No relacionamento amoroso os envolvidos, conscientemente ou não, acabam se revelando a cada encontro. E essa revelação não se faz apenas pelo que dizem com palavras.
E-mail enviado por uma leitora:
“Principalmente nas primeiras saídas com alguém, ainda na fase do ficar, tememos a intimidade, nos revelar, por conta de nos fragilizarmos. Nos revelar por inteiro no amor seria uma atitude ingênua ou pura? Haveria um momento mais adequado para nos revelarmos por inteiro? Obrigada”
Resposta: “Nos revelar por inteiro no amor…” Afinal, o que significa isso? Será que é possível atingir tamanho grau de autoconhecimento que nos permita uma exposição total de quem somos? E, será que somos tão fortemente moldados que nossa estrutura permanece a mesma durante toda nossa vida? Certamente não!
Somos seres líquidos
Somos seres que podem até entender parte do que somos ou sentimos, mas não tudo; somos seres que se transformam constantemente; seres que mudam de ideia; seres que mudam seus sentimentos em relação à mesma situação; somos seres líquidos.
Assim, mesmo que quiséssemos, não conseguiríamos nos revelar totalmente ao ser amado, nem no começo, nem no meio e nem no final de um relacionamento.
Linguagem não verbal revela muito mais do que palavras
No relacionamento amoroso os envolvidos, conscientemente ou não, acabam se revelando a cada encontro. E essa revelação não se faz apenas pelo que dizem com palavras. Muito pelo contrário: a linguagem não verbal revela muito mais sobre nós do que nossas palavras.
Certamente, é importante avaliar com critério e sensibilidade o que deve ou não ser compartilhado nos primeiros encontros. Certamente é importante uma certa espontaneidade para que as emoções possam fluir na parceria amorosa. Mas questões polêmicas, que possam despertar desconfiança ou preconceito devem ser guardadas para mais tarde. Por exemplo, não é necessário abordar, pelo menos nos primeiros encontros, situações que aconteceram em parcerias amorosas anteriores; muito menos questões de amizades destruídas ou rancores em relação à família. Um novo parceiro amoroso não deve ser usado como um balde onde se descarregue frustrações. Pois esse tipo de revelação não acrescenta, só subtrai. Afinal, todos temos problemas, não é?
Como iniciar uma parceria amorosa
Mas uma nova parceria amorosa tem como objetivo a construção de algo saudável e colaborativo e os temas iniciais devem se relacionar a pequenos projetos do presente, não a juntar cacos de projetos anteriores ou elaborar grandes projetos para o futuro.
Além disso, para que a relação não perca seu equilíbrio, é importante que haja uma reciprocidade nas revelações que vão sendo feitas. Revelações são como cartas de baralho de um jogo: cada um tem sua vez e tem que respeitar a vez do outro. Assim, não adianta “planejar” seu grau de revelação, pois ela deve estar ligada à resposta do parceiro. Uma revelação pode ser importante para um dos parceiros, mas absolutamente insignificante para o outro.
Logo, um trauma sofrido por um, por exemplo, pode ser um momento de profunda dor para quem o viveu, mas pode não despertar no outro uma reação de surpresa ou identificação. Assim, é importante saber que vivências pessoais intensas, quando descortinadas, podem passar batido para quem as ouve. E isso não significa, necessariamente, falta de amor. Apenas demonstra quanto significados afetivos são pessoais e, muitas vezes, não compartilháveis.
Frustração ao dizer “eu te amo”
Revelar intenções amorosas é outro tema que deve seguir a linha da reciprocidade. Muitas pessoas se decepcionam ao dizerem “eu te amo” e receberem o silêncio como resposta. É preciso levar em conta que nem todo mundo gosta de expor seus sentimentos verbalmente. É necessário entender que a linguagem amorosa não se resume a palavras ou frases românticas. Para alguns o amor se revela em atos; para outros num simples olhar.
O que mobiliza uma relação amorosa? Assim, muito mais do que confissões, revelações ou histórias vividas, o que mobiliza um relacionamento amoroso é o que os parceiros criam juntos. Revelamos o que somos nas nossas ações, na nossa sensibilidade para entender e compartilhar momentos, na nossa capacidade de dividir vitórias e derrotas. E cada construção amorosa tem seu tempo pessoal, suas características pessoais. Respeitar esse tempo é o importante. Regras preestabelecidas só atrapalham.