por Roberto Santos
Acho que todo mundo já ouviu a história de que o RH trata das coisas "soft" do negócio. Lidar com gente seria moleza para essas pessoas, em oposição às coisas "hard", presentes na maioria das outras funções de uma empresa: produção, vendas, marketing, finanças, entre outras. Ou seja, o lado duro da vida corporativa. Mas isso está mudando gradativamente.
Ao RH se pede agora postura estratégica diante do negócio da empresa, sem deixar de lado suas funções burocráticas, submetidas a uma legislação jurássica e engessadora, e funções técnicas (quando não terceirizadas) como: recrutar, selecionar, avaliar, remunerar, treinar, desenvolver e demitir. Para ocupar seu espaço, o profissional de RH, combalido por várias lutas inglórias, precisa aceitar e vencer o desafio de mudar o seu perfil.
Administradores, gerentes, presidentes, líderes em todos os níveis e indústrias se veem abalados pela revolução sutil nas entranhas de suas organizações: a decisiva luta pela igualdade no tratamento dos assuntos humanos, psicossociais, e aqueles de cunho técnico, produtivo ou econômico.
Essa revolução se levanta pela constatação, na prática, de que são as pessoas e a cultura organizacional engajadora que podem diferenciar competitivamente uma organização das outras. Elas podem mudar completamente o vetor da mudança em um dado mercado. São as pessoas que, mesmo em número reduzido, podem levantar ou afundar uma organização, quase da noite para o dia.
As organizações que viveram fincadas em paradigmas de RH como a área burocrática, daquele pessoal que "gosta de lidar com gente", agora buscam interna ou externamente o parceiro estratégico ideal que as ajude a ler essa variável tão crítica para o sucesso de seu negócio, muitas vezes sem encontrar.
O profissional de RH se vê então numa crise existencial, levado ao corner do ringue empresarial, onde lhe é pedido para, finalmente, ser um “parceiro estratégico”.
O “Encarregado do Pessoal" do passado é cobrado ainda pelo papel de agente de mudanças — uma vez que as mudanças não acontecem de fato por causa dos anseios e planos estratégicos da cúpula das organizações mas, sim, dentro de cada indivíduo que sobrevive em camadas mais inferiores dos organogramas. É ele que pode sustentar ou solapar uma mudança planejada e acalentada no topo.
O novo gerente de capital humano, gerente de talentos, ou mesmo nosso conhecido gerente de recursos humanos precisa, antes de tudo, passar por uma imersão total para ganhar fluência no idioma e dialetos do mundo dos negócios, e só então ocupar seu merecido lugar no comitê executivo das empresas.
Ele tem que aprender, seja na academia ou na vida prática, assuntos como finanças, marketing, vendas e sistemas de informação relativos à indústria a que está servindo, pelo menos. Dessa maneira, terá melhores condições de demonstrar como RH é capaz de contribuir para aquela linha final da lucratividade que todos querem ver positiva e ascendente.
O RH precisa sofrer uma lavagem cerebral que lave antigos sentimentos de inferioridade e discriminação. Durante muitos anos, esse mesmo profissional foi alijado de decisões mais estratégicas da empresa por lidar apenas com o intangível – como conseguir provar que treinamento de liderança é importante para os resultados. Muitos se resignaram ou se acomodaram, com prejuízo até de sua imagem perante grande parte da organização.
Para se mostrar renovado nosso ou nossa RH necessita recuperar a autoestima e defender seus pontos de vista e propostas junto à cúpula da organização, embasando-as com evidências na forma de mensuração dos fatores humanos do negócio.
Essencialmente, o profissional de RH deve ser um expert em gerenciar paradoxos, equilibrando as necessidades humanas e empresariais, e ainda guardando a chama da cultura organizacional e dos princípios éticos universais como balizadores das decisões estratégicas.
O novo RH, como parceiro estratégico e aliado principal nos processos de gestão da mudança, deve manter sua vocação genética de fazer uma tradução simultânea dos anseios e expectativas dos colaboradores para a gerência de linha e entregar os produtos básicos de sua competência: a manutenção de um fluxo de talentos – ajustado qualitativa e quantitativamente-, a criação de programas e processos fomentadores de inovações e, como condição sine qua non, a arquitetura de um clima organizacional de excelência, apoiado sobre relações trabalhistas de padrão avançado, que seja atraente para os melhores talentos do mercado.
Às vezes, a área responsável por recursos humanos nas empresas já está tão contaminada com paradigmas tecnicistas ou burocráticos que nem seu RH consegue perceber essas necessidades ou mudar na direção ideal para todos, podendo requerer um consultor externo.
Nesses casos, o consultor deve cuidar de, inicialmente, entender o histórico de RH da empresa – suas principais atribuições e realizações, para depois tratar de fazer uma avaliação quanto ao papel atual de RH em relação às expectativas da linha e, finalmente, contribuir para desenvolver a equipe de RH na direção de um foco mais estratégico.
A mudança será engendrada por meio do desenvolvimento das competências faltantes da equipe e da intermediação da leitura do plano estratégico da empresa, juntamente com RH, para redirecionar suas prioridades, partindo da necessidade do negócio, ao invés de simplesmente copiar as melhores práticas de outras empresas que figuram em listas de melhores empresas para se trabalhar, algumas de resultados duvidosos.
Tal processo deve ser complementado pela identificação de indicadores-chave de desempenho mensuráveis para posterior monitoramento. Obviamente, todo esse movimento deve ser acompanhado da entrega ininterrupta dos serviços básicos de sua competência, com excelência ampliada.
Feitas as lavagens cerebrais, imersões totais e coachings, esse novo RH, rebatizado ou não, poderá finalmente concretizar para seus parceiros do lado “duro” dos negócios, os benefícios da gestão estratégica do patrimônio intangível, ou “mole”, de seus recursos humanos.