Da Redação
Dentre as queixas mais comuns entre os pacientes que procuram tratamento médico e nutricional para a obesidade, cerca de 80% relacionam seu ganho de peso ao estresse. “Na verdade, algumas características da vida moderna podem estar intimamente relacionadas a um balanço energético positivo, levando ao ganho de peso.
Dentre elas, podemos citar alimentação inadequada, sedentarismo e mais recentemente, o estresse”, diz a endocrinologista Ellen Simone Paiva.
Os fatores estressores da sociedade moderna são frutos da rotina puxada das empresas, das relações familiares e sociais, além de fatores intrínsecos, como a privação de sono, por exemplo. Geralmente, o corpo humano responde ao estresse através de adaptações físicas ou comportamentais, aumentando o estado de alerta diante de novas situações, a tolerância à dor e a produção e liberação de substratos energéticos dos estoques corporais, principalmente sob a forma de glicose e gordura. “Esses substratos em excesso são conhecidos por causarem alterações metabólicas ligadas à obesidade e ao diabetes. Será esta a relação possível? Ou seja, será esse o elo que liga a obesidade ao estresse da vida moderna?”, questiona a médica.
A reação normal e a patológica ao estresse
Até certo ponto o estresse pode ser benéfico e conduzir o indivíduo a alcançar metas importantes no trabalho e na vida pessoal. A curto prazo, na maioria das vezes, o organismo se reequilibra, sem comprometimento da saúde física e mental. A reação normal esperada a um fator estressor pode se manifestar com enfretamento ou fuga. “Algumas vezes, a resposta não atende a nenhuma dessas condições e o indivíduo não consegue nem se engajar na luta, nem na fuga do agente estressor, sofrendo as consequências do estresse de maneira a gerar um estado de fragilidade a várias doenças, principalmente quando ele é intenso e prolongado”, afirma.
Exposição ao estresse e compulsão alimentar
O hábito de comer talvez seja um dos fatores que mais sofre as repercussões do estresse da vida moderna. “Os relatos são unânimes: as pessoas comem muito mais quando expostas a fatores estressores, podendo ocorrer queixas de fome excessiva, comportamento beliscador e até uma necessidade patológica de consumir grandes volumes de alimentos: a compulsão alimentar”, destaca a endocrinologista.
Um fato intrigante, relata Ellen Paiva, são os relatos de alguns pacientes, que não encontram explicação para o volume alimentar consumido e afirmam categoricamente que mesmo comendo pouco, ganham peso. Esse fato tem levantado a questão do papel do estresse na origem da obesidade, independentemente da alimentação.
Efeitos da privação do sono
Nos últimos 30 anos, a média de sono noturno das pessoas sofreu uma redução de 8/9 horas para 6/7 horas. Entre os americanos, a média de sono é ainda menor, uma vez que 30% deles dormem menos do que 6 horas por noite. Vários estudos recentes têm relacionado a privação do sono com a ocorrência aumentada de obesidade e de diabetes tipo 2. “A privação do sono pode estar relacionada à obesidade através de vários fatores. O primeiro deles trata-se de um estado de estresse crônico. Além disso, várias alterações hormonais induzidas pela privação de sono podem influenciar o ganho de peso, como é o caso da grelina e leptina, hormônios relacionados ao controle da fome e da saciedade”, diz.
Hormônios do estresse e o ganho de peso
Um fator importante na busca pelas causas da obesidade foi a constatação de que nos quadros de estresse, notamos um aumento de alguns hormônios relacionados à obesidade. Tratam-se dos corticoides, ou a conhecida cortisona, que tem a capacidade de aumentar o peso de pacientes, quanto utilizada sob a forma de medicamento, e até quando produzida em excesso pelo organismo, em algumas doenças. “Será que o estressado crônico poderia engordar pelo excesso de corticoide, mesmo sem comer muito?”, questiona a médica.
“Nossas dúvidas não estão sanadas a esse respeito, uma vez que muitos indivíduos estressados e com elevação da cortisona não engordam e, por outro lado, muitos obesos estressados não expressam aumento do seu corticoide endógeno. Por isso, muito provavelmente, a diferença entre esses pacientes é o volume de alimentos ingeridos”, afirma Ellen Paiva.
A conclusão é que o estresse pode sim ser um fator favorecedor da obesidade, principalmente pelo aumento da resistência insulínica, pelas alterações dos hormônios relacionados à fome e à saciedade, pela privação do sono e até mesmo pelo excesso de corticoide. “Mas o maior fator associado ao ganho de peso é comportamental. O que engorda é o balanço energético desfavorável: a associação da ingestão excessiva de calorias somada ao sedentarismo”, conclui a endocrinologista.