por Ivelise Fortin – psicóloga componente do NPPI
Nesta época de fim de semestre, com tantos trabalhos para corrigir, eu – e muitos professores -, nos deparamos com um grande problema: o plágio de textos da internet. É impressionante a quantidade de trabalhos acadêmicos plagiados que os professores universitários (e de outros níveis de ensino) recebem.
Recebemos o trabalho impresso, e logo percebemos os rastros do plágio: trabalhos com as palavras chave ‘coloridas’, sinal de que foram retiradas da ‘cachê’ do Google; uma colega me mostrou um trabalho que continha expressões como: “Clique aqui para abrir o gráfico”; “Nós, os russos…” assim se inicia um trabalho que eu recebi; Outro colega me mostrou o trabalho que se inicia com “No capítulo anterior, já dissemos que…”.
Eu, como vários colegas já treinados, passamos o olhar pelo texto e já sabemos… É só digitar a frase chave no Google e eis que surge a confirmação do plágio! Creio que essa atitude dos alunos deveria provocar, no mínimo, uma reflexão. Farei aqui a minha, sem a menor pretensão de apresentar respostas finais para as questões levantadas.
A primeira delas refere-se à definição de plágio. Segundo o dicionário Aulete, uma das definições é: “Apresentação de imitação ou cópia de obra intelectual ou artística alheia como sendo de própria autoria.” No caso dos trabalhos acadêmicos, chamamos de plágio quando há cópia da obra no todo, ou seja, a simples transcrição de algum artigo; existe o chamado “plágio mosaico” que consiste na composição do texto por meio de vários trechos de parágrafos plagiados; há também plágio quando o texto é reescrito em algumas partes, mas mantém trechos do original. Em ambientes acadêmicos, considera-se plágio quando o autor não faz as referencias bibliográficas de forma correta, ou seja, apresenta ideias de outros autores como se fossem suas. Mas será que essas pessoas entendem que, segundo a definição apresentada, o que fazem é considerado plágio?
As causas desse fenômeno exigem nossa reflexão. Por que os alunos plagiam trabalhos? Muitos são os motivos, e creio que o principal deles é a preguiça. Para que digitar tudo, fazer um trabalho, se esse já foi feito por alguém, está prontinho, é só copiar e entregar? Essa discussão também nos remete ao sentido que os alunos dão às atividades acadêmicas. Ou seja, para muitos a entrega do trabalho é um trâmite apenas burocrático, que deve ser realizado da forma mais fácil e rápida possível para o aluno desincumbir-se e conseguir nota. Assim, muitos alunos não veem o trabalho como uma contribuição à sua formação ou aplicação da teoria, mas sim como uma burocracia da qual eles querem se livrar. A forma mais fácil? Preencher o papel com algum texto e entregar.
Creio que outra causa está relacionada ao desconhecimento de como devam ser usadas as informações obtidas na internet. Será que nossas escolas e universidades dão atenção a esse fator? Por vezes, percebo que o aluno não plagiou o trabalho de má fé, mas sim por não ter a mínima ideia de como fazer as referências corretamente. Acredita que simplesmente colar links de onde a informação foi copiada é suficiente para atribuir os créditos ao autor, não compreendendo que estão assinando aquele trabalho com uma construção que não foi realizada por ele.
Creio que esse problema em particular também está relacionado ao nosso sistema escolar, e isso acontece já de longa data. Muitos de nós entregávamos trabalhos escolares como uma simples cópia de alguma enciclopédia – como a Barsa ou a Mirador – sem dar créditos aos autores. Não me lembro de ter refletido sobre quem seriam os autores daqueles textos, e sim que simplesmente copiávamos e entregávamos à professora, que nos dava nota. Achei no mínimo curioso o comentário de uma aluna minha, ao entregar um trabalho acadêmico: “Professora, que cansaço! O nosso trabalho tem 20 páginas e fui eu que digitei as 20! Na escola era só copiar e colar que estava tudo certo, entregávamos trabalhos enormes, mas nunca digitados por nós.”
Será que ensinamos essas crianças e jovens a respeitar a autoria dos textos? Aliás, essa é uma discussão muito mais ampla, na qual não pretendo entrar, mas apenas mencionar aqui. Fica a impressão de que, para esses nativos digitais, toda informação é e deveria ser trabalhada em sistema de múltiplas autorias como a Wikipédia. Sendo assim, será que para alguns jovens a questão da autoria não tem mais sentido? E por falar na Wikipédia, esta tem sido a fonte de muitos trabalhos escolares e acadêmicos. Tem a benesse de ser um repositório de informações gigantesco, mas, em contraponto, também apresenta muitas definições incorretas ou incompletas, uma vez que muitos dos seus colaboradores não são especialistas.
