Por Rosemeire Zago
O que podemos dizer sobre aquela dor que muitos definem como dor d’alma ou dor no coração, mas que não há nada que a comprove no organismo? É claro que sabemos que a dor é essencial para a sobrevivência e integridade de nosso organismo, mas em alguns momentos pensamos que não conseguiremos suportá-la. Mas qual o significado da dor?
Dor, etimologicamente, origina-se do latim dolore. Sofrimento moral, mágoa, pesar, aflição, dó, compaixão. É a emoção típica de uma tristeza profunda, causando muitas vezes o choro. A dor pode ser usada pelo inconsciente, com a finalidade simbólica de expressar uma mensagem para o mundo ou para alguém em especial, podendo ser nós mesmos. Isto significa que a dor pode querer dizer algo, pode ter um significado. “Quando uma pessoa usa a expressão: “Você feriu os meus sentimentos”, poderá estar dizendo a pura verdade. Uma dor de rejeição não é menor do que aquela que sentimos ao esmagar o dedo. Não há dor maior ou menor, independente do que a gerou. É preciso entrar em contato não com os fatores externos que desencadearam a dor, mas seu significado dentro da psique, pois a dor é o inconsciente se expressando de forma simbólica.
Existem vários tipos de dor citados na literatura, mas quero me referir aqui da dor que vem de dentro, sem nenhum estímulo concreto externo; a dor emocional, chamada de dor psicogênica (de origem psíquica) que é aquela onde não é encontrada nenhuma doença ou lesão, sendo considerada um sintoma freqüente em pessoas com conflitos emocionais e com tendência a negar esses conflitos, que podem se fazer presentes através da dor.
É muito comum a dor ser mais intensa em quem tem dificuldade para expressar o que sente, havendo um bloqueio da expressão afetiva. Nesse caso, a pessoa carrega uma agressividade contida, como uma energia represada, reprimida, e que precisa ser liberada, extravasada, podendo se tornar agressiva não apenas com os outros, mas principalmente consigo mesma.
A dor sem causa concreta depende da sensibilidade de cada um e que se diferencia pelo limiar doloroso. Esse limiar está relacionado com as endorfinas (substância liberada no interior do organismo) que podem ser entendidas como analgésicos. O nível das endorfinas está relacionado com nosso estado emocional, por isso que não podemos negar que a emoção é um fator importante na dor. As pessoas deprimidas tendem a ter essa taxa baixa e sentirá dor com mais intensidade. Em períodos de muita tensão esse limiar também poderá diminuir. A maneira de encarar o dano sofrido pode determinar a intensidade e duração da dor, podendo tornar-se mais intensa quando ignorada ou punida. Apesar da investigação da dor como um fenômeno fisiológico ser importante; dor não pode mais ser reduzida a fisiologia, mas sim compreender como a pessoa está sentindo a dor e o que isso representa. Na verdade, a dor emocional é uma só: ela depende exclusivamente de quem a sente, geralmente sentida em silêncio, no escuro do quarto, sem que ninguém mais saiba.
Na dor psicogênica há alguns traços importantes nos chamados pacientes propensos a dor, como:
– Proeminência de culpa
– História de sofrimentos freqüentes
– Intensos impulsos agressivos não satisfeitos
– Aparecimento de dor diante de uma perda, real ou ameaçada
É interessante notar que o que deu origem ao termo inglês pain que traduzido significa dor, foi a palavra latina “poena” e a grega “poiné”, ambas significando castigo, punição, fazendo assim uma conotação entre castigo e dor.
Muitas vezes a dor é sentida como um castigo/punição para muitas pessoas, principalmente quando se sentem culpadas. A culpa geralmente intensifica a percepção da dor, trazendo em si uma necessidade inconsciente de punição, muitas vezes dificultando a busca pela elaboração e compreensão do conflito que a causou.
Na dor emocional não há lesão nem doença, porém a impressão física parece real. Há uma angústia no corpo todo, provocando um aperto no peito, dificuldade de respirar, uma sensação que o coração vai partir. É comum a expressão: “Dói na alma, no fundo do coração”. A dor, no coração do nosso ser, é o sinal incontestável da passagem de uma prova. Quando uma dor aparece, podemos acreditar que estamos atravessando uma prova decisiva. A prova de uma súbita separação nos transtorna e nos obriga a reconstruir.
Seria falso acreditar que a dor psíquica é um sentimento exclusivamente provocado pela perda de um ser amado. Ela também pode ser dor de abandono, quando o amado nos retira subitamente o seu amor; de humilhação quando somos profundamente feridos no nosso amor-próprio, da decepção, da espera. Os motivos que nos causam dor podem ser muitos, mas em geral a dor só existe sobre um fundo de amor. Mas como reconstruir diante de tanta dor?
A dor não tem apenas aspectos negativos, mas é uma forma de aviso, alarme, dizendo que algo está errado, e que devemos nos conscientizar dos sentimentos originais reprimidos e negados. Quanto mais importante é o fator desencadeante da dor, mais ela será sentida. Por isso é muito comum a dor intensa, sem fim, em términos de relacionamentos, diante da morte de uma pessoa amada ou nas situações de perda.
Se a dor emocional implica em sofrimento, e esse é resultado de um conflito reprimido, podemos resolvê-lo se este for suportado, confrontado e explorado, identificando culpas, histórico de vida, enfrentando aquilo que tanto nos machuca através do processo terapêutico, evitando assim que uma doença se instale. Todo sofrimento que advém da dor emocional pode ser uma forma de conduzir, nós, seres humanos, tão (in)certos do que queremos para nós, que esse momento de sofrimento, desespero, em que “inconscientemente” nos referimos a dor emocional, dor d’alma, pode ser percebido como um sinal da necessidade em buscar uma maior espiritualidade e autoconhecimento.
A dor emocional pode ser uma das formas de nos levar a Deus, cada um da forma que o concebe, mas do ponto de vista psicológico pode ser entendido como a busca de si mesmo. Ou seja, o entendimento da mensagem da dor emocional enquanto símbolo pode ser o diferencial que pode nos conduzir ao crescimento e a cura.
“A dor não surge apenas por estimulação periférica, mas também por uma experiência da alma, que reside no coração” Platão