por Danilo Baltieri
“Sou pastor e temos recebido em nossa igreja jovens que estão saindo de casas de recuperação. Gostaria de desenvolver atividades para ocupá-los, pois alguns têm retornado ao vício. O senhor pode me dar algumas sugestões?”
Resposta: As atividades religiosas podem exercer importante papel na recuperação de jovens dependentes de substâncias. Ao propiciar um ambiente favorável à reestruturação familiar e à rede de amigos, favorecendo o desenvolvimento de diferentes atividades voluntárias, sempre com o apoio dos religiosos, e com a reestruturação de valores, um novo estilo de vida pode ser angariado.
Existem estudos mostrando que a religiosidade pode ser um considerável fator de proteção contra o consumo de drogas. Isso significa que praticar os preceitos religiosos, participar regularmente das atividades religiosas e crer na importância da religião na vida protegem muitos jovens contra a experimentação e manutenção do uso de substâncias. Também, existem estudos que apontam que a religiosidade facilita a recuperação da dependência química e diminui os riscos de recaídas.
Os fatores de conexão entre recuperação do consumo de drogas e religiosidade têm sido apontados como:
a) melhora da autoestima;
b) redução da ansiedade;
c) sensação de pertencer a um universo maior;
d) aumento e fortalecimento do suporte social;
e) ressocialização do jovem através da modificação da rede de amigos;
f) ambiente onde o consumo de substâncias psicoativas é absolutamente inexistente.
De qualquer forma, um dos mais importantes fatores relacionados com o sucesso na recuperação de dependentes de substâncias que procuram a inserção em atividades religiosas é o acolhimento dos mesmos. Templos fechados, falta de motivação dos líderes e grupos religiosos, preconceitos e comportamentos críticos somente irão afastar pessoas e interferir negativamente com a recuperação dos necessitados.
É importante lembrar que a população de pessoas que padece da doença médica conhecida como Dependência Química constitui grupo extremamente heterogêneo. Dessa forma, não é possível dizer que uma mesma abordagem médica ou psicossocial será efetiva para todos eles. Existirão casos de pessoas portadoras de determinados quadros de Síndrome de Dependência de Substâncias que não responderão adequadamente às propostas religiosas; também, poderão existir pessoas que não funcionarão de forma satisfatória dentro do seio da comunidade religiosa.
Dessa forma, não podemos olhar as abordagens religiosas como uma panaceia para o manejo dos portadores de Dependência Química, embora sejam atividades extremamente importantes.
Há alguns meses, respondi a uma pergunta sobre os tratamentos religiosos e comentei sobre a dificuldade em desenvolver pesquisas sobre a eficácia/efetividade destas formas de abordagem, devido, principalmente, à heterogeneidade dos grupos religiosos (clique aqui e leia).
Não podemos nos esquecer também de que a Síndrome de Dependência de Substâncias é uma doença com raízes neurobiológicas e o papel do tratamento médico e psicológico especializado é essencial na recuperação dos pacientes. Quanto mais as diferentes vertentes de abordagem médica e psicossocial estiverem harmonizadas, melhores serão os resultados terapêuticos.
Portanto, desenvolver atividades de grupo, ampliar a rede social, promover a participação adequada dos membros familiares na recuperação do individuo, desenvolver atividades grupais voluntárias serão ingredientes essenciais no processo de recuperação e manutenção da abstinência. Se, junto com essas atividades, o paciente dependente de substâncias também estiver inserido em um tratamento médico e psicológico especializado, seguramente as chances de recuperação e estruturação pessoal e familiar aumentarão.
Gostaria de congratulá-lo pela sua iniciativa ao me enviar esta pergunta. Demonstra que grupos religiosos podem estar cada vez mais interessados na harmonização entre o tratamento médico, psicossocial e os baseados na fé, o que de fato será um ganho para todos nós.
Abaixo, recomendo interessante referência para leitura:
van der Meer Sanchez Z, Nappo SA. [Religious intervention and recovery from drug addiction]. Rev Saude Publica 2008;42(2):265-72.
ATENÇÃO: As respostas do profissional desta coluna não substituem uma consulta ou acompanhamento de um profissional de psicologia e não se caracterizam como sendo um atendimento