Outro ponto, ainda relativo às diferenças da forma de pensar dos nativos digitais, é a grande desvalorização do livro e da leitura que não é feita diante da tela. Vejo que muitos alunos se sentem desmotivados em ler livros e textos um pouco mais longos. A internet é sempre a primeira fonte de informação, como diria o autor Mark Prensy. Para exemplificar, segue o comentário de outro aluno: “Professora, que trabalho difícil você deu pra gente! Não tem nada na internet sobre o assunto pra gente copiar!” “Sim, vocês têm que consultar o livro e escrever o trabalho com as suas próprias ideias”, respondi, para o desapontamento geral da sala.
Entretanto, creio que os jovens leem muito na internet. Portanto, a questão aqui não é com a leitura, mas creio que com a forma com que ela é apresentada. Assim, ou invés de consultar livros, é mais fácil copiar alguma coisa da internet; a busca da informação específica é muito mais prática e rápida que no livro, que não dispões do comando “Localizar”.
Creio ainda que outros motivos que favorecem o plágio são algumas características de parte dos professores: Uma delas é a condescendência, ou seja, o professor sabe que o trabalho é plagiado, mas dá nota assim mesmo, ao estilo do que Paulo Freire dizia: “Você finge que aprende, eu finjo que ensino”. Outra é o desconhecimento, por parte de alguns professores, de que os trabalhos podem ser plagiados da internet, desconhecimento esse que os impede de identificar esse plágio. Para alguns professores, essa ideia nem passa pela cabeça – considera que o aluno escreveu mal, ou o texto ficou estranho, mas não lhes vem à mente checar se existe plágio, dando nota a alunos que deveriam ser reprovados.
Outra questão a ser levantada é sobre o papel do professor na era da tecnologia da informação. Será que o papel do professor frente aos trabalhos acadêmicos fica reduzido a checar se o trabalho é original ou cópia, punindo as cópias?
Muitas críticas são feitas à forma com que os trabalhos são propostos aos alunos. Já ouvi em uma palestra uma crítica feroz, com a qual o palestrante praticamente culpava os professores por sua falta de criatividade. Ou seja, ele afirmava que os trabalhos são plagiados porque podem ser plagiados; não se exige uma reflexão do aluno sobre a questão em pauta e nem sua construção pessoal sobre o tema. Creio que isso também acontece, mas responsabilizar os professores não resolve a questão. Para algumas disciplinas, é necessário que se faça uma revisão bibliográfica do tema. Qual a saída “criativa” para evitar o plágio nessa situação? Não devem mais ser pedidas revisões apenas para evitar o “copia e cola”?
Ainda, há o papel da instituição escolar. Muitas universidades sem boa reputação, nem renome acabam coagindo e pressionando os professores a aprovar alunos que não apresentam a mínima condição para tanto. Assim, muitos professores aceitam o plágio como sendo essa a forma mais fácil de se livrarem do aluno, uma vez que, reprovado, ele fará de tudo para consegui-la. Além disso, há algumas instituições que aprovam o aluno à revelia do professor! Para que complicar? Aceite-se o plágio… “Aluno está interessado em diploma, e não em conhecimento. Facilitem a vida deles” – essa frase eu ouvi em uma reunião com a mantenedora de uma universidade.
Diversas estratégias têm sido usadas para impedir o plágio. Há escolas que aceitam apenas trabalhos escritos a mão. Nas universidades, muitos professores tem trocado os trabalhos realizados em casa por provas ou trabalhos feitos em sala, pois assim é possível garantir a autoria dos textos. Na maioria dos regimentos acadêmicos universitários o plágio é punido com reprovação e, dependendo do caso, até com a expulsão do aluno. Tem aumentado muito o plágio em todos os níveis escolares, até mesmo na pós-graduação. Uma renomada instituição, aqui em São Paulo, apenas neste semestre já expulsou dois mestres e um doutor por constatação de plágio nas respectivas dissertações e tese.
Ainda não há soluções satisfatórias para os problemas apontados, mas creio que tem sido dada pouca atenção a essas questões, tanto em ambientes universitários, como no sistema escolar. Vale uma reflexão de todos os envolvidos nas causas do plágio: professores, alunos e instituições de ensino.
1. Jovens que nasceram conhecendo desde cedo as novas tecnologias informatizadas: conceito do autor Mark Prensy