por Roberto Santos
Parodiando uma campanha contra a violência no trânsito de algumas décadas atrás, que dizia: Não Faça de Seu Carro Uma Arma, a Vítima Pode Ser Você…, o uso da maravilhosa tecnologia do e-mail tem feito muitas vítimas, principalmente no mundo corporativo.
Se o resultado no Brasil for equivalente a nossos recordes de acidentes de trânsito, é melhor estarmos preparados para esta outra guerra, porém com uma abordagem pacificista.
Recentemente, o “imeiu” ou, mais elegantemente, o e-mail fez aniversário, 20 anos, mais ou menos, portanto, recém-saído da adolescência. Tão jovem e já criando tantas dores de cabeça para as empresas. Será verdade?
Será que a automatização do processo de envio de mensagens escritas, como as ultrapassadas cartas e memorandos datilografadas, com cópias em papel carbono, enviados em envelopes, com selos e tudo mais, é a culpada por tantos problemas de comunicação atribuídos aos e-mails?
Mal-ntendidos, agressões veladas, delações disfarçadas, distanciamento entre as pessoas, tráfico de “micos”, estrangulamento de redes, quebra de sigilo, desperdício de tempo e outros problemas seriam mesmo causados por essa “obra do demônio”? Nos velhos e bons tempos da Era Pré-Internet e Pré-E-mail esses problemas todos não existiam? Será?
Desde meu primeiro artigo no Vya Estelar, há quase 13 anos, já devo ter respondido, pelo menos, a uma centena de e-mails recebidos de meus leitores e leitoras. Certamente, eles não teriam escrito e eu não teria tempo de respondê-los se não tivéssemos essa tecnologia que aproxima, quase que instantaneamente, tantas pessoas, com ideias, dúvidas, críticas, elogios, angústias, pedidos de ajuda e algumas respostas.
Se existe o lado do Bem desta tecnologia e seu uso, onde se encontra o Mal? Numa de minhas primeiras exposições teóricas à Informática, uns 30 anos passados, marcou-me a expressão traduzida do inglês: “entra lixo – sai lixo”. Ou seja, o computador é capaz de processar o lixo que se coloca dentro dele mas não se pode esperar a sonhada alquimia de transformá-lo em ouro. Se colocarmos veneno numa comunicação por e-mail ele provocará seu efeito mortal mais rápido, mas não será transformado em vitamina.
Há outros tantos anos, desenvolvi um curso sobre Gerência de Tempo, então em seus primórdios. Dentre os “desperdiçadores de tempo” que abordava naquele programa, havia um capítulo especial dedicado às correspondências.
A multiplicação de cópias (carbono e depois xerox) para divulgar algo que se fez ou que alguém não fez, para o maior número possível de pessoas. A “guerra de memorandos” em que gradualmente se aumentava o volume acusatório e o nível hierárquico envolvido. A cópia para arquivo ao final do memo para lembrar ao destinatário que estava protegido contra acusações futuras. Comunicações interdepartamentais que se resolveriam com uma passada no escritório do outro, ou com uma simples ligação telefônica, eram datilografadas por uma fiel secretária ou datilógrafo que diligentemente chamava o contínuo para enviar a declaração de guerra ao oponente.
Estes são alguns dos exemplos tratados naquele curso com os executivos da empresa em que trabalhava, na tentativa de reduzir o desperdício de tempo e o desgaste provocado pelas comunicações mal intencionadas. Adiantou? Não muito, infelizmente.
De volta ao presente, atuando como consultor, em programas de desenvolvimento de lideranca, rapidamente surgem reclamações exatamente da mesma natureza: a comunicação interna é um problema central, e o e-mail, geralmente, é colocado no banco dos réus.
Hoje com uma rapidez assustadora, trocas de e-mails impensados, mal escritos, desnecessários, copiados a toda empresa, com puras demonstrações de poder, filas intermináveis de e-mails prá lá e prá cá que deixariam as folhas corridas de terríveis meliantes com inveja, com metros de comprimento. Isso sem contar, os problemas mais sutis e endêmicos de nossa população: erros crassos de português, de articulação de ideias, de falta de clareza, objetividade e principalmente, etiqueta.
Por conseguinte, minha impressão é que a tecnologia desenvolvida para computadores de mesa, de colo (laptops) e de palma de mão (palm tops) e os modernos tabletes apenas exacerbou as más intenções das pessoas. O que deveria ser uma solução tecnológica tornou-se um transtorno psicológico e econômico.O banco dos réus está com o culpado errado!
Cabe a cada um de nós repensar o processo de comunicação para evitar que sejamos transformados em vítimas. Depois de abordar a origem do problema, preparei alguns alertas e sugestões que compartilho com vocês a seguir:
1. O e-mail não deve substituir o olho no olho ou ouvido no fone
Uma pesquisa extensamente citada em programas de comunicação encontrou que sua eficácia depende 7% das palavras que são ditas, 38% do tom de voz e 55% da expressão corporal (gestos e expressões faciais). Daí, fica claro, o quanto se perde quando tentamos limitar nossa comunicação interpessoal ao e-mail. Ficamos com apenas 7% para conseguir comunicar o que pretendemos. Portanto, antes de mandar seu próximo e-mail, pense um pouco:
A. A que distância está a pessoa com a qual você precisa se comunicar?
Se estiver a menos de 50 metros ou uma escada escura, levante-se e vá até ela. Principalmente, se for alguém que você não conhece pessoalmente, que não conhece seu jeito de falar, ou ainda, se o assunto for mais delicado do que mandar uma informação simples, não poupe suas calorias e pratique seu networking interno. Fazendo isso, você terá até 100% de probabilidade de sucesso em sua comunicação.
B. Se não puder ir até lá porque não tem tempo, use o aparelho criado por Graham Bell e incrementado pela tecnologia digital e ligue para a pessoa, nas situações descritas no item anterior. Você perderá “apenas” 55% das possibilidades de uma comunicação efetiva, mas ainda terá outros 45%, se usar as palavras e o tom de voz adequados. Mas não se esqueça, é olho no olho e não olho por olho, como alerto a seguir.
2. Se o e-mail for inevitável, não relaxe e capriche…
Às vezes, precisamos transmitir uma mensagem rapidamente para um número grande de pessoas, em diferentes localidades, de distâncias variadas, mas maiores do que alguns passos ou andares. Nesses casos, algumas sugestões:
A. Se sua autocrítica quanto a seu domínio do Português lhe avisa que o pessoal da Academia de Letras está se virando no túmulo, ou em suas cadeiras, procure um curso de revisão gramatical ou, pelo menos, compre um livro daqueles de “Os 100 Erros Mais Comuns”. O mesmo se aplica à sua habilidade de estruturar suas ideias de maneira clara, sucinta e precisa. Também não faltam cursos para aperfeiçoar-se nesta competência. Não, o e-mail não pode dispensar essas “formalidades” de uma boa redação, com um bom Português. Elas costumam ser a fonte dos mal-entendidos ou, pelo menos, da deterioração de sua imagem pessoal.
B. Quando você estiver com raiva, com aquele espírito de vingança mortal, pronto para dar aquela resposta merecida a um e-mail malicioso e agressivo que acabou de receber, com cópia para o Presidente da empresa, antes de dispará-lo, imprima o rascunho de seu contra-ataque e reflita. Volte ao tempo e imagine-se saindo para comprar o papel de carta, o envelope e os selos, pegando fila no Correio, etc. Calcule o tempo que isso levaria, então deixe seu rascunho de lado, durante este tempo ao menos. Depois, de preferência no dia seguinte, releia seu revide e coloque-se no lugar de todos que o lerão. Faça o teste: “Eu diria olho no olho, com todas as testemunhas copiadas, o mesmo que escrevi, da mesma forma implícita em minha comunicação escrita?” Pode ser que você ainda dê o “Enviar" irreversível, mas terá se dado a chance de considerar alternativas de intenções mais elevadas do que da agressão recebida. Cuidado com a “incontinência digital”!!
3. Comunicação eficiente é aquela que chega a quem precisa dela
A. A tentação de mandarmos aquela mensagem superbem cuidada em forma e conteúdo, com suas maiores realizações, para toda a empresa pode ser muito grande. A literatura epidêmica de autoajuda traz tantos incentivos à autopromoção que o critério de seleção de quem de fato precisa daquela mensagem fica elástico demais. “O pessoal do malote da filial de Manaus deveria saber disso!” Pronto! Você encharcou as Caixas de Entrada das pessoas que vão ficar pensando: “O que é que eu tenho a ver com isso?” E pior, numa próxima mensagem sua, vão pensar duas vezes em abri-la, e logo passarão a deletá-las sem ler. Uma regra básica de qualquer comunicação é considerar a audiência a quem se destina. Não menospreze sua importância.
B. Do outro lado, cuidado também para não entrar no fogo cruzado de e-mails e assuntos que não lhe dizem respeito diretamente. Lembre-se que também existem “balas perdidas” nas empresas. Se você se sentir atacado indiretamente, se perceber que podem estar tentando cooptá-lo a uma causa da qual não partilha, ou simplesmente, se notar que esperam sua gasolina para aumentar a fogueira, faça de conta que não é com você e espere dirigirem-se diretamente a você e não por cópia.
C. Fique alerta também às ditas Cópias Ocultas – a probabilidade de que seu conhecimento oculto ser revelado rapidamente é muito maior do que parece. Por último, se você não conhece ainda o recurso de eliminar os e-mails prévios àquele que está respondendo, procure descobrir. Quando indispensável, copie apenas o último e delete todas as incontáveis mensagens que o precederam – quebre essa corrente do mal ou de desperdício de tempo!
Os atuais meios de comunicação proporcionados pela Internet: e-mail, SMS, Skype, MSN’s, Facebooks, Twitters e outros, podem ser maravilhosos para aproximar e unir as pessoas, ou satânicos para colocá-las em duelos mortais, dependendo, principalmente, da intenção que se tem. Com boas intenções já precisamos cuidar de muitas coisas para que a comunicação chegue a seu destino com o significado desejado. Entretanto, quando as intenções são malévolas, não há tecnologia ou habilidade escrita, que possam evitar o desastre, mais cedo ou mais tarde. Cuidado então para a vítima não ser você!