por Carminha Levy
Num exercício pedagógico de oferecer uma linha de raciocínio que englobe todos esses ensinamentos xamânicos que venho lhes passando, vamos voltar a um tema básico e estrutural sempre mencionado (na execução da prática xamânica que proponho nos textos), mas nunca devidamente explicitado na sua essência: o ritual.
Primitivamente, os rituais aconteciam na natureza, ao ar livre, e o centro desse era constituído por um elemento natural, com uma qualidade especial, como uma árvore, uma fonte de água, uma pedra, por exemplo. Em torno desse centro, formava-se um círculo, símbolo do útero, a força criativa. O círculo é importante porque cada ponto da circunferência é eqüidistante do centro, isto é, todos os participantes do ritual eram iguais e todos são filhos da Grande Mãe Terra.
O círculo é um espaço sagrado, fora do mundo físico.
No mundo físico, natural, a forma circular acontece freqüentemente, em oposição ao quadrado, que surge como criação humana. Por exemplo, se você atira seixos num lago, ele vai formar círculos.
O círculo simboliza o céu, o cosmos ilimitado, o eterno; é uma linha arredondada contínua, que reconduz a si própria, é o símbolo da perfeição, do redondo, do feminino.
O que é um Ritual?
Um Ritual é uma série de ações estilizadas, físicas ou mentais, usadas para mudar a percepção da realidade.
Um Ritual freqüentemente começa e é executado antes que a consciência do que ele representa se desenvolva em nós.
Realização de ritual traz trasnformação
A transformação pessoal está implicada em cada ritual e é um processo de magia: ao realizarmos um ritual, somos transformados por ele.
Qual a função do Ritual?
Sua função consiste na descoberta de como fazer a energia fluir melhor.
Há poder em clarificar nossas ações, fazendo-as precisas e usam-se repetições de movimentos ou sons para se ir construindo a energia. Colocamos a nossa energia em sintonia com a energia universal. Ao fazermos um movimento e repeti-lo, vamos sintonizando-nos com o movimento cósmico e fazemos um canal de energia.
Um ritual pode ser um simples acender de uma vela ou uma grande preparação de atos seqüenciados.
Pode incluir movimentos estilizados, palavras repetidas, cantos ou canções, objetos, roupas, ferramentas, comidas e bebidas sagradas.
É importante o propósito do ritual:
O que eu quero com o Ritual?
Para que eu quero isto?
O que vai acontecer se eu alcançar ou não meu propósito?
Como meu sucesso ou falha vai afetar os outros?
Desejo ou necessito tanto que afinal me torno medrosa/o ou tensa/o e bloqueio o fluxo energético?
Acredito realmente que posso alcançar?
Penso que mereço alcançar?
Tenho o necessário para alcançar (energia, auto-confiança, ferramentas, tempo, recursos materiais)?
O ritual nos coloca num estado de transe, possessão sagrada ou estado alterado de consciência. O êxtase nos lembra de que o sagrado está imanente.
Quando a energia divina flui através de nós, ela traz poder, conhecimento, habilidades e cura, que vão além de nossas limitações ordinárias.
Não é que adquiramos esses poderes; apenas tornamo-nos um canal para a manifestação desses poderes divinos ou sagrados, e um dos objetivos ou funções primordiais dos rituais é abrir e manter aberto esse canal de descida da energia cósmica e divina.
Adquirir o conhecimento de como entrar em transe é importante, porque ao mesmo tempo aprendemos como sair dele. O ritual nos dá os limites que nos deixam escolher que poderes cultuar, como chamá-los e como mandá-los embora, como tornarmo-nos conscientes do estado no qual estamos. Isto nos protege de sermos prisioneiros da loucura ou do uso de drogas e nos ajuda a transitar entre os mundos – o que os xamãs sempre fazem.
O ritual pode tornar-se um espaço livre, uma brecha que abrimos na estrutura de dominação egóica e social. Ele nos ajuda a desenvolver nosso próprio poder. A expressão tradicional que se utiliza para se designar o xamanismo, “entre dois mundos”, significa que estamos com um pé além da instituição do controle, mas não totalmente no outro mundo, o dos mistérios. Com um pé em cada lado, fazemos uma ponte entre o profano e o sagrado. E com isso o dia-a-dia muda, aprofunda-se, até que o Sagrado, como uma corrente subterrânea, chega até nós.
Fonte: Dados fornecidos por MoniKa Von Koss, autora de Rubra Força, Hera – um poder feminino entre outros.