por Elisandra Sé
O número cada vez maior de veículos nas rodovias e nas cidades, juntamente com as grandes fábricas e indústrias, geram poluentes que prejudicam a saúde humana. Segundo o engenheiro químico Saffari, da Universidade do Sul da Califórnia (USC), essas partículas liberadas pelos veículos, principalmente carros e caminhões a diesel, são partículas muito finas para muitos sensores de poluição do ar para medir com precisão, são menores do que 0,2 µm de diâmetro, são partículas "ultrafinas" que vão para dentro de uma classe mais larga de poluentes atmosféricos e, devido ao seu tamanho, causam mais toxicidade e prejuízos para a vida humana.
O engenheiro químico da USC explica que quando se trata de toxicidade, quanto mais pequenas forem as partículas às quais as células estão expostas, maiores são seus níveis de estresse oxidativo, marcados pela produção de moléculas quimicamente reativas, como os peróxidos, que podem danificar o DNA e outras estruturas celulares.
Alguns dos riscos para a saúde ao inalar partículas finas e ultrafinas estão bem estabelecidos, como asma, câncer de pulmão e, mais recentemente, doenças cardíacas. Mas um número cada vez mais crescente de evidências sugere que a exposição também pode prejudicar o cérebro, acelerando o envelhecimento cognitivo, e pode até aumentar o risco de doença de Alzheimer e outras formas de demência.
A relação entre a poluição do ar e o risco de demência continua a ser controversa; até mesmo os seus proponentes alertam que é necessária mais investigação para confirmar uma ligação causal e descobrir como as partículas podem entrar no cérebro e fazer mal.
Entretanto, por meio de crescentes estudos epidemiológicos em todo o mundo, novas descobertas em modelos animais e estudos de imagens cerebrais humanas mostram que é preciso ficar alerta.
Estudo epidemiológico de 11 anos a ser publicado na próxima semana no jornal “Translational Psychiatry”, os pesquisadores da USC relatam que a vida em locais com exposições a poluentes por gás carbono, diesel entre outros poluentes dobrou o risco de demência nas pessoas idosas. Se a descoberta se mantiver na população em geral, a poluição do ar poderia representar cerca de 21% dos casos de demência em todo o mundo, diz o autor do estudo, o epidemiologista Jiu-Chiuan Chen da Keck School of Medicine na USC.
Os pesquisadores da Universidade de Toronto no Canadá relataram na revista “The Lancet” que entre 6,6 milhões de pessoas na província de Ontário, aqueles que vivem a menos de 50 metros de uma estrada principal – onde os níveis de poluentes finos são muitas vezes 10 vezes maiores que os de 150 metros de distância – eram 12% mais propensos a desenvolver demência do que as pessoas que vivem a mais de 200 metros de distância.
Esses estudos são muitos recentes, adverte Michelle Block, neurocientista da Universidade de Indiana, em Indianápolis. No entanto, é um "momento extremamente importante para estudar as conexões entre a poluição e o cérebro”, diz.
Se realmente esses dados comprovarem essa relação da poluição com os prejuízos cerebrais causando risco eminente para as demências, este assunto será de grande relevância científica para a saúde pública em todo o mundo, no sentido de baixar os níveis de poluição do ar para reduzir os riscos à doença de Alzheimer.
Na cidade do México, em 2000, um estudo com cães que desenvolveram demência, sugeriu que a inalação de ar poluído pode causar neurodegeneração. Os neurocientistas da Universidade de Montana, em Missoula, notaram que os cães idosos que viviam em áreas particularmente poluídas da cidade, muitas vezes ficavam abalados, crescendo desorientados e até mesmo perdendo a capacidade de reconhecer seus donos. Quando os cães morreram, descobriu-se que seus cérebros tinham depósitos extracelulares mais extensos da proteína amilóide b – as mesmas "placas" associadas à doença de Alzheimer – do que os cães em cidades menos poluídas.
Os pesquisadores também encontraram níveis elevados de placa nos cérebros de crianças e jovens adultos da Cidade do México que morreram em acidentes, bem como sinais de inflamação nas células imunes do cérebro.
Pesquisadores neurocientistas da USC/USA também realizaram estudos do envelhecimento e do cérebro, em camundongos que respiraram o ar sujo, e evidenciaram que o cérebro liberava uma inundação de moléculas inflamatórias, incluindo o fator de necrose tumoral, que é elevado nos cérebros de pessoas com doença de Alzheimer e tem sido associada à perda de memória. Os ratos expostos à poluição também mostraram sinais de danos cerebrais.
Para entender o que os estudos animais podem significar para as pessoas, no entanto, os cientistas precisam correlacionar a exposição à poluição do ar com exames de cérebro humano e com resultados de testes cognitivos rigorosos. Isso não é tão simples de se fazer, pois os dados históricos de longo prazo sobre a exposição à poluição são escassos nos Estados Unidos e em muitos outros países.
Estudos de imagem também sugerem que a poluição ataca o cérebro humano. Em uma análise de 2015 de exames de ressonância magnética cerebral de pessoas inscritas no Framingham Heart Study, um estudo cardiovascular de longo prazo na Nova Inglaterra, pesquisadores da Harvard Medical School, em Boston, descobriram que as pessoas que viviam mais próximas das rodovias provavelmente tinham um menor volume cerebral. A associação manteve-se, mesmo após ajustar outros fatores de risco como educação, tabagismo, diabetes e doenças cardiovasculares.
Algumas pessoas podem ser mais suscetíveis do que outras. A poluição pode ter um impacto cognitivo maior sobre os pobres, em parte por que eles são mais propensos a viver em locais com exposições mais altas de poluentes, como perto de grandes estradas ou portos.
Ao tentar reduzir os impactos negativos da poluição atmosférica sobre a saúde, as cidades podem tentar concentrar-se especificamente na redução da poluição em comunidades particularmente vulneráveis a essas exposições.