por Silvia Maria de Carvalho
"Ultimamente ando muito nervosa, parece que nada me faz feliz e agora ainda mais, pois quero muito ter outro filho e por mais tratamentos que faça, não consigo engravidar. Sinto-me muito triste e revoltada com a vida, preciso muito de ajuda, sinto me perdida."
Resposta: Longe de dizer que você tem que deixar a luta para a realização de seus sonhos.
Cada um de nós sabe o que tem sentido na própria vida e acho, sim, que devemos seguir na direção dos desejos mais íntimos e pessoais que temos.
Mas seu pedido de ajuda me trouxe alguns questionamentos.
Por que achamos que nossa vida pode ser tão programada?
De onde vem a ideia desse poder de escolha tão absoluto?
No início da vida adulta parece que a gente pode tudo! Há tantas possibilidades, não é? Há tanto que pode ser. Brincamos de fazer planos e imaginar como será. Jogamos com as fantasias do futuro. Posso ser veterinária ou viver na praia. Estudar medicina ou administração e me casar aos trinta anos. Quero que meu marido seja mais alto que eu, tenha bom humor e formação em direito. Que meus filhos tenham dois anos de diferença; o primeiro menino e depois a menina. E por aí vai… Se bobear, já tem o nome das crianças.
Há uma apropriação das palavras como se garantissem certezas. Certeza? De quê?
Aí a gente vai crescendo e descobre um dia, que as opções são mais limitadas, apertadas, exigindo a famosa adaptação.
A vida traz surpresas e isso não acontece só com a gente. Também é assim para aquele vizinho, que vemos de longe e parece que sua grama é mais verde que a nossa. Ninguém está fora das leis da natureza. Nem os bons.
Mas por que então, uns são mais felizes que os outros? Complicada a arte de medir felicidade. Suspeito que são os olhos os responsáveis pela diferença.
Disse Cecília Meireles num poema chamado A Arte de Ser Feliz:
"Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam o muro. Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho no ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Às vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. Eu me sinto completamente feliz. Mas quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim."
De tanto querer manipular a vida, corremos o risco de perder a beleza do imprevisto. A sorte comete bons erros!
Tanta pressa pra chegar lá num lugar que nem sabemos… E esquecemos que já chegamos! Já estamos aqui.
Procure amar o que te cerca. Pequenas conquistas e belezas dentro da sua própria casa. Há flores no seu jardim!