montgomery. Depois, nova tentativa em 9 de março, que foi interrompida pelo próprio Luther King ao perceber que havia uma coluna de policiais militares prontos para reprimir os manifestantes assim que atravessassem a ponte de Pettus. Após intensas negociações com o então presidente da República, Lindon Johnson, a marcha consegue chegar à capital. O sucesso dessa marcha inspirou o ativista Stokely Carmichael, futuro líder do Partido dos Panteras Negras, a criar a expressão Black Power (Poder Negro).
Havia uma nítida estratégia política em Martin Luther King: centrar nos direitos civis e no direito ao voto da população negra. Com isto argumentava que as bandeiras do movimento eram democráticas, mostrando que a sua não concessão era um absurdo em uma nação que se propugnava como a grande pátria democrática. A sua famosa frase “Eu tenho um sonho. O sonho de ver meus filhos julgados por sua personalidade, não pela cor de sua pele”, sintetiza uma perspectiva liberal-democrática que, pela força das mobilizações, foi paulatinamente sendo incorporada ao ordenamento político dos EUA, particularmente após a aprovação da Lei dos Direitos Civis em 1964 e da Lei dos Direitos Eleitorais em 1965.
Apesar disto, Martin Luther King dizia que o direito ao voto era apenas um ponto de partida. Defendia medidas que garantissem a igualdade social e o combate à pobreza da população afro-americana. Por isto, em 1968, o líder afro-americano organizou uma campanha pela justiça socioeconômica. O aprofundamento das suas críticas à política dos EUA foi manifestado também pela sua oposição à Guerra do Vietnã. O “perigo”, representado por uma liderança carismática e popular, às estratégias do Estado norte-americano levou a que Martin Luther King fosse assassinado em 4 de abril de 1968.
A partir do ano de 1986, na terceira segunda-feira do mês de janeiro, é celebrado um feriado nacional nos Estados Unidos para homenagear Martin Luther King, o chamado Dia de Martin Luther King. O líder afro-americano recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 14 de outubro de 1964.
Fonte: Dennis de Oliveira é professor e chefe do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes da USP