O verdadeiro significado do Natal: um olhar poético

O verdadeiro significado do Natal nos chega repleto de símbolos e códigos nada secretos, pelo contrário, muito expressivos; mas o que está por trás de tudo isso para tornar o Natal mais feliz e acolhedor?

Quando falamos sobre o Natal, o que nos vem à cabeça? Uma pergunta que traz motivos de sobra para revisitarmos nossas memórias.

Quando penso no Natal, relembro imagens que me acompanharam durante alguns anos na infância. Lembro-me de meu pai subindo em uma escadinha de madeira para pegar uma caixa de enfeites de Natal. Havia tanto significado em cada gesto! Naquela horinha só existia a inocente infância entre nós. Todo ano, quando terminava o Dia de Reis, desmontávamos a árvore e colocávamos novamente os enfeites lá dentro e, então, meu pai guardava a caixa em cima do guarda-roupa. E ali ela ficava sendo revisitada inúmeras vezes pelo meu olhar ao longo dos anos.

Para mim, o Natal começa com essa imagem, com essa caixa encantada sobre a cama. O Natal chega repleto de símbolos e códigos nada secretos, pelo contrário, muito expressivos. A segunda pergunta seria: “Como eu gostaria que o Natal chegasse até mim neste ano?” Para mim, o Natal deveria chegar devagar, sem pressa, porque senão, não conseguiria saborear os seus verdadeiros sinais.

O real significado do Natal

Gostaria, também, que o Natal não viesse revestido – como acontece em muitos casos – da soberba de adereços e mesas excessivamente fartas, o que nos deixa distantes da singeleza deste momento tão importante. Vamos deixar o Natal entrar em nossas casas, nos convocando a abrir as janelas, de tal forma que nos permita olhar o alto e glorificar ao Sagrado.

É fundamental que o Natal seja, também, um período no qual tenhamos tempo para acolher pessoas, nos doarmos às pessoas e recebê-las, verdadeiramente, em nosso lar e em nosso coração. Não olhemos o Natal como um espetáculo tirano, cheio de fogos, atentos somente à indumentária das coisas, impedindo que mergulhemos em sua simplicidade. Não é possível enxergamos este momento tão precioso como a festa da avareza, que nos tira da rota da empatia. Ao invés disso, a solidariedade, o estar com o outro. Natal também não é a liturgia do gasto, que se resume em compras e mais compras. Essa visão nos distancia do verdadeiro sentido, muito mais relacionado à reciclagem desses símbolos que nos revelem quem, de fato, somos.

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Natal: um tempo de aconchego e empatia

Natal é o tempo do aconchego, da comunhão com as pessoas que amamos, que vão chegando, com os desiguais, com as pessoas que veem o mundo de um jeito tão especial, tão particular, tão incomum. O tempo da sinceridade, da transparência.
Não precisamos ficar em estado de profunda euforia. Dê espaço ao encontro consigo mesmo. Se ainda houver alguma dor aprisionada, tenha contato com ela, a receba e permita que ela chegue até você. É lícito chorar nesta época. Lícito, também, chorar por pessoas que, de alguma forma, se foram porque “subiram ao céu ou porque optaram por não estarem mais conosco”. É fundamental trazer luz sobre estas sombras que, às vezes, nos acompanham durante tanto tempo. Um tempo de encontros, cujo significado afetivo revela a abertura do nosso coração.

O Natal é um tempo de paz. O menino que nasceu é o Príncipe da Paz. Este futuro pastor, tão movido por este sentimento, deixou-nos um grande presente: “A minha paz vos dou”. Um período de possibilidades, quando adquirimos uma boa dose de esperança. Porque Aquele que nasceu nos prometeu uma nova vida, uma vida com abundância.

O magnífico sentido do Natal

Para exemplificar o quão magnífico é o sentido do Natal, tomo a história que ouvi certa vez, do profeta chamado Eliseu, por cerca dos anos 890 a.C. Ele morava em uma região em uma região entre o Monte Carmelo e Samaria. Um enviado de Deus, que fazia com que Sua vontade fosse cumprida, por meio de ações as quais lhes eram designadas. O profeta sempre passava por uma cidade chamada Suném, localizada próxima àquela região, onde morava, também, uma mulher casada, muito sábia, rica, inteligente, culta. Ela foi tomada pelo chamado de Deus e, disposta a ajudar aquela profeta, construiu em sua casa um cômodo para acolhê-lo durante suas jornadas.

Grato pela hospitalidade do casal, em especial da mulher que o acolheu, o profeta Eliseu falou ao seu servo: “Gostaria tanto de presentear essa pessoa que tem sido tão boa para mim. Mas não sei o que Deus poderia proporcionar a ela, que fosse, realmente, algo que trouxesse um benefício verdadeiro, um favor a ela. E então, ele respondeu: “Ela não tem filhos”. O profeta pediu, dessa forma, a Deus que a presenteasse com a maternidade. No ano seguinte, quando retornou à casa do casal, Deus havia lhes presenteado com um filho, que fez toda a diferença naquela família.

A criança foi crescendo e, já garoto, no trabalho da lavoura junto com o pai, começou a sentir forte dor de cabeça e, mesmo com todos os esforços dos pais para salvá-lo, o menino faleceu. Então, a mãe questionou: “Meu Deus, não entendo. Eu não havia pedido um filho e, mesmo assim, o Senhor nos abençoou e agora ele não está mais aqui. Por que foi tirado de nós?”

Ao saber do ocorrido, o profeta Eliseu foi até a casa do casal, entrou no quarto e, ao lado do filho, pediu a Deus que o visitasse. Depois que orou Eliseu deitou-se sobre o corpo do garoto já sem vida e, este então, voltou a se aquecer devagarzinho até que voltasse à vida.

O real significado do Natal: o Sagrado vem aquecer algo dentro de nós que já estava sem vida, sem esperança

Para mim, este é o verdadeiro sentido do Natal. Quando o Sagrado vem aquecer algo dentro de nós que já estava sem vida, sem esperança e, aquecidos pelo amor de Deus, retomamos a semeadura.

Vivemos, atualmente, em um tempo que insiste em não nos dar trégua, desaquecendo nossa esperança.

Assim como um poema que ressoa em nosso coração ao ser recitado, assim sugiro a leitura do Natal sob um olhar poético.
O que você tem contato, por meio da poesia, torna-se mais vivo.

Natal
Natal é tempo de sentir e se sentir
Livre, leve, solto, estando atado aos céus.
Tempo de renovar o pacto com a vida e fazer uma reflexão
profunda e bem fininha.
É tempo de descobrir que o que nos desprotege
não mora do lado de fora.
Não temos para onde correr
a não se estar em si mesmo.
E encontrar este lugar que, em nós,
é confortável e, nele, ficar.
É tempo de olhar sobre o que está tão perto
e, ao mesmo tempo, tão escondido de nós.
Natal é tempo de se permitir…
perguntas sem respostas.
Não são perguntas que se alimentam de respostas
mas, perguntas que se alimentam de esperança.
O que mais desconforta nossa alma
não é a falta de explicação,
mas o desamparo.
No dia da aflição, não precisamos de respostas,
mas de aconchego.
O amor sempre nos socorre
de todas as nossas incompletudes.
O Natal nos devolve quem somos,
e somos tão carentes….
A carência nos coloca como seres de uma asa só
que, para voar, precisar abraçar-se.
O menino Jesus está para o ser humano
como a asa está para o pássaro.
E eu, atada ao céu, vou muito longe
Estranha liberdade, não é?
É Natal.
Seu amor trata de emprestar a asa
que nos é ausente.
Isso é Natal de verdade.
A singeleza do nascimento do menino,
futuro pastor, assegura que nós também
não nascemos para machucar,
mas para acolher pássaros e entrelaçar sonhos.
Diante da fraqueza que nos envolve,
o amor surge como solução,
princípio da compaixão, do sentir junto,
porque a dor que não é nossa nos atinge também.
Como eu quero que este Natal chegue em mim?
Como eu quero que este Natal chegue em nós?
Como eu quero que este Natal chegue até você?
Que ele chegue com Jesus.
O Jesus do primeiro Natal
até hoje segue batendo à nossa porta.
“Quem ouvir a minha voz e abrir a porta
Entrarei em sua casa, cearei com ele e ele Comigo”.
Não quero perdê-Lo de vista, não quero perdê-Lo da vida.
Quero seguir Seus passos.
O caminho nem sempre é confortável,
mas os companheiros de viagem são inesquecíveis
porque se tornam mais que amigos,
se tornam irmãos .
Natal é descobrir que existe uma forma de amar que é
oferecer-se a quem não pode retribuir.
Natal é mergulhar lá dentro de si mesmo
e se reconciliar com as escolhas que nos tornaram
quem somos e se reinaugurar, se reencontrar no Reino do Príncipe da Paz,
porque Nele todas as nossas inquietudes encontram repouso.
Natal é tempo de descansar, que haja paz.
Deus está em paz comigo. Deus está em paz com você.
Como eu quero que o Natal chegue em mim?
Como eu quero que o Natal chegue em você?
Trazendo paz.
Glória a Deus nas alturas e paz a todos nós, que
temos a boa vontade não só de estarmos em paz
mas de sermos pacificadores.”

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Maria do Céu Formiga é psicóloga, escritora Membro da Academia de Letras da Grande São Paulo, (ocupando a cadeira de Mario Quintana) e aquarelista. É pós-graduada em Psicologia Social, Mestre em Ciências da Religião. É consultora autônoma, coordena cursos e workshops. Realiza palestras e trabalhos em simpósios e congressos nos seguintes países: França, Inglaterra, Cuba, Israel, Chile e Estados Unidos. Mais informações: www.mariadoceuformiga.com.br