Da Redação
Estou muito confusa, não sei como agir, ele sabe que não aprovo, mas quero ajudá-lo
Resposta: A melhor forma de ajudá-lo é você estar ao lado dele, sem querer controlar o que ele sente ou o que ele faz. Sempre que falamos da vida de nosso filhos, carregamos conosco todo aquele projeto que imaginamos para eles desde que nascem (ou até antes disso).
Desde a gravidez, muitas já projetam tudo aquilo que julgam ser o melhor para os filhos. Porém, não é raro que aquilo que seja importante para os filhos nem sempre corresponda aos anseios dos pais.
O fato de o seu filho ter falado a você que não sente atração por mulheres, já mostra o grau de confiança que ele tem em você. Ficar do lado do seu filho é considerando você na sua própria trajetória de vida, nas suas experiências passadas e atuais. Veja, você já admitiu a si mesma que está confusa e não sabe como agir ou pensar a respeito disso. Que tal compartilhar com ele esse seu não-saber? Desse modo surge a possibilidade para que você e ele criem condições para compreender o que acontece. Quanto ao aprovar ou não aprovar, passa pelo senso de juízo, daquilo que é bom ou daquilo que não é bom para ele. Isso não vai ajudar muito, pois não irá contemplar a necessidade de vivências do seu filho. As escolhas ao longo da vida serão feitas por ele a partir das próprias necessidades e interesses. É muito comum os pais se colocarem na posição de ter que saber de tudo. Mas nós, enquanto humanos, não sabemos de tudo, mas podemos nos autorizar sempre a conhecer o novo, aceitar o novo, mesmo que não concordemos com esse novo, mas reconhecemos esse novo como algo possível.
Como faço assumir minha homossexualidade sem culpa?
Resposta: A questão apresentada é complexa. Creio ser importante remeter a alguns aspectos históricos da homossexualidade para se compreender como a culpa se instala. Durante muito tempo a homossexualidade foi considerada perversão, desvio, doença, inclusive sendo registrada em manuais de doenças. A partir do século XVIII até por volta do XIX, existiu um forte movimento para "patologizar a sexualidade". Foi um período onde se buscava classificar as diversas formas de expressão da sexualidade a fim de reafirmar um modelo dito "normal". Nesse período o "modelo normal" era aquele que possuía três características: ser heterossexual, monogâmico e ter prática sexual voltada para a reprodução. Tudo aquilo que fugia dessas três características se convencionava chamar de "desviante", e era passível de alguma forma de controle/tratamento/punição. Hoje, a partir do avanço de pesquisas e de movimentos sociais, a homossexualidade é explicada a partir dos mais variados discursos, porém, reconhece-se que a homossexualidade não é uma perversão, desvio, ou mesmo doença. Desse modo, somente se fala em "cura" na pré-existência de uma "doença".
Por não consistir em doença, desvio ou perversão, em 1973, a Associação Psiquiátrica Americana excluiu a homossexualidade do Diagnostic and Statistical Manual – DSM. No Brasil, em fevereiro de 1985, o Conselho Federal de Medicina deixou de considerar a homossexualidade como doença.
Em 1999, o Conselho Federal de Psicologia, por meio da Resolução CFP no 01/99, passou a proibir o tratamento psicológico visando a "cura" da homossexualidade, depois de denúncias de que psicólogos, associados a Igrejas, promoviam a "cura" (="conversão") de homossexuais para heterossexuais.
Voltando a questão apresentada em como assumir a homossexualidade sem culpa, sugiro que em primeiro lugar você localize aquilo que se refere quando fala em culpa. A culpa está muito relacionada a um sentimento despertado ao ter descumprido alguma regra ou compromisso social. A reflexão é saber como você lidará com aquilo que sente ser seu, e aquilo que esperam de você – é dos outros. Nem sempre será possível conciliar as duas coisas, mas a escolha será somente sua de como lidar com você mesmo. Ainda na linha da culpa, sugiro que reflita também naquilo que desperta esse sentimento em você – alguém que depositou muita expectativa e ficará decepcionado(a)? Localize seus medos, aquilo que imobiliza você de alguma forma. E, outro ponto importante, reflita sobre como você compreende a homossexualidade, e quais as mensagens que você internalizou ao longo da vida sobre o assunto. Essas questões poderão auxiliar você a superar as dificuldades relacionadas a sua sexualidade.
A partir daí você encontrará caminhos para assumir a si mesmo e depois vivenciar a sua sexualidade de forma mais plena. Conversar com alguém que confie, homossexual, ou não, pode auxiliar nessa fase, até mesmo para conhecer as mais diversas experiências.
É inegável que vivemos em um mundo plural. Sempre é bem-vinda a reflexão de como lidamos com a própria sexualidade a fim de se compreender a do outro, principalmente se a sexualidade do outro foge do nosso próprio padrão que acreditamos ser de normalidade. Se o modo de ser do outro gera tanto desconforto, talvez seja um sinal de que o "modelo de normalidade" está rígido demais e clamando por revisão de conceitos.
Como lidar melhor com a questão de se envolver afetivamente com outro homem?
Já que no relacionamento homossexual é muito complicado, pois existe uma troca muito frequente de parceiros, as pessoas só querem transar e pronto
Resposta: Na questão acima citei a importância de reconhecer em si as mensagens incorporadas sobre a homossexualidade. Na sua pergunta você já estabelece que o relacionamento com outro homem "é muito complicado" e que no relacionamento entre duas pessoas do mesmo sexo "existe uma troca frequente de parceiros", e "as pessoas só querem transar e pronto". Envolver-se afetivamente com alguém demanda uma entrega na relação. Se você for "armado" com uma série de mensagens, as suas atitudes serão condizentes com esse modo de pensar, e provavelmente a situação não favorecerá uma relação saudável, e tudo parecerá muito complicado.
Nos relacionamentos heterossexuais existe uma gama de possibilidades de vivências, assim como no relacionamento homossexual. Existem muitos relacionamentos heterossexuais onde as pessoas também só querem praticar sexo e nada mais, e buscam a troca frequente de parcerias. Será que a questão não reside no fato de como se relacionar? Que tal você se propor em conhecer outros homens sem a pretensão de se envolver afetivamente e deixar a relação fluir para, quem sabe, um relacionamento mais íntimo? Que tal substituir "o difícil" pelo "tornar possível" uma relação? Boa sorte!
Fonte: Marcelo Toniette é psicólogo e psicoterapeuta sexual