As birras são comportamentos que aparecem ao redor dos dois anos de idade, ganham intensidade até os quatro anos e declinam até os cinco anos. Birras nessa faixa etária são comportamentos normais e desejáveis, pois anunciam que a criança é inteligente e se sente amada. Só faz birra a criança que é inteligente e que se sabe amada. A criança com desenvolvimento intelectual atrasado, não tem recursos cognitivos para elaborar birra e a criança que se sente pouco querida ou negligenciada não ousa fazer birra.
Ainda que essas birras precisem ser vistas com bons olhos, isto não significa que elas devam ser toleradas. Existe um ditado antigo que diz: “A criança que ganha na birra, perde na vida.”
Por que a criança faz birra?
Ao nascer, a criança se torna o centro único ou privilegiado das atenções dos pais e adultos que a rodeiam. Ela é atendida de uma maneira quase imediata em relação ao que precisa e ao que passa a desejar. Principalmente a mãe, mas também as pessoas que rodeiam o bebê tendem a adivinhar, a supor e a buscar satisfazer todas as suas necessidades. Isso garante um apego seguro e gera uma sensação de onipotência, nesse primeiro ano de vida. Porém, progressivamente o bebê terá que aprender a tolerar esperas, lidar com as primeiras frustrações, porque deixará de ser esse foco único da atenção da família, para se inserir, como mais um membro na comunidade, que é a família.
A birra costuma surgir nesse momento e pode ser interpretada como uma tentativa para manter a ilusão da onipotência do início da vida. Mas, é importante que a criança confronte sua impotência (ela não é mais atendida em tudo de forma imediata, os outros decidem o que ela fará, os outros mandam nela) para que vá, depois, gradualmente adquirindo e treinando potências. Ela não precisa abdicar do que deseja, mas tem que desenvolver estratégias inteligentes para tentar conseguir o que quer. Dá para verificar como esse aprendizado ocorrerá rapidamente até os cinco anos de idade. Isso acontecerá com a criança que tem pais que não deixam que ela ganhe na birra.
Bebês e crianças precisam muito de limites. Limites são organizadores para o desenvolvimento da vida mental. Os limites devem ser impostos de formas bem diversas ao longo dessa fase, respeitando o crescimento do entendimento e da capacidade de elaboração mental dos filhos.
É importante aprender a obedecer. O termo obediência tem origem no latim odoedire, escutar com atenção. É considerada uma das virtudes e se define como um comportamento, pelo qual a pessoa aceita ordens dadas por outro. Obedecer quer dizer subordinação da vontade a uma autoridade. Significa, também, a escuta atenta para acatamento a uma instrução, comprimento de um pedido ou abstenção de algo que é proibido.
Obedecer, nos tempos atuais, infelizmente é uma virtude desprezada. A sociedade contemporânea, tida como neonarcisista, individualista, privilegia o espaço e os direitos da pessoa em detrimento do espaço e direitos alheios e confunde desobediência, oposição, negativismo, birra e falta de educação com afirmação e autonomia. Esse é um engano perigoso!
Sem as interdições e os limites necessários, a criança tende a se tornar negativista
O mundo está repleto de crianças que não atendem às solicitações dos adultos. As crianças que não foram ensinadas a obedecer, têm pais que não se colocam como figuras de autoridade frente a seus filhos e, portanto, não são respeitáveis.
Os pais são os modelos primários para identidade de seus filhos e precisam ser figuras admiradas por eles e, mesmo, idealizadas. Os limites, as interdições ajudam os pequenos a aprender a lidar com frustração, a entreter tensão, a adiar a satisfação de desejos, a controlar a impulsividade, a se tornarem seres civilizados. Os limites são protetores às crianças, pois elas não possuem, ainda, uma ética pessoal e quem sabe o que é bom para elas e o que é seguro são seus pais.
Sem as interdições e os limites necessários, a criança tende a se tornar negativista, opositora, querelante, esperando que o outro lhe proponha alguma coisa, simplesmente para se opor. Essa criança não aprendeu as regras que regem as condutas interativas e sociais e terá dificuldades na sua adaptação aos ambientes onde se colocará.
Confusão entre birra e Transtorno opositivo-desafiador (TOD)
Atualmente, as crianças que apresentam birras estão sendo confundidas com as crianças que têm hipótese diagnóstica de Transtorno opositivo-desafiador (TOD). Os portadores desse quadro, apresentam condutas sempre opositivas, desafiadoras, se indispõem com as pessoas que os rodeiam, não se permitindo serem convencidos de que não estão certos, ainda que todas as evidências mostrem isso. Esse quadro é também caracterizado por intolerância a frustrações, por reações agressivas, explosivas, desproporcionais às situações, por dificuldades importante no controle dos impulsos e piora com o crescimento.
O TOD é mais comum entre seis e doze anos e levam aos transtornos de conduta na adolescência. Entretanto, existem atualmente profissionais que levantam a hipótese desses transtornos aos três, quatro anos de idade, confundindo as birras, próprias à idade, com um transtorno sério do neurodesenvolvimento. Isso é um perigo!
As birras precisam ser controladas. Vistas como desejáveis no seu surgimento, elas não podem ser toleradas. Trazem a oportunidade para o aprendizado do tolerar esperas, do aguentar frustrações, do aprender a obediência a seus pais, que sabem o que é bom, o que é melhor para seus filhos.
Existem pais que colocam bem os limites e interdições às birras, que se colocam a obrigação de bem educarem seus filhos, para criarem cidadãos íntegros e éticos. Seus filhos terão comportamentos de birra nas idades esperadas, mas não serão confundidos com crianças com TOD.