por Anette Lewin
A psicóloga especializada em relacionamento amoroso Anette Lewin, na primeira parte desta entrevista exclusiva ao Vya Estelar, explica por que as pessoas se relacionam tão mal na vida a dois; revela o que é na prática amar nos dias de hoje e explica por que amar dá trabalho e por que o amor é para poucos. Anette fala também sobre o mito do amor romântico e sobre a dualidade entre monogamia e relações extraoficiais.
Vya Estelar – A grande maioria dos e-mails recebidos no Vya Estelar é sobre conflitos no relacionamento amoroso e no casamento. Por que as pessoas se relacionam tão mal?
Anette Lewin – Porque cada vez menos pessoas têm uma referência do que é uma relação amorosa bem-sucedida. Na atualidade o sucesso da relação não está obrigatoriamente ligado à sua duração. Está mais ligado à sua qualidade enquanto dura, que é construída em conjunto, ao respeito entre os parceiros quando decidem terminá-la e, principalmente, à sensação intuitiva dos envolvidos de que valeu a pena. E não podemos esquecer que a melhor escola para o amor é o exemplo prático.
Pessoas que não têm ao seu redor exemplos de casais amorosamente bem-sucedidos, têm que "inventar" um modelo, se quiserem ter sucesso. E haja criatividade para isso. Além disso, não existe na escola uma educação para o amor ou para os afetos. No máximo uma aulinha de educação sexual "biológica". Aí as pessoas vêm ao Vya Estelar tentar obter informações que não lhes foram dadas no tempo certo. Ainda bem que existe o Vya Estelar para ajudá-las a refletir sobre seus tropeços e por que não, seus sucessos.
Vya Estelar – O conceito mais concreto do que seja amar no dia a dia seria o de construir? Construir o quê? Isso seria o suficiente para explicar o que seja amar?
Anette Lewin – Sim, o amor é uma contrução em parceria. Planeja-se os detalhes necessários para conviver e tenta-se edificá-los na prática. Quem ama propõe-se a compartilhar as emoções geradas durante esse processo. Tanto as agradáveis quanto as desagradáveis. Diferentemente do que acontece com a paixão, que acaba quando momentos desagradáveis, como por exemplo, a clássica falta de dinheiro pela perda de emprego de um dos dos cônjuges, pedem um compartilhamento e uma cumplicidade e não acusações mútuas.
O amor, portanto, requer tolerância, generosidade, cumplicidade, paciência e capacidade de gostar, admirar e aceitar as diferenças do(a) parceiro(a). Muito poucos, nos dias de hoje, preenchem esses requisitos. Atualmente, o amor é para poucos.
Vya Estelar – Nesse sentido, amar dá trabalho, não é? O amor romântico é só “coisa de novela”, de cinema?
Anette Lewin – Sim, amar dá trabalho. Principalmente porque os andaimes da edificação da relação amorosa, assim como os de qualquer construção concreta, estão sujeitos a intempéries, reparos, tempo extra e etc. E essas ocorrências nem sempre são toleradas por pessoas que conceberam o amor de forma romântica, sem pedras no caminho. O amor romântico pode até existir como parte da relação amorosa, mas não a define integralmente.
Se alguns filmes e novelas continuam mostrando a parte romântica do amor, muitos já têm se preocupado em apresentar "o amor como ele é" de fato. São aqueles que não colocam mais o par romântico como os "bonzinhos" e os antagonistas como vilões, mas tentam inserir o lado bom e o lado mau que cada personagem tem, humanizando todos eles. Podemos citar como exemplo a recente novela de João Emanuel Carneiro "Avenida Brasil". Alí a luta dos personagens pelas suas relações amorosas foi mostrada de forma tão realista que o espectador acabava torcendo por todos. Afinal, todos eram extremamente humanos com seus conflitos, suas razões e suas inconstâncias.
Vya Estelar – As mídias digitais e redes sociais estão mudando nossa forma de pensar e de se relacionar. As relações estão mais fluídicas (descartáveis). Esse amor romântico está com os dias contados?
Anette Lewin – Como mencionei, o amor romântico como parte da relação amorosa continuará existindo. Ou como impulso para ela. Mas as pessoas estão mais impacientes, menos tolerantes e a mídia ajuda a fazer a apologia da felicidade obrigatória. Não está bom? Troca! Corra atrás da felicidade, mesmo que tenha que esmagar o que estiver em seu caminho. Assim, pessoas envolvidas amorosamente vão tendo seus sentimentos pisoteados e, como forma de se reequilibrar, pisoteiam os sentimento dos outros. Trocam parceiros reais por parceiros que existem em sua imaginação. Estão felizes? Não sei…
Vya Estelar – A relação monogâmica é a única através da qual o verdadeiro amor pode acontecer? Como o sexo se vincula ao amor?
Anette Lewin – Uma costrução amorosa pode ser realizada a dois, mas tambem a três, a quatro ou mais. Acredito que o amor a dois, assim como sexo a dois, seja uma característica da nossa cultura. Mas sempre existiram, e ainda existem, culturas onde pessoas tinham mais de um parceiro(a) amoroso(a). O sucesso de qualquer relacionamento amoroso está fortemente ligado à administração dos afetos.
Assim como uma relação a dois fracassará se um dos envolvidos pensar só em si, uma relação a três ou mais poderá ser bem-sucedida se os envolvidos souberem esperar sua vez e dividir atenção, carinho com os demais. Quando se entende que dividir é abrir mão, o número de envolvidos não é o problema na relação amorosa. Quanto a amar uma pessoa e ter relações sexuais com outras … bem… isso não é novidade. Sempre existiu e sempre existirá. De forma oficial, semioficial ou extraoficial. Aí, depende de cada cabeça e de cada parceria.