por Roberto Goldkorn
Há muitos anos me interessei pelo estudo do Mal como finalidade. É natural que ao procurar entender o porquê do Mal, da malignidade humana, minha atenção recaísse na figura quase universal do diabo, o Inimigo, o causador e inspirador do Mal – o Maligno!
Buscando pelo diabo encontrei suas manifestações na violência das guerras, no estupro, no despotismo sem pudor dos tiranos, na violência nem sempre silenciosa que acontece dentro dos lares, mas sempre achei que o diabo era maior do que essas coisas tão ostensivas, banais, que certamente eram deixadas a cargo de subalternos – os demônios.
Onde então se esconderia o fedor enxofrento, as estratégias mais malignas do cujo, daquele que tem como natureza a confusão, a mentira e o caos?
Minha mais recente hipótese sugere que o diabo é o arquiteto da Racionalização. Racionalização nas palavras de um eminente professor e Lógica é o raciocínio a serviço da Mentira. Essa definição é ou não é a cara do diabo?
Leio as colunas de comentários do leitor, ou dos internautas sobre matérias mais ou menos relevantes, e sempre encontro o diabo mostrando o seu rabo virtual entre eles.
Querem um exemplo: Como sabem estamos em plena Copa do Mundo de futebol em 2014. Um craque do time do Uruguai mordeu seu adversário no ombro e foi punido exemplarmente pela FIFA.
Lendo os comentários sobre o episódio, quase todos apoiando a punição e condenando o mordedor contumaz, um chamou a minha atenção. O internauta disse mais ou menos o seguinte: "Hipocrisia pura. Como todo mundo sabe a FIFA é a entidade mais mafiosa, e mais corrupta da Terra e não tem moral etc, etc. Em nenhum momento ele se ateve ao fato em questão – enviesou para outro assunto, fazendo afirmações sem base factual para tentar invalidar um fato concreto, ou absolver o "criminoso" acusando o sistema de ser mais criminoso ainda. Talvez acreditasse que a transgressão aos mais básicos princípios do esporte devesse ficar impunes porque a FIFA é mafiosa". Aí está o diabo!
Usar a energia do raciocínio para desviar, ocultar cadáveres, falsificar, usando as palavras como cartas de baralho nas mãos de um mágico, é seguramente obra-prima do diabo.
Certa vez na praia não consegui evitar o embate com um rapaz conhecido de conhecidos que começou a desenvolver um pensamento antissemita. Ele dizia que todos estavam cegos e não viam que eram "Os judeus são os grandes conspiradores, os grandes artífices do mal, eles eram o governo secreto do mundo, tudo estava nas mãos dos judeus, e arrematou… "Não é à toa que Hitler quis exterminá-los para poder ter um mundo mais saudável". Fiquei tão revoltado que quase perdi a serenidade para argumentar. Achei que o rapaz tinha algum distúrbio mental, olhei bem em seus olhos para ver se não havia ali um traço de zombaria ou de provocação.
Ainda tentei demolir seu argumento em suas premissas dizendo a ele que não existia essa coisa, uma entidade supranacional chamada de "os judeus", que isso era uma abstração. Ele não se abalou (o diabo não se entrega facilmente), e contra-atacou: "Você já examinou o sobrenome por trás das grandes fortunas? Todos ou quase todos judeus. É esse dinheiro que alimenta a máquina de dominação mundial e causa a miséria do mundo." Não, o sujeito não rasgava dinheiro, não era louco, possuído talvez – mas ele acreditava naquilo, ele e muitas outras pessoas.
Hoje busco a presença diabólica nos discursos, nas contradições internas, na ausência de lógica, na falta de argumentos sólidos e no excesso de teor emocional. Quanto mais se grita menos se diz a verdade (ditado espanhol adaptado).
Certa vez me contaram que um sujeito ao assistir minha palestra disse ironicamente para seu colega: "A serviço de quem ele está?" Em nenhum momento ele tentou me contestar, contra-argumentar. Seu diabo optou pelo caminho mais indolente e perverso – tentar desmoralizar quem fala, para buscar destruir o que falou.
Não acredito nos diabos das religiões sei como e por que eles foram criados. Acredito porém, que o mal se manifesta como inimigo do nosso progresso moral e físico, como antagonista do amor e a concórdia entre as pessoas.
Se eu tivesse poder, instituiria o estudo da ciência da Lógica nas escolas, para que todas as crianças aprendessem a raciocinar de forma orgânica, a serem investigadores incansáveis da verdade, e pudessem expressar em seus discursos ideias claras, lógicas, verdadeiras… Enfim, o império da razão sobre a falsificação que só pode ser defendida com armas e violência.
Para banir o diabo que semeia confusão e guerra, temos de desmontar, ou pelo menos apontar para o seu rabo escondido nos discurso racionalizantes, contraditórios. Apontar o erro para esses cantos de sereia ideológicos, mostrar sua inconsistência, mas tomando o cuidado sempre com as armas engatilhadas que são o último argumento dos que não têm Argumento.