por Ceres Araujo
A família é a única instituição que, durante todo o processo histórico, desde que criada, nunca desapareceu. Entretanto, a estrutura da família mudou muito nas últimas décadas. Além disso, a maneira de se ter, cuidar e educar filhos também variaram.
As famílias nucleares (pai, mãe e filhos), numerosas de outrora, foram substituídas pelas famílias cada vez menores. Dificilmente se optava por ter um filho apenas ou mesmo por não ter filhos. A função mais importante da mulher era ter e criar filhos. Para isso, ela contava em geral com a orientação e ajuda da própria mãe, sogra, avó, tia e toda a linhagem feminina da família. Não havia a necessidade de se buscar em livros, a instrução a respeito de como criar filhos. Aliás, a literatura nesse tema, era escassa e a existente falava, quase que exclusivamente, sobre doenças infantis. Eram as mulheres que passavam às suas descendentes os modos e os jeitos de cuidar de crianças. Além disso, as babás eram mais ajudantes que profissionais especializadas e, portanto, mais fáceis de se encontrar e, às vezes, faziam parte da família por gerações.
Hoje, o mundo mudou radicalmente nesse sentido. Não se pode contar com tais ajudas. As mulheres se inseriram no mercado de trabalho. Avós trabalham e mães e pais cumprem hoje até mesmo duplas jornadas de trabalho. Na maioria dos casos, apenas aos pais cabe assumir o cotidiano da casa e o cuidar dos filhos.
Família hoje é gerenciada como empresa
Observa-se que, na sociedade contemporânea, a família está sendo gerenciada como uma empresa. Ter, criar e educar um filho significa um investimento eterno de afeto, mas também um investimento financeiro no curto, no médio e no longo prazo. Pensando no mundo tão competitivo que o filho terá de enfrentar e baseando-se nas dificuldades e nas facilidades que tiveram na vida escolar e têm na vida profissional, pais planejam para seu filho um currículo extenso e oneroso para o aprendizado de vida.
Mães e pais hoje têm carreiras, ambições profissionais e precisam avaliar muito bem o compromisso de ter um filho. A falta de ajuda objetiva para o cuidar e os altos custos financeiros, relativos à criação e à educação de uma criança, têm levado à opção pelo filho único.
Nem sempre opção por filho único é tranqüila
Nem sempre a opção por um filho único é uma opção tranquila. Por um lado, existe ainda o preconceito de que uma criança necessariamente precise de um irmão, sendo que os pais, ao escolherem ter um só filho, costumam conviver com sentimentos de culpa em relação ao filho, julgando-se egoístas por não lhe darem um irmão. Eles buscam compensar muitas vezes o filho único com mimos em excesso. Por outro lado, a superproteção tende a ser frequente no caso de um só filho, que passa a ter a sobrecarga do excesso de cuidados.
Criança necessita de mimos e proteção, mas ser excessivamente mimada e superprotegida constitui um risco para o desenvolvimento, pois levará a uma estruturação frágil da personalidade.
Como então, criar um filho único para que ele seja forte e feliz? A educação de uma criança única não é tão diferente da educação de uma criança que tem irmãos. Um filho, seja ele, bebê, criança ou adolescente, precisa de uma relação próxima e amorosa com seus pais e de limites firmes e bem colocados.
Pode-se descrever aqui, algumas das situações mais difíceis que pais de filho único podem enfrentar e como se posicionar diante desses conflitos mais delicados:
Cinco situações difíceis enfrentadas por pais de filho único no dia a dia
1ª) Inflação do papel de pai e mãe, em detrimento do papel de marido e mulher e de outros papéis, como forma de compensar a “solidão” do filho. Pais precisam ser figuras valorizadas, até idealizadas pelo filho. Assim sendo, precisam ser pessoas completas, não apenas mamãe e papai.
2ª) Apego exagerado a um dos pais, com a exclusão do outro. Nesse caso, é necessário que o filho seja ensinado a se colocar na família como o terceiro, excluído do casal. Ele precisa saber que, antes de serem seus pais, eles são marido e mulher. É um aprendizado importante para o presente e para o futuro: aprender a viver como impar frente a um par, aprender a se entreter sozinho, para não depender sempre do outro.
3º) Exigência constante do filho, que quer ser atendido, de maneira imediata, em suas necessidades e desejos. Criança precisa aprender a lidar com frustração, a tolerar espera e a adiar satisfação de desejos. Precisa aprender a considerar os desejos e as necessidades alheias, para que possa fazer trocas afetivas com as outras pessoas.
4º) Convivência demasiada com adultos. Criança precisa do convívio de crianças. A indicação mais precoce da pré-escola, pode dar à criança um ambiente adequado, para que ela aprenda a dividir a atenção do adulto com outras crianças, a brincar junto, a partilhar seus brinquedos, a se impor e a ceder.
5ª) Filho se torna superprotegido pelos pais, pois todas as atenções estão voltadas exclusivamente para ele. Ele esquece um casaco, os pais levam; ele esquece um caderno, os pais levam; ele esquece a lancheira, os pais levam. Depois, os pais acham que ele é esquecido, desorganizado, etc. Faz-se necessário, às vezes, no seu esquecimento, que os pais deixem o filho arcar com as consequências da distração. Assim, ele começará a lembrar mais de suas coisas e de suas responsabilidades. Pais não são serviçais do filho.
Pois bem, pais que assumem a condição de ter apenas um filho enfrentam situações de vida, de criação, tão complexas quanto pais que optaram por ter mais de um filho. O que antes era raro (o filho único), hoje é mais do que comum. É natural que o filho único tenha uma formação tão sadia quanto aqueles que possuam irmãos. Basta, apenas, alguns cuidados.