O velho e o mar

Um dos livros mais comoventes de Ernest Hemingway fala sobre um velho pescador que é visto como um homem azarado. Ele está há 84 dias sem pegar nenhum peixe. Seu único amigo fiel é um menino, que apesar de não ser seu filho, cuida dele com uma dedicação amorosa impressionante.

O mar da vida e tudo que nos cerca pode ser sentido em cada parágrafo de Hemingway… com aquela dor doce de quem sabe que a angústia existencial fala muito mais sobre a pulsão de vida do que da morte.

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Mas o que um velho teimoso e azarado quer fazer mar adentro? Ele cumpre seu propósito. Ele faz o que tem que ser feito. Ele prefere morrer em seu barco do que desistir de ser quem ele é…

Quantas vezes você viu seus pais idosos ou avós teimando com coisas pequenas? Mesmo sabendo que seus corpos estão frágeis, eles querem fazer as coisas do jeito que sempre fizeram… é o sinal da vida que lhes resta. E às vezes o que vemos como teimosia é um sinal de dignidade. Da dignidade de tentar ser o que sempre foram…

É comovente ver o velho Santiago, personagem principal do livro, lutar com suas mãos ensanguentadas para pescar o maior peixe da sua vida, um Marlim de 5 metros e meio de tamanho.

Sozinho…

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Ele, o peixe, seu barco, e o mar….

É comovente ver a alma deste velho conectada ao menino Manolin que o espera no vilarejo. Santiago sabe que não poderia decepcionar seu fiel amigo. Puer/Senex interagindo amorosamente…

Às vezes quando vemos nossos velhos pais e avós adoecidos e impotentes, temos a impressão de que a loucura e a fragilidade tomaram conta desta fase da vida, temos a impressão que estão morrendo. Mas nem imaginamos que em sua velha alma ressoam desejos e uma personalidade que persiste… por isso, valorize cada olhar, cada sorriso, cada suspiro, cada sentimento de dor e angústia.

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Escreve Hemingway no final da luta entre o velho pescador contra os tubarões que tentavam devorar seu peixe:

“… e julgou que talvez estivesse morto. Juntou as mãos e sentiu as palmas. Não estavam mortas e podia sentir a dor da vida ao abri-las e fechá-las.”

Há ainda muita vida no envelhecimento…

Até no último suspiro. Ou, no maior peixe que um velho pode trazer em seu velho barco.

Hemingway, Ernest. O velho e o mar. 93 ed. – Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2017.