por Johann Heyss
É bem conhecida a relação entre os números e os arcanos do tarô. Muitos, contudo, creem ser esta relação necessária, ou seja, que o arcano 1 e o número 1 representam exatamente a mesma coisa. Não é bem assim; devemos considerar que os arcanos do tarô (seja qual for o baralho de cartas em questão, dentre uma enorme variedade) são formados através de uma vasta quantidade de símbolos com bases diversas, como cores, mitos, alquimia, astrologia e… números. Portanto, a correspondência entre números e arcanos não poderia ser exata, por se tratarem de sistemas distintos. Mas, por outro lado, o mesmo número que tem seu simbolismo próprio na numerologia contribui como um dos elementos a formar o todo de cada arcano do tarô. Assim, os números são uma parte do simbolismo dos arcanos, mas não resumem este simbolismo por si só.
Vamos agora abordar a conexão entre os principais números e os 22 arcanos maiores do tarô. Queira observar que estaremos usando o princípio da soma essencial dos números, ou seja, números compostos são reduzidos até chegar à sua essência original – por exemplo, o número 1 terá três arcanos relacionados, o próprio arcano número 1, mas também os arcanos 10 (pois 1 + 0 = 1) e 19 (pois 19 = 1 + 9 = 10 = 1 + 0 = 1). Note também que estarei utilizando as correlações através do tarô de Thoth, criado por Aleister Crowley e Frieda Harris.
Número 1 – O Mago (01) , A Roda da Fortuna (10), O Sol (19)
O Mago, o arcano número 1, é o grande iniciador dentre as cartas do tarô. É o início da grande viagem, representado pelo seu personagem principal, um homem cheio de potenciais, mas com muito chão ainda por percorrer.
A Roda da Fortuna, arcano número 10, representa o impulso da mudança, o ciclo que faz com que o líder caia e o subalterno suba. São os altos e baixos que atingem a todos, inclusive ao número 1, que ao experimentar a existência como 10, descobre que mesmo ele pode ser vulnerável em algum momento, mesmo que passageiro.
O Sol, arcano 19, representa o lado mais yang do número 1, a força solar em seu aspecto mais abrasivo e impositivo.
Número 2 – A Sacerdotisa (01), O Aeon (20)
A Sacerdotisa, arcano número 2, é a polaridade complementar ao número 1. Ela vem a ser os olhos daquela cabeça, a fonte de intuição e percepção sutil.
O Aeon (também encontrado em outros baralhos de tarô como O Julgamento) representa o fim das ligações com o passado, a dissolução dos fantasmas e o alvorecer de uma nova era. Quando o número 2 se liberta do apego, a evolução o transforma no número 20.
Número 3 – A Imperatriz (03), O Pendurado (12), O Mundo (21)
A Imperatriz relaciona-se com o número 3 no que diz respeito à geração, ao criar – no sentido da criatividade artística ou imaginativa, e no sentido da criação de um filho.
O Pendurado, por sua vez, reflete o aspecto estanque de 3, quando este tem uma origem 12, o que pode tanto representar sabedoria e paciência quanto auto-sabotagem.
Já O Mundo, arcano de número 21, reflete a ansiedade e a sede de abarcar a tudo de uma só vez, o que resulta em ansiedade, mas também em rapidez de resultados.
O Imperador (04), A Morte (13)
O Imperador reflete o aspecto de Senhor da Terra que é parte do arquétipo de 4. Aquele que estaciona, se estabelece, luta e, desta forma, conquista seus domínios.
A Morte, número 13, é o reverso deste processo, quando aquilo que parece estável sofre um corte que a tudo redimensiona.
Número 5 – O Hierofante (05), A Arte (14)
O Hierofante é aquele que comanda as massas não através de ardis imperialistas como o arcano que o antecede, mas conectando as forças políticas e religiosas da sociedade, de maneira ágil e às vezes mesmo maliciosa. Esta facilidade de trânsito entre diferentes interesses é uma das características do número 5.
Por sua vez, a reconciliação entre opostos aparentemente incompatíveis se dá no arcano 14, o qual representa a realização da arte alquímica do misteryum conjunctionis – ou 'mistério da união'.
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Número 6 – Os Amantes (06), O Diabo (15)
Os Amantes é um arcano que representa o momento da tomada da decisão, quando não se pode mais simplesmente flanar inconseqüentemente pelos corações e situações alheios. Toda escolha implica ganhos e perdas, e a escolha dentre dois ou mais amantes é um rito de passagem para todos, independente de época ou lugar.
Já o Diabo pode estar certo de ter sua escolha feita com vistas à mais hedonista das auto-satisfações, o que pode ter seu lugar ou momento ou mesmo expressar total animalidade.
O Carro (07), A Torre (16)
O número 7 inicia uma nova jornada, largando para trás o mundo social ordinário e buscando desbravar os campos da mente e as cidades da alma. O Carro faz eco a este aspecto de 7, representa o momento de pisar no acelerador e não olhar para trás, revertendo assim todo o processo de estabilização e apego do número 6.
Por sua vez, A Torre simboliza o momento de destruir tudo aquilo que está errado, ultrapassado ou deteriorado. Esta destruição pode ser voluntária – o que facilita as coisas ao torná-las mais rápidas – ou se dar por si própria, podendo ser até retardada, mas nunca impedida.
Número 8 – A Justiça (8), A Estrela (17)
Após o Carro, arcano anterior, ter pisado forte no acelerador, a Justiça vem apresentar o limite de velocidade e eventuais multas. É quando se aprende que mesmo as mais libertárias rupturas requerem algum tipo de método ou organização.
A Estrela, por sua vez, é a luz no fim do túnel após a derrocada impiedosa da Torre que a precede.
Número 9 – O Eremita (09), A Lua (18)
Apesar de o número 9 aparentemente voltar sem restrições para o lado externo do mundo e das pessoas, há uma grande dose de visão interior e concentração em toda a sua aparente (e verdadeira) inquietude.
Mas A Lua evidencia a escuridão ainda maior que vem após a falsa impressão de uma luz no fim do túnel anunciada pela Estrela (número 17). Contudo, este é apenas mais um portal de iniciação que deve ser ultrapassado com tranqüilidade – o que em si já representaria uma vitória sobre o *ordálio.
Número 11 – Luxúria
Muitos baralhos usam o nome "A Força" para este arcano, rebatizado por Aleister Crowley como Luxúria. Na verdade, esta força de luxúria revela o maior poder do mago, aquele que o número 11 parece já nascer sabendo: amor é a lei, amor sob vontade. Ou seja, só aquilo que lhe dá tesão (no sentido literal e simbólico) vale a pena ser objeto de sua dedicação e atenção. Afinal, sua vida é apenas essa (até que provem o contrário) e só você pode vivê-la. Como ninguém calça seus sapatos nem sabe onde lhe aperta o calo, opiniões devem ser vistas como visões de outros sobre você, o que é válido, mas nunca pode ser determinante, sob pena de perda de sua própria alma/personalidade.
Número 22 – O Louco
Este arcano representa a alma inclusa em cada corpo, o impulso vital que não se detecta, define ou domina com objetividade. É sempre uma surpresa, um coringa, uma incógnita afirmativa e presente. O Louco representa o nosso ser essencial, longe dos condicionamentos sociais. Ele vem do Caos, e mais que isso, carrega o Caos consigo para onde quer que vá, sem preocupações com resultados ou responsabilidades. Qualquer coisa está valendo para O Louco.
*Ordálio: Derivação: por metáfora. provação extrema; calvário (Dicionário Houaiss)