por Cybele Russi
Muitos leitores têm-nos procurado para encontrar respostas para as dificuldades que seus filhos, na faixa dos 18 meses aos 3 anos de idade têm tido na adaptação escolar. Embora já tenhamos tratado este assunto anteriormente, devido à grande quantidade de cartas que temos recebido pedindo sugestões e informações, acreditamos que vale a pena retomar o assunto.
A grande maioria das cartas sempre se refere ao fato de que nos primeiros dias tudo parece ir muito bem, mas de repente, a criança começa a chorar e não mais querer ir à escola.
Antes de qualquer coisa, é importantíssimo que se diga e que se refresque a memória das pessoas, com relação ao fato de que as crianças são extremamente diferentes umas das outras em suas reações e comportamentos. Infelizmente, numa sociedade massificante e pasteurizante como a nossa, este é um fato que precisa ser constantemente lembrado, pois há uma tendência atual de se acreditar que tudo o que vale para o filho do vizinho deve, necessariamente, valer para o nosso também. Ocorre que as coisas não funcionam assim. Nem entre irmãos gêmeos não funcionam assim, graças a Deus! Senão, seríamos um grande exército de bonequinhos animados. Logo, se as crianças são e têm comportamentos muito diferentes entre si, não adianta esperar que terão as mesmas respostas para os mesmos fatos da vida. Se o filho do nosso vizinho vai para e escolinha desde os 18 meses de idade e nunca teve qualquer problema, isto não significa que o nosso também irá e será feliz.
No que diz respeito à adaptação escolar, é muito pouco provável que todas as crianças tenham as mesmas facilidades, simplesmente porque a adaptação à escola implica em uma série de variantes que nem sempre estão relacionadas apenas ao ambiente escolar. Embora não possa verbalizar seus sentimentos e emoções, a criança tem uma percepção muito clara do que se passa ao seu redor. É como se ela tivesse um pequeno radar que capta todas as ondas e vibrações que passam ao seu redor. A partir das percepções que faz do ambiente ela constróis seus medos, sua confiança, sua desconfiança, sua segurança e sua insegurança. Para nós, que estamos do lado de fora do "radar" é difícil compreender o que pode estar acontecendo, pois temos um arsenal de palavras, pensamentos e justificativas racionais que dão conta de nos fazer compreender quase todos as nossas dificuldades emocionais (embora compreender não seja resolver). Mas a criança ainda não está equipada como nós para dar conta de seus medos e ansiedades, então, tudo o que tem ao seu alcance é o choro e a rejeição ao que não lhe parece bom.
Se no período em que ela começa a frequentar a escola nem tudo está perfeito, como geralmente nunca está mesmo, ela começar a ter reações negativas à escola, porque esta pode estar representando, nesse momento, um elemento a mais a contribuir para seus medos e angústias.
Um exemplo bastante comum é quando a criança é matriculada na escola antes do nascimento do irmãozinho. Alguns pais preferem fazer isso justamente para não coincidir a entrada da criança na escola com a chegada no novo irmão. Mas esta preocupação tem se mostrado inútil, na maioria das vezes, pois a criança, embora não compreenda ainda claramente o significado da chegada de um irmão para sua vida, pode perceber que algo de estranho está acontecendo ou acontecerá na família e que, de alguma forma, sua rotina e seu equilíbrio serão afetados.
Com medo do que pode estar por acontecer e sem ter controle nenhum da situação, tudo o que ela menos quer é se afastar da casa, seu ambiente de conforto e segurança. Então vira uma queda de braço: os pais insistindo na adaptação escolar e a criança se negando a ir. Em geral, o que ocorre é que os pais não conseguem relacionar o fato novo – a entrada na escola – com o fato que nem sequer ainda aconteceu- o irmão que está por chegar. E o que decorre daí é um sofrimento enorme para ambas as partes: pais que se sentem culpados porque insistem no fato e crianças que choram porque não sabem se explicar.
É claro, e temos insistido muito neste ponto, que não há receitas prontas e que cada caso é um caso, mas, de uma maneira geral, quando a criança entre 18 meses e 3 anos de idade se nega a ir a escola ou chora muito para não ir, o melhor mesmo a fazer é deixá-la em casa e tentar encontrar as causas que podem estar motivando tal comportamento.
Algumas vezes não há nenhum causa, ela apenas precisa mais do colo materno e tem mais necessidade de ficar em casa, no aconchego, apenas isto. Além disso, até os 3 anos de idade a criança ainda é extremamente ligada à mãe, por isso, os períodos que consegue ficar longe dela são muito curtos. É só a partir dos 3 anos que ela vai começar a se desvincular da figura da mãe para criar outros vínculos mais fortes com outras pessoas. Por esta razão, a justificativa que alguns pais dão de que a criança precisa ir para a escola para se socializar é "fazer amiguinhos" é de uma inocência muito grande. Até os 3 anos de idade a criança só está focada na mãe, o resto do mundo para ela não passa de figuração, de elenco figurante, que está ali para preencher espaço vazio. O mundo dela se resume à mãe. Sua vida social, em que os outros vão começar a ter alguma importância só terá início a partir dos 3 anos de idade, quando ela começará a construir vínculos com outras pessoas. Portanto, acreditar que uma criança de dois anos de idade deva ir à escolinha para se socializar e fazer amiguinhos é, no mínimo, desperdício de dinheiro.
Infelizmente, somos obrigados a admitir com muita tristeza, diga-se, que a vida atual exige que a mulher retorne ao trabalho quatro meses depois do parto. Para a criança esta é uma grande perda, pois até os 3 anos de idade tudo de que ela mais precisa mesmo é do colo materno e do aconchego da casa. Mas o mundo não está para essas gracinhas, então, aos cinco meses lá se vão os bebês, enrolados em cobertores e mantas, com chupeta, ursinho de pelúcia, mamadeiras, suquinhos e tudo a que têm direito, iniciar suas "vidas escolares". Para estes, parece até que as coisas são mais fáceis, pois o tal período de adaptação passa batido, sem grandes traumas aparentes. Para aqueles que puderam conhecer e curtir com mais intensidade o calor do colo e o aconchego da casa, as coisas parecem ficar mais difíceis e complicadas na hora de cortar pela segunda vez o cordão umbilical.
Para os pais destes eu diria apenas: eles terão a vida toda para fazer lições e amigos, e muito, muito poucos anos para serem bebês. Deixemo-los pois, serem bebês